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O poder da bancada ruralista no Congresso

Para os grandes proprietários rurais, as demarcações de terras indígenas representam um obstáculo para o avanço do agronegócio

Por Fabio Sasaki
Atualizado em 1 ago 2019, 14h54 - Publicado em 4 ago 2017, 12h12
Plantação de soja em Campo Verde, Mato Grosso (iStock/iStock)
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A bancada ruralista, ou Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), é uma das maiores e mais atuantes bancadas da Câmara dos Deputados, formada por mais de 200 deputados federais (do total de 513) de diversos partidos.

Eles representam os interesses dos grandes produtores rurais e latifundiários. Costumam articular-se para pautar assuntos da agenda política a ser discutida na Câmara e votar em peso temas de seu interesse. É considerada a mais influente nas discussões, articulações e negociações de políticas públicas no âmbito do Poder Legislativo.

OS INTERESSES DA BANCADA RURALISTA

A Frente Parlamentar da Agropecuária defende políticas públicas de estímulo ao agronegócio. De modo geral, reivindica a ampliação do financiamento rural e a flexibilização da legislação trabalhista e criticam as legislações ambientais e a reforma agrária. Conheça algumas áreas nas quais a bancada ruralista exerce grande influência nas discussões no Congresso:

Legislação ambiental

O poder da bancada ruralista no Congresso
Caminhão transporta madeira extraída ilegalmente da reserva indígena de Arariboia, no Maranhão (Mario Tama/Getty Images)

A bancada ruralista teve papel decisivo na aprovação do Código Florestal Brasileiro, em 2012. Por influência dos produtores rurais, a nova legislação deu anistia aos produtores que desmataram, até julho de 2008, acima do permitido e determinou que eles não fossem punidos, desde que recuperassem as áreas desmatadas.

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A FPA também faz pressão para que o setor agropecuário possa explorar economicamente áreas que atualmente contam com proteção ambiental. Atualmente, os ruralistas negociam com Michel Temer a aprovação de uma lei que altera o destino do Parque Nacional de Jamanxim, uma das áreas mais preservadas da Amazônia no Pará. Esta região é uma unidade de proteção integral – ou seja, não é permitida a ocupação humana nem a exploração de recursos. Mas uma nova lei em trâmite no Congresso quer transformar a região em uma Área de Proteção Ambiental (APA) – a categoria mais fraca de proteção das matas, que permite não apenas a ocupação humana, mas também a criação de fazendas e outras atividades econômicas.

Além da tentativa de ampliação das APAs, tramitam no Congresso diferentes projetos de lei que alteram as regras para o licenciamento ambiental – exigência legal para qualquer empreendimento que emprega recursos naturais ou possa degradar o meio ambiente. Pela proposta, vários tipos de empreendimento e atividades ficariam livres do licenciamento ambiental, como projetos de rodovias, ampliação de portos e agropecuária extensiva. Além disso, os projetos propõem menos laudos técnicos, prazos exíguos para estudos e autorização e, em alguns casos, dispensam a consulta às comunidades que serão afetadas. Os ruralistas alegam a necessidade de diminuir as restrições para destravar o desenvolvimento econômico.

Reforma agrária

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Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra faz manifestação pela reforma agrária, em Brasília (José Cruz/Agência Brasil)
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Com uma posição contrária à reforma agrária, a bancada ruralista foi decisiva na aprovação pelo Congresso de uma Medida Provisória (MP), em junho, que altera a política de distribuição de terras do governo federal. Uma das principais mudanças é que, em vez de focar a distribuição de terras, a gestão de Temer irá priorizar a concessão de títulos de propriedade.

Pela legislação antiga, os assentados recebiam da União uma concessão para o uso da terra, que não poderia ser comercializada, apenas transferida para os filhos. Agora o governo irá oferecer a titulação, ou seja, irá obrigar os atuais concessionários a comprar o título definitivo da terra pelo valor de mercado da área, com descontos que variam de 20% a 60%, em até dez anos. De posse do lote, o proprietário pode comercializá-lo como quiser após dez anos. Segundo o governo, a medida busca garantir maior segurança jurídica ao regularizar a situação dos assentados, que passariam a ter acesso a programas de crédito agrário do governo.

De acordo com os movimento sociais ligados à terra, essa decisão permite aos latifundiários  adquirir os lotes dos assentados após o período de dez anos de emissão do título. Como muitos pequenos proprietários podem ter dificuldades para pagar pela terra que comprou da União, uma solução contra o endividamento seria vender seus lotes para grandes fazendeiros, o que aumentaria ainda mais a concentração de terras. Além disso, essa nova política praticamente interrompe as novas desapropriações, beneficiando os grandes proprietários donos de terras ociosas. Outro ponto polêmico é que a nova lei abre brechas para conceder anistia a loteadores irregulares e grileiros.

>> Veja também: Os desafios da reforma agrária no Brasil

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Terras indígenas

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Índios protestam contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira (Mario Tama/Getty Images)

Para os grandes proprietários rurais, as demarcações de terras indígenas representam um obstáculo para o avanço do agronegócio. Desde que Temer assumiu a presidência em maio de 2016 e consolidou seu alinhamento com a bancada ruralista e Temer, nenhum decreto de homologação para demarcações foi assinado pelo presidente.

Além disso, estão em trâmite na Câmara e no Senado diversas medidas que afetam as comunidades indígenas e contam com o respaldo dos ruralistas. Uma delas é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, que visa a transferir do Executivo para o Legislativo o poder de aprovar terras indígenas e quilombolas e ratificar ou até revisar demarcações já homologadas, além de vedar ampliação de terra indígena já demarcada.

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Os deputados que a defendem alegam que a forma como a demarcação e a regularização definitiva de Terras Indígenas acontecem atualmente ameaça a produção e a expansão do agronegócio. As lideranças indígenas argumentam que a PEC 215 transformaria o que hoje é o reconhecimento de seu direito constitucional à terra em um processo à mercê de negociação de interesses econômicos e políticos para votações no Congresso, onde a bancada ruralista tem muita força.

Uma outra proposta em andamento no Congresso também ameaça o direito dos índios, como a PEC 187/2016, que quer permitir atividades agropecuárias em territórios indígenas.

Trabalho no campo

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Trabalhador rural corta cana em Patrocínio Paulista (SP) (Andre Vieira / Stringer/Getty Images)

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Outra pauta defendida pela bancada ruralista é a alteração das regras do trabalho no campo. O próprio presidente da FPA, o deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), é autor do Projeto de Lei que deverá ser discutido por uma Comissão Especial na Câmara no segundo semestre.

Entre as propostas apresentadas estão a possibilidade de jornada de trabalho de 18 dias seguidos sem folga, a liberação de trabalho aos domingos e feriados e a retirada da contabilização do tempo de deslocamento até o trabalho como parte das horas trabalhadas – este último item é fundamental para o trabalhador rural, que gasta muitas horas para chegar à área da produção agropecuária.

Outros pontos polêmicos dizem respeito à segurança e à saúde do trabalhador. O projeto tira dos ministérios da Saúde e do Trabalho o estabelecimento de regras para a manipulação de agrotóxicos. Além disso, o texto da proposta diz que a remuneração pode ser feita por meio de “salário ou remuneração de qualquer espécie”, o que abre brechas para que o trabalhador rural seja remunerado com moradia e alimentação – esta situação poderia ser caracterizada como trabalho análogo à escravidão.

Para os defensores da mudança, as novas regras representam uma modernização na legislação criada em 1973, quando o trabalho agropecuário tinha um perfil diferente. Já quem contesta as medidas, aponta que elas são um retrocesso e atendem apenas aos interesses dos empregadores.

>> Veja também: A persistência do trabalho escravo

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