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O que é a Era do Antropoceno – e por que alguns defendem que entramos nela

Para um grupo de cientistas, a vida humana na Terra já teria causado impacto o suficiente no planeta para caracterizar uma nova era geológica

Por Luccas Diaz
Atualizado em 21 jul 2023, 16h57 - Publicado em 21 jul 2023, 16h56
Usina termal a carvão Jänschwalde em Brandenburgo, na Alemanha
Usina termal a carvão Jänschwalde em Brandenburgo, na Alemanha (fhm/Getty Images)
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Um lago na região de Ontário, no Canadá, foi apontado por um grupo de cientistas como o representante do início de uma nova era geológica. A nomeação foi feita pelo Grupo de Trabalho do Antropoceno, e anunciada durante uma coletiva de imprensa na França no início deste mês. Segundo os cientistas, o lago Crawford é a prova de que a Terra vive, desde 1952, uma nova era geológica, marcada pelas ações da vida humana no planeta: a era do antropoceno.

A nomeação de um nova era geológica causa estranheza na comunidade científica por ser a primeira a ser caracterizada pelas consequências da vida humana na Terra – ao contrário das anteriores, que seguiam os impactos de fenômenos naturais, como a era do gelo. O acúmulo de gases de efeito estufa, a exploração irresponsável dos recursos naturais, o acúmulo de lixo, e o uso de energia nuclear seriam alguns dos fatores que definiriam essa nova era.

Por mais que outras provas mais “informais” já contribuíssem para a defesa dos cientistas do grupo, é o lago Crawford que traz pela primeira vez argumentos concretos a cerca do novo momento geológico. O lago é do tipo meromítico, o que, em termos mais simples, quer dizer que é um lago de águas paradas: a agua da sua superfície nunca se mistura com a água do fundo, que fica a 24 metros de profundidade. Esta característica permite que os sedimentos depositados no fundo do corpo d’água sejam excelentemente preservados. Uma pequena amostra funciona como uma verdadeira cápsula do tempo.

Assim, nas análises dos sedimentos, os cientistas encontraram isótopos de carbono, resultantes da combustão de combustíveis fósseis; um aumento nos níveis de fósforo e nitrogênio, elementos muito associados ao uso de fertilizantes; e até mesmo plutônio radioativo, um provável resquício de bombas nucleares.

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De acordo com o Grupo de Trabalho do Antropoceno, as mudanças nos sedimentos tiveram dois grandes momentos no lago Carwford: ambos relacionados à vida humana. O primeiro, com a chegada dos povos indígenas Iroqueses que fizeram sua morada ao seu redor, e o segundo com a chegada dos colonizadores europeus. Ainda assim, os momentos de maior alteração datam a partir do século 20, justamente o início da maior aceleração do desenvolvimento humano.

No entanto, o argumento do grupo ainda não foi aceito por toda a comunidade científica – e para alguns, não passa de uma mera hipótese. Para entender o que significa uma era geológica, e, sobretudo, uma caracterizada pelo homem, o GUIA DO ESTUDANTE conversou com Vagner Augusto da Silva, professor e autor de Geografia do Curso e Sistema de Ensino Anglo.

O que é uma era geológica

De acordo com a escala oficial, a Terra vive hoje a época do Holoceno, iniciada há cerca de 11,6 mil anos atrás, com o fim do Pleistoceno (popularmente conhecida como era do gelo). O professor explica que a classificação proposta pelos cientistas na escala geológica nada mais é do que uma forma de facilitar os estudos acerca da história da planeta.

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“Os cientistas criaram uma escala que divide o tempo geológico em períodos, como se fosse um calendário. Este ‘calendário geológico’ é dividido primeiramente em éons, que correspondem aos intervalos de tempo mais longos da escala, e são três: Arqueano, Proterozoico e Fanerozoico. E estes éons, por sua vez, são subdivididos em eras geológicas, que representam unidades de tempo menores”, diz.

Quem era uma criança fascinada por dinossauros, vai se lembrar que esses animais gigantescos dominaram o planeta durante a era Mesozoica (cuja duração foi de aproximadamente 200 milhões de anos, e que, por sua vez, é dividida nos períodos Triássico, Jurássico e Cretáceo). Antes dela, houve a era Paleozoica (que durou 291 milhões de anos) e depois dela a Cenozoica (com 65 milhões de anos).

Todas as eras são dividas a partir de um compilado de características geológicas que definem aquele momento. O professor pontua, por exemplo, que foi também na era Mesozoica que houve a separação gradativa do supercontinente Pangeia, criando a divisão continental que temos hoje.

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Dentro das eras, há divisões que vão representando, progressivamente, períodos ainda menores de tempo, como épocas e idades. Vejam abaixo a tabela que resume a escala do tempo geológico. Estamos na época do holoceno, do período quartenário, da era cenozóica, do éon Fanerozóico.

Tabela com a escala do tempo geológico
(Wikimedia Commons/Reprodução)

Era do Antropoceno – mas ainda só para alguns

O termo “antropoceno” foi popularizado no início dos anos 2000 pelo químico holandês Paul J. Crutzen (1933-2021). Vem do grego “anthropos”, que significa “homem”, e “kainos”, que sinifica “novo”. O autor, que foi o vencedor do Prêmio Nobel de Química de 1995, defendia que a palavra holoceno não servia mais para descrever com precisão o momento atual do planeta, e que a era do antropoceno já havia começado desde os anos 1800. “Estava em uma conferência e alguém mencionou o holoceno. De repente, pensei que esse termo era incorreto. O mundo tinha mudado muito. Eu disse ‘não, estamos no antropoceno'”, conta o autor.

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Mas se você leu este texto até aqui, deve ter percebido que definir o antropoceno como uma era geológica pode parecer um tanto drástico. A proposta do grupo de considerar uma nova era geológica, e não apenas uma idade, época ou período, é vista como ousada e não tem sido recebida de maneira igual pelos cientistas. A nomeação, por enquanto, não passa de um hipótese: precisa passar por uma série de votações para ser aprovada oficialmente – e pode ser descartada.

Para grupo de cientistas, vida humana no planeta já teria causado impactos o suficiente para caracterizar uma nova era geológica (Wikimedia Commons/Reprodução)

“Grande parte do mundo científico enxerga o antropoceno como uma hipótese cientifica. Ainda está em discussão a possibilidade de defini-lo como um período ou uma época geológica”, explica o professor. “A maioria dos cientistas não vê a possibilidade de defini-lo como um intervalo de tempo maior, ou seja, como uma era de fato”.

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A resistência por parte da comunidade científica é justamente pelo ponto que faz o antropoceno ser o antropoceno. Afirmar que a vida humana na Terra tenha se tornado um fator no sistema capaz de alterar significativamente o planeta é igualar o homem a elementos como o clima, a biodiversidade, os mares e os oceanos. O professor relembra que a Terra tem aproximadamente 4,6 bilhões de anos, e já passou por grandes transformações paisagísticas, assim como o surgimento de distintas formas de vida.

Outros cientistas pontuam que parece haver uma maior preocupação com a simbologia por trás do título do que, de fato, ações para frear ou amenizar os impactos negativos.

 

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