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O que é paradoxo da tolerância e como ele pode ser usado na redação

O filósofo austríaco Karl Popper questionou até que ponto a sociedade deve ser tolerante com os intolerantes

Por Luccas Diaz, Taís Ilhéu
Atualizado em 9 fev 2022, 18h45 - Publicado em 9 fev 2022, 16h14

A liberdade de expressão é um dos pilares de uma sociedade democrática. Em sua essência, ela garante a todo indivíduo o direito de exprimir sua opinião. Para sustentar tamanha multiplicidade de pensamentos, no entanto, é primordial que essa sociedade democrática conte com um outro ingrediente: a tolerância. É ela quem dita que devemos estar dispostos a ouvir, respeitar e conviver com opiniões divergentes das nossas.

Mas e quando essa opinião divergente tem como pano de fundo justamente a intolerância? Quando ela prega que determinado grupo étnico deve ser segregado ou que as pessoas precisam ser punidas por sua orientação sexual? E quando uma opinião, na verdade, incita à violência e ao ódio? Nestes casos, devemos ser tolerantes ao intolerante?

São esses questionamentos que levam o filósofo contemporâneo Karl Popper (1902-1994) a definir o chamado “paradoxo da tolerância”. O termo apareceu pela primeira vez em seu livro “A Sociedade Aberta e Seus Inimigos”, de 1945, resultado das observações do filósofo frente aos movimentos totalitários do século XX. Ele defende que uma sociedade que se declara tolerante deve ser intolerante à intolerância.

Tolerar ou não tolerar?

Para o filósofo, ao aceitar os intolerantes, os tolerantes – e a chamada sociedade tolerante – podem ser levados a destruição. Isso porque uma tolerância ilimitada se torna vulnerável a qualquer tipo de ataque intolerante que se disfarce sob o discurso da liberdade de expressão.

“A tolerância ilimitada leva ao desaparecimento da tolerância. Se estendermos a tolerância ilimitada mesmo aos intolerantes, e se não estivermos preparados para defender a sociedade tolerante do assalto da intolerância, então, os tolerantes serão destruídos e a tolerância com eles”, escreve Popper em seu livro.

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Tolerância limitada?

Se, então, para ser tolerante, deve-se em alguma medida ser intolerante, não há espaço para o debate dessas ideias ou mesmo para a existência de opiniões divergentes? Não é bem assim. Karl Popper explica que a prioridade deve ser sempre combater ideários intolerantes com argumentos sólidos. “Nessa formulação, não insinuo, por exemplo, que devamos sempre suprimir a expressão de filosofias intolerantes. Desde que possamos combatê-las com argumentos racionais e mantê-las em xeque frente à opinião pública, suprimi-las seria, certamente, imprudente”, afirma

O combate mais incisivo às filosofias intolerantes, no entanto, não deve ser uma opção descartada sobretudo quando a única resposta desse grupo é a violência.

“Devemos-nos reservar o direito de suprimi-las, se necessário, mesmo que pela força. Pode ser que eles [intolerantes] não estejam preparados para nos encontrar nos níveis dos argumentos racionais, ao começar por criticar todos os argumentos e proibindo seus seguidores de ouvir argumentos racionais, porque são enganadores, e ensiná-los a responder aos argumentos com punhos ou pistolas”, explica.

Dessa forma, o paradoxo da tolerância questiona até que ponto ideias intolerantes devem ser toleradas se infringem, ofendem ou incentivam algum tipo de violência às liberdades de um indivíduo ou um grupo. Pode ser confuso, mas é um paradoxo justamente por isso.

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Se você lembrou das aulas de Língua Portuguesa sobre figuras de linguagem, está certíssimo. O termo se chama “paradoxo” por ser, à primeira vista, contraditório. Assim como na figura de linguagem, um paradoxo vai apresentar uma ideia bem fundamentada e coerente, mas que não necessariamente segue uma ordem lógica. Para Karl Popper, sustentar uma sociedade tolerante requer, por vezes, não tolerar.

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Mas e a liberdade de expressão?

Vejamos um exemplo. Você está andando por uma praça e de repente se depara com um grupo de jovens fazendo um discurso intolerante em um pequeno palanque. Talvez um dos seus primeiros pensamentos seja que eles estão apenas exercendo a sua liberdade de expressão, como garantido na própria Constituição Federal.

É preciso lembrar, porém, que liberdade de expressão é diferente de discurso de ódio. Todos são livres para discordar, mas assaltar a existência, a índole ou a liberdade do outro deixa de ser uma opinião e se torna um ataque.

Um exemplo é quando, em 2016, o livro “A Minha Luta”, escrito por Hitler sobre os ideais nazistas, foi impedido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro de ser comercializado, já que a obra incentivava práticas intolerantes contra determinados grupos da sociedade.

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Argumentando com o paradoxo da tolerância

O paradoxo da tolerância e o próprio Karl Popper não são citados com tanta frequência nos grandes vestibulares talvez você não se depare, por exemplo, com uma questão pedindo para definir esse conceito nas provas.

Apesar disso, a ideia do filósofo austríaco pode ser uma ótima carta na manga para argumentar nas redações. Afinal, o paradoxo da tolerância atravessa qualquer tema relacionado à liberdade de expressão, discurso de ódio e intolerância.

Um exemplo é a proposta de redação do Enem 2016. Naquela edição, os candidatos deveriam dissertar sobre “Os caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”. Foram fornecidos textos motivadores que tratavam da legislação sobre o assunto e dos efeitos da intolerância religiosa. Um desses excertos afimava:

“O direito de criticar dogmas e encaminhamentos é assegurado como liberdade de expressão, mas atitudes agressivas, ofensas e tratamento diferenciado a alguém em função de crença ou de não ter religião são crimes inafiançáveis e imprescritíveis.”

STECK, J. Intolerância religiosa é crime de ódio e fere a dignidade. Jornal do Senado. Acesso em: 21 maio 2016 (fragmento)

A partir deste tema, o estudante poderia mobilizar a teoria da intolerância de Karl Popper para afirmar que, em casos extremos, onde a segurança e a dignidade de pessoas que praticam determinada religião são colocadas em risco, a intolerância aos intolerantes é cabível prevendo medidas no campo penal, por exemplo.

A Fuvest também abriu caminho para esse argumento no vestibular de 2001, quando propôs que os candidatos desenvolvessem uma redação sobre o crescimento do neonazismo e do neofascismo. Um dos textos de apoio era uma reportagem da revista Isto é de 2000, que relatava uma marcha nazista realizada na cidade de São Paulo. A manifestação culminou no envio de bombas para defensores de Direitos Humanos e pessoas pertencentes a minorias sociais.

O candidato poderia mobilizar este e outros registros históricos acerca do nazismo, como o próprio holocausto, para exemplificar os efeitos práticos de não combater discursos intolerantes. Na Alemanha nazista, a tolerância a Hitler e aos seus ideias resultou na morte de milhares de pessoas e na completa erradicação de uma sociedade tolerante.

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