Presidente, primeiro-ministro, rainha, chanceler. Todos esses nomes podem ser atribuídos a figuras de extrema importância para uma nação, cultura e povo. Representam os cargos mais altos dentro da hierarquia de um Estado e acumulam funções primordiais para o funcionamento e desenvolvimento de um país. Mas, afinal, qual é a diferença, por exemplo, entre a rainha da Inglaterra, Elizabeth II, e a atual primeira-ministra, Theresa May? Quais são as diferenças entre esses dois cargos e porque em alguns países, como o Brasil, não existe essa divisão?
Essas e outras perguntas podem ser respondidas por meio de dois conceitos da teoria política: Chefe de Estado e Chefe de Governo. A forma como esses dois cargos se apresentam variam muito de país para país. Isso porque eles estão diretamente ligados à história local, ao desenvolvimento das instituições nacionais e ao pensamento político e cultural da população. Por essa razão, existem países em que o Chefe de Estado e o Chefe de Governo são pessoas diferentes e também países em que as duas funções estão unidas em torno de uma só pessoa ou então ainda dividida entre mais pessoas e até divida por países.
Em termos gerais, Chefes de Estado e Chefes de Governo se diferenciam pelos poderes, funções e responsabilidades atribuídos a eles pela constituição do Estado-nação e pela tradição nacional. Enquanto o primeiro desempenha um papel simbólico e cerimonial muito significativo e de enorme visibilidade, o segundo concentra as tarefas do gabinete do Poder Executivo.
Para poder mostrar como operam os dois cargos, usaremos de exemplo três países com sistemas políticos diferentes (para entender melhor os sistemas, recomendo a leitura desse artigo), Inglaterra (parlamentarista), França (semipresidencialista) e Estados Unidos (presidencialista). O caso brasileiro, assim como a grande maioria dos países latino-americanos, está muito próximo do sistema americano, então, voltaremos para ele mais adiante.
Chefe de Estado
O Chefe de Estado pode ser considerado o representante público mais elevado de um Estado-nação. Ele tem um papel representativo que excede a própria população e personifica os ideais e longevidade do Estado. Ele serve como um símbolo da legitimidade e da força de um país. Como incorporação do espírito de uma nação, o Chefe de Estado normalmente é alguém que representa, seja pela sua hereditariedade, sua força ou eleição, o poder de um povo. Por isso, em muitos países, inclusive europeus, ele está fundamentado na família real e o rei ou a rainha detém o título de Chefe de Estado.
Dentro das funções e responsabilidades do Chefe de Estado, estão diversos compromissos simbólicos. Entre eles estão condecorar heróis de guerra, receber Chefes de Estado estrangeiros e suas delegações em seu país, ir em caráter oficial para outros países representar a vontade da sua nação, manter diálogos abertos com líderes nacionais e internacionais e participar de inaugurações, eventos especiais (esportivos, artísticos, etc.). Além disso, a imagem do Chefe de Estado é muitas vezes usada também para garantir essa representatividade, então, retratos podem estar presentes em estabelecimentos públicos e moedas, por exemplo.
Junto com o papel simbólico, o Chefe de Estado assume poderes executivos e políticos também. Em muitos países ele exerce um papel diplomático importante, podendo assinar e ratificar tratados internacionais, como se fosse um ministro de relações exteriores. Em muitos outros, o Chefe de Estado tem a prerrogativa de nomear ministros e até Chefes de Governo e juízes. Além disso, ele é considerado o comandante máximo das forças armadas em muitos países, pode ter imunidade judicial e poder de conceder perdão (no Brasil, por exemplo, o presidente pode conceder indulto a presos, os livrando de sua pena; o mesmo ocorre em outros diversos países, de maneiras diferentes).
Na sua maioria, o Chefe de Estado concentra, inclusive, algumas funções legislativas, como assinar, ratificar e até vetar leis e projetos das câmaras legislativas, dissolver o legislativo e demitir Chefes de Governo.
Vale ressaltar que todas as responsabilidades e poderes listados acima variam de país para país e que cada caso é praticamente exclusivo do local a que pertence.
Outro ponto que varia é a fonte da legitimidade do Chefe de Estado. No Vaticano, por exemplo, o Papa desempenha o papel de Chefe de Estado por meio de uma legitimidade religiosa. Já na Inglaterra, é o sangue real que confere essa legitimidade. Em países presidencialistas, como os Estados Unidos e o Brasil, a legitimidade vem do voto. Há ainda casos de Chefes de Estado designados e impostos por outros países e também que chegaram ao poder por meio da força ou revolução.
Voltando aos países tomados como exemplos: na Inglaterra, como dito anteriormente, o Chefe de Estado é a rainha ou o rei e eles assumem os papéis simbólicos e legislativos. Na França, o presidente é o Chefe de Estado, eleito por voto direto em dois turnos. Ele tem a prerrogativa de escolher quem será o Chefe de Governo, mas com aprovação prévia da assembleia nacional. Já nos Estados Unidos, os dois cargos não são diferenciados, ou seja, tanto o Chefe de Estado como o Chefe de Governo são cargos acumulados pelo Presidente.
Chefe de Governo
Ao Chefe de Governo cabe a liderança e a formulação de políticas públicas, econômicas e sociais, manutenção do funcionamento dos poderes executivo e legislativo, diálogo entre os partidos, atores institucionais, Chefe de Estado e população. Em termos gerais, o Chefe de Governo é a figura principal da política do país e o principal articulador das vontades da população.
Em regimes parlamentaristas, o Chefe de Governo também é o chefe do legislativo, enquanto em regimes presidencialistas, como o brasileiro, as casas do Congresso (Senado Federal e Câmara dos Deputados) elegem seus próprios líderes, ou seja, o poder atribuído ao Chefe de Governo também é diverso dependendo da nação e de seu sistema político.
Para ficar por dentro do assunto, leia: Câmara e Senado: qual a diferença?
Relação entre Chefes de Estado e Governo – e algumas críticas
Muitos fatores vão determinar a relação entre o Chefe de Estado e o Chefe de Governo de um país. Em momentos de crise econômica e política, as tensões entre esses representantes se acentua e tradições institucionais podem ser quebradas. Por exemplo: mesmo que um Chefe de Estado tenha a prerrogativa de vetar projetos do legislativo, ele tradicionalmente não interfere na vontade do Poder Legislativo. Mas, em virtude de uma grande crise econômica, esse costume pode se perder e as tensões aumentarem. Por outro lado, outros eventos podem unificar os interesses dos dois cargos, como conquistas internacionais, situações de risco externo extremo ou de catástrofes.
Todo sistema político tem suas vantagens e desvantagens, seus benefícios e perdas e é muito complicado colocá-los em uma escala valorativa. Tanto a Inglaterra quanto os Estados Unidos são países democráticos e estáveis e utilizam formas diferentes de separar o Chefe de Estado do Chefe de Governo. Entretanto, ainda há críticas que podem ser feitas aos dois tipos de regime.
Em uma passagem do artigo “Beyond Our Borders: Do We Need a President and a King?”, os autores afirmam que alguns estudiosos do sistema político americano alegam que juntar os dois cargos acaba acumulando muitas funções em uma pessoa só e que algumas tarefas menos pragmáticas e mais simbólicas como ir em eventos esportivos desviam a atenção de assuntos realmente importantes. Outra visão aponta que esses papéis simbólicos unidos com papéis executivos acabam aumentando a exposição do presidente e isso ajuda na interlocução com a população e com novas formulações de políticas públicas.
Conclusão
Chefes de Estado e Chefes de Governo se apresentam de maneiras diversas ao redor do mundo, dependendo de vários fatores como sistema político, cultura política do país, constituição e história. Os cargos podem estar totalmente unidos e concentrados em uma pessoa (sistemas presidencialistas como o brasileiro e o norte-americano), podem estar estritamente ligados (sistemas semipresidencialistas como o francês) ou também podem estar mais claramente separados (sistemas parlamentaristas como o britânico).
Chefes de Estado acumulam funções basicamente cerimoniais e são porta-vozes de seus países no exterior, enquanto Chefes de Governo são líderes dos gabinetes dos poderes executivo e moldam políticas e leis.
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Fontes: SuperAbril; BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola & PASQUINO, Gianfrano. “Dicionário de Política”. Brasília, Editora Universidade de Brasília, segunda edição (1986); Schmidt, Steffen; Shelley, Mack; Bardes, Barbara (2008). “Beyond Our Borders: Do We Need a President and a King?” American Government and Politics Today, 2009–2010 Edition (14th ed.)