Em uma eleição cercada por suspeitas de fraude, Nicolás Maduro reelegeu-se presidente da Venezuela. A ONU (Organização das Nações Unidas) acusa Maduro de violar Direitos Humanos ao perseguir opositores. O TPI (Tribunal Penal Internacional) investiga o governo venezuelano por torturas e execuções, inclusive de manifestantes. Já os Estados Unidos considera que Maduro tem envolvimento com o narcotráfico.
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O presidente da Venezuela responde que as acusações internacionais são enviesadas, e acusa ser vítima de uma perseguição do governo americano, que desde 2014, quando Maduro foi eleito presidente, impõe embargos econômicos ao país.
Entenda quem é, afinal, o homem por trás de inúmeras acusações, que assumiu o governo da Venezuela após uma década de exorbitante crescimento e avanços sociais, e hoje está à frente de um país mergulhado na crise política e econômica.
Nicolás Maduro surge e cresce na política venezuelana
Foi no início dos anos 1990 que Nicolás Maduro despontou no cenário político venezuelano. Nesta época, o proeminente líder sindicalista, que até então trabalhava como motorista de ônibus na capital Caracas, decide aderir ao MBR-200 (Movimiento Bolivariano Revolucionario 200). O grupo da esquerda articulava-se para realizar uma revolução no país, que deporia o então presidente Carlos Pérez e levaria ao poder Hugo Chávez, militar paraquedista que estreita os laços com Maduro a partir daí.
A tentativa de levar o plano a cabo, em 1992, fracassou e Chávez foi preso. Militantes do MBR-200, entre eles Nicolás Maduro, protestaram ativamente contra a prisão do líder e articularam-se nos anos seguintes para a criação do Movimento V República (MVR), partido que em 1999 elege Hugo Chávez presidente.
Nos anos seguintes, Maduro ganhou cada vez mais projeção na política. Foi primeiro eleito para a Câmara dos Deputados, em 1998, e depois passou a fazer parte da Assembleia Nacional Constituinte, responsável por elaborar a nova Constituição venezuelana. Dois anos depois, em 2000, concorreu e foi mais uma vez eleito para a Assembleia Nacional, agora já em uma nova configuração dos poderes instituída pela Constituição. Em 2005, foi reeleito.
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Maduro passa a ocupar um cargo no executivo em 2006, quando é nomeado ministro das Relações Exteriores, e só o deixa em 2012 para tornar-se vice-presidente. Durante estes anos, a Venezuela experimentava um período de vertiginoso crescimento. Com o petróleo, principal produto nacional, sendo exportado a preços recordes, o país investia pesado em políticas sociais nas áreas de saúde, educação e habitação. A taxa de pobreza urbana no país passou de 49% em 1999 para 29% em 2010. A Venezuela tornou-se o país menos desigual da América Latina, segundo o Índice de Gini da ONU (Organização das Nações Unidas).
Mas a escalada da violência no país já chamava a atenção, assim como o autoritarismo do governo Chávez. O presidente centralizou ao longo dos anos o poder político, restringindo a atuação do legislativo e influenciando nas decisões do judiciário. Os ares de crise política já estavam instaurados quando, em 2013, Hugo Chávez morre vítima de um câncer.
Nicolás Maduro assume interinamente como presidente do país, mas elege-se formalmente um mês depois em uma eleição presidencial apertada. A Venezuela chavista que Maduro herda, no entanto, já não é mais a mesma.
O presidente da Venezuela em crise
Se durante o governo de Hugo Chávez a Venezuela tornou-se – ainda que com ressalvas – reconhecida pela redução da desigualdade, nos anos seguintes a sua morte o país mergulhou vertiginosamente em uma crise marcada pela fome e extrema pobreza. Nicolás Maduro tornou-se presidente da Venezuela em crise.
O preço do barril de petróleo despencou, a inflação disparou e o resultado de uma economia pouco diversificada começou a aparecer. As prateleiras dos supermercados esvaziaram-se, a população passou a sofrer com a fome. Em meio a políticas equivocadas e ao descontentamento da população, a Venezuela também foi alvo, a partir de 2014, de embargos cada vez maiores dos Estados Unidos – mais tarde acompanhados por outros países como Canadá e Reino Unido. A justificativa para o boicote eram as denúncias de violação de Direitos Humanos.
Para completar, o país tornou-se cada vez mais isolado, mesmo regionalmente. Em dezembro de 2016, a Venezuela é suspensa do Mercosul por não obedecer as regras de adesão do bloco econômico – desde normas de comércio até o respeito aos Direitos Humanos. Vale lembrar que neste ano o Brasil, principal líder do Mercosul, passou a ser governado por Michel Temer após o impeachment de Dilma Rousseff. Com isso, a Venezuela perdia um importante parceiro.
A crise econômica já andava de mãos dadas com a crise política.
As acusações contra Maduro, da ONU aos Tribunal Penal Internacional
Desde que assumiu o poder na Venezuela, Nicolás Maduro é acusado de combater com violência seus opositores, restringir a liberdade de expressão e imprensa e cercear a atuação de outros poderes.
Em 2016, por exemplo, Maduro obteve uma autorização da Suprema Corte para retirar os poderes da Assembleia Constituinte, restringindo a atuação do legislativo. O mais recente pleito presidencial que o reelegeu também é cercado de acusações: os opositores acusavam que a eleição não foi limpa, e seu oponente Juan Guaidó, então presidente da Assembleia Constituinte, chegou a se declarar presidente interino – na ocasião, o ex-presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, reconheceu Guaidó como tal.
Nicolás Maduro, no entanto, segue à frente do país. Por estas e outras razões, o Índice V-Dem, elaborado na Suécia, classifica a Venezuela como uma autocracia eleitoral: um regime que apesar de realizar eleições, é autoritário.
Outras organizações e documentos internacionais apontam o autoritarismo do presidente venezuelano. Um relatório da ONU publicado em 2020 acusa Maduro e seu governo de cometer crimes contra a humanidade, em uma conduta disseminada e sistemática. Entre os crimes estariam execuções de opositores, detenções arbitrárias, tortura e desaparições. Desde 2021, Maduro é investigado também pelo Tribunal Penal Internacional, sob as mesmas acusações.