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Literatura: Simbolismo

A exploração dos sentidos

No Simbolismo (1893-1922), a produção poética evoca sentimentos e sensações por meio da sugestão

A estética simbolista (durante um período contemporânea do Pré-Modernismo) se opõe aos avanços da industrialização e do progresso tecnológico próprios do século XIX. É comum que os textos simbolistas manifestem uma visão decadente sobre a realidade, bem como uma oposição ao comportamento racional. O Simbolismo valoriza os sentidos, as sugestões evocadas pelas palavras, a musicalidade e o ritmo dos poemas. O misticismo, a subjetividade e a sinestesia (combinação de sensações) são aspectos altamente explorados pelos poetas do movimento.

João da Cruz e Sousa (1861-1898), autor de Broquéis e Missal (1893), é um dos principais nomes do período. Na produção poética também destacam-se Alphonsus de Guimaraens (1870-1921), que escreveu Câmara Ardente (1899), e Augusto dos Anjos (1884-1914). Este último foi um poeta inclassificável. Sua poesia flertou com as estéticas diversas de seu tempo – há em seus poemas influências parnasianas (na forma), naturalistas (na linguagem e na ambientação), simbolistas (na temática) e pré-modernas (na ousadia linguística).


A liberação sensorial e a exploração das emoções são duas características marcantes da literatura simbolista. Repare nos poemas abaixo a preponderância de emoções e sentimentos intensos sobre a racionalidade.


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A dança dos encéfalos acesos[1]
Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombam, cedendo à ação de ignotos pesos![2]

É então que a vaga dos instintos presos
– Mãe de esterilidades e cansaços –
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.

Subitamente a cerebral coreia
Para. O cosmos sintético da Ideia
Surge. Emoções extraordinárias sinto…[3]

Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto![4]

Obra Completa, Nova Aguilar, 1994

[1]ALITERAÇÃO: Repare na aliteração (repetição de consoantes). Os sons sibilantes (representados pelos fonemas /s/ e /z/), sugerem um movimento sutil e sinuoso.

[2]INTENCIONALIDADE:  A intenção do texto é descrever um instante específico durante o qual o eu lírico experimenta várias sensações intensas.

[3]CONSTRUÇÕES ATÍPICAS:  O autor usa um vocabulário inusitado e construções sintáticas não convencionais para expressar emoções. Note o emprego da ordem inversa: o objeto “emoções extraordinárias” precede o verbo “sinto”, em uma construção com sujeito oculto (“eu”).

[4]IRRACIONALIDADE: As impressões do sujeito poético são valorizadas. A alma e o instinto, elementos não racionais, predominam sobre a razão, ao final do poema.

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Quando Ismália
enlouqueceu,
Pôs-se[2] na torre a sonhar…
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.[1]

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar…
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar…[3]

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar…[4]
Estava perto[5] do céu,
Estava longe[5] do mar… (…)

Cosac Naify, 2006

[1]SONHOS: As questões oníricas (relativas ao sonho) são privilegiadas, em detrimento da razão e da objetividade.

[1]PAPEL DA LUA : A lua é um símbolo frequentemente associado ao universo feminino. A loucura de Ismália subverte a percepção da realidade e ela imagina ver dois astros distintos (e não apenas o reflexo da lua no mar).

[2]PRONOME REFLEXIVO : A palavra “se” explicita uma ação reflexiva, ou seja, a ação verbal recai sobre o sujeito.

[3]ANTÍTESES: O uso das antíteses “queria subir” e “queria descer” assinala a inconstância dos desejos de Ismália e a inquietação que a arrebata ao contemplar a lua.

[4]MUSICALIDADE: A torre simboliza a concentração do sujeito na própria interioridade. A musicalidade, traço do período, está presente no canto de Ismália.

[5]ADVÉRBIO DE LUGAR : Os advérbios de lugar “perto” e “longe” revelam a ambiguidade do estado em que Ismália se encontrava. Os extremos do céu e do mar reforçam a antítese e acentuam a agitação interior da personagem.

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Meu coração tem butiquins imundos,
Antros de ronda, vinte e um, purrinha,
Onde trêmulas mãos de vagabundo
Batucam samba-enredo na caixinha.

Perdigoto, cascata, tosse, escarro[1],
um choro soluçante que não para,
piada suja, bofetão na cara
e essa vontade de soltar um barro…

Como os pobres otários da Central
já vomitei sem lenço e sonrisal
o P.F. de rabada com agrião…

Mais amarelo do que arroz de forno,
voltei pro lar, e em plena dor de corno
quebrei o vídeo da televisão.[2]


A parceria de João Bosco com Aldir Blanc rendeu inúmeros clássicos à música popular brasileira. A canção Bandalhismo é um exemplo do vigor  da dupla. A intertextualidade com o decadentismo (visão decadente sobre a realidade) e com a poética de Augusto dos Anjos se dá nos planos formal (emprego do soneto), temático (exploração da melancolia) e linguístico (uso de expressões que fogem do lirismo). O poeta pré-moderno não costumava ousar na forma, mantendo o padrão clássico vigente no fim do século XIX, mas inovou com versos repletos de termos escatológicos e de atmosfera sombria.


[1]ESCATOLOGIA: Expressões que escapam ao ambiente lírico (escarro, vomitei) surgem em abundância e conferem à canção atmosfera decrépita.

[2]HUMOR CORROSIVO: A imagem construída com “quebrei o vídeo da televisão” aponta para a sátira ao apego ao mundo onírico ou distante da realidade.

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O Simbolismo tratou das diversas sensações experimentadas pelo ser humano. Em grau extremo, as emoções de Ismália, personagem de Alphonsus de Guimaraens, conduzem ao suicídio. No poema, a união da figura feminina com as águas do mar simboliza o reencontro do sujeito com a natureza. A integração do ser humano com a realidade objetiva, com base na exaltação dos sentimentos, foi abordada por inúmeros artistas plásticos do século XIX. Na tela acima, o pintor inglês John Everett Millais retrata a morte de Ofélia para exprimir essa integração. O suicídio da personagem de Hamlet, de William Shakespeare, serviu de inspiração para a articulação entre realidade subjetiva e realidade objetiva. Ao decompor-se, o cadáver de Ofélia entra novamente em harmonia com o mundo natural e restaura a unidade entre sujeito e mundo.

Literatura: Simbolismo
Estudo
Literatura: Simbolismo
A exploração dos sentidos No Simbolismo (1893-1922), a produção poética evoca sentimentos e sensações por meio da sugestão A estética simbolista (durante um período contemporânea do Pré-Modernismo) se opõe aos avanços da industrialização e do progresso tecnológico próprios do século XIX. É comum que os textos simbolistas manifestem uma visão decadente sobre a realidade, bem […]

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