‘Ela nem é tão preta assim’: o que é colorismo, escancarado em cena de ‘Vale Tudo’
Fala polêmica de Odete Roitman mostra como o tom de pele ainda determina acesso, afeto e aceitação social no Brasil

Na nova versão de ‘Vale Tudo’ (Globo), Odete Roitman (Débora Bloch) segue sendo o retrato de uma elite brasileira que, mesmo em 2025, não abandonou seu racismo velado. Em mais uma das cenas comentadas nas redes sociais, a personagem reage à aproximação entre Maria de Fátima (Bella Campos) e seu filho, Afonso (Humberto Carrão), com um comentário que diz muito mais do que parece à primeira vista: “E ela nem é tão preta assim”.
A frase, dita em tom aparentemente pragmático, revela a lógica perversa do colorismo: uma forma de discriminação baseada no quão escura é a pele de pessoas negras. Ao considerar que Maria de Fátima pode ser “aceita” por ter pele clara, Odete não só reproduz um racismo histórico como expõe como essa hierarquia de tons continua viva no imaginário social brasileiro.
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O que é colorismo?
O colorismo é a discriminação baseada na tonalidade da pele dentro da própria população negra. Ou seja, quanto mais escura a pele, maior o preconceito enfrentado. E, inversamente, quanto mais clara, mais benefícios sociais e afetivos são possíveis – ainda que nunca plenos como os oferecidos à branquitude.
A fala de Odete ilustra exatamente esse mecanismo perverso: Maria de Fátima só é “tolerável” por não ser retinta. Ela não é branca, mas, aos olhos da elite que Odete representa, talvez seja “aceitável”. Esse tipo de lógica não é ficção.
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Uma forma de controle
A história do Brasil foi construída sobre a tentativa de embranquecimento da população. Após a abolição da escravidão, políticas eugenistas e o estímulo à imigração europeia formaram um projeto claro: apagar os traços africanos e indígenas da identidade brasileira.
A miscigenação, longe de ser um símbolo de harmonia racial, foi muitas vezes usada como ferramenta de apagamento e controle.
Como lembra a ativista Nina Chrispim, o colorismo não é apenas uma discussão interna entre pessoas negras, é, sobretudo, um instrumento da sociedade racista para “hierarquizar corpos”. Quanto mais escuro o tom da pele, menos acesso a espaços de poder, afeto e reconhecimento.
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“Menos negra”
Apesar de ficção, a fala de Odete não é isolada. Ela ecoa no cotidiano de milhares de brasileiros: gente que se vê negra, mas é lida como “menos negra” pela sociedade.
Essa “confusão ideológica”, como define a sociólogo Laíse Neres, não é casual. Ela serve ao mito da democracia racial, que insiste em dizer que no Brasil “somos todos iguais”, ao mesmo tempo em que privilegia brancos e exclui negros – especialmente os de pele mais escura.
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Na cena de ‘Vale Tudo’, Odete Roitman verbaliza o que muitas vezes é apenas sugerido: que o valor de uma pessoa negra está condicionado à distância que ela tem do que se considera o padrão branco.
Que se aprofundar ainda mais no tema? Leia este outro texto completo sobre o assunto.
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