Além de destacar a importância deste recurso, é necessário refletir sobre os impactos da sua utilização. Também é importante lembrar que o petróleo, devido às particularidades em sua formação, é um recurso natural não renovável, ou seja, é bem provável que num futuro próximo as suas reservas se esgotem.
Portanto, o petróleo é considerado um recurso estratégico, apresentando um caráter de extrema relevância para um determinado país ou região, já que seus derivados como gasolina e diesel são utilizados pela maior parte dos meios de transporte. Alguns tipos de solventes, lubrificantes industriais e plástico também derivam do petróleo.
As crises mundiais do petróleo
O petróleo, formado pelo acúmulo de material orgânico sob condições específicas de pressão e isolamento, é o recurso energético mais utilizado no mundo. Sua extração é complexa, sendo feita por equipamentos que perfuram as camadas rochosas e exercem a pressão necessária para trazer o óleo até a superfície.
A importância estratégica deste recurso é tanta que na década de 1970 houve duas “Crises do Petróleo”, a primeira em 1973 e a segunda em 1979. Ambas foram consequência do embargo, ou seja, a proibição ou diminuição da comercialização de um determinado produto, por parte dos países membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP)
A OPEP foi criada em 1960 com o objetivo de centralizar a política petrolífera dos países membros, permitindo que afetem diretamente o preço do barril de petróleo, seja ofertando mais, o que deixa o preço mais baixo, ou restringindo a oferta, fazendo com que o preço suba.
Com isso, a primeira crise aconteceu quando, entre o final de 1973 e começo de 1974, o valor do barril aumentou 400%, causando grandes impactos nas economias de todo o mundo. No Brasil, esta crise coincidiu com o fim do período chamado de “Milagre Econômico”, quando o país, durante a ditadura militar, vivenciou um grande crescimento econômico. Este aumento no preço do barril foi um dos fatores que freou o crescimento do país, pois o Brasil ainda era muito dependente do petróleo importado, o que contribuiu para o aumento da inflação. Este fator contribuiu para o aumento da insatisfação da população, o que fez com que aumentassem as críticas em relação ao governo brasileiro.
Já a segunda crise ocorreu quando o Irã, maior produtor deste recurso, passou pela chamada revolução fundamentalista, quando o Xá Reza Pahlevi foi deposto por um movimento que tinha como a principal figura o Aiatolá Khomeini. O novo líder não simpatizava com os países dependentes do petróleo, como os Estados Unidos, o que trouxe mudanças na oferta do produto, aumentando o preço a níveis nunca antes vistos. Esta crise foi mais extensa que a anterior.
No Brasil, apesar do grande impacto econômico que o aumento do preço do barril de petróleo causou, o país desenvolveu uma alternativa à dependência do petróleo, em especial à gasolina, desenvolvendo o álcool combustível. Fica evidente, assim, que os principais países produtores tem o poder de influenciar diretamente na variação do preço do petróleo e, consequentemente, impactar a economia mundial.
O petróleo no Brasil
Como vimos, o petróleo é um recurso de extrema importância estratégica para os países e para o Brasil não é diferente. A primeira sondagem do petróleo no Brasil foi realizada no município de Bofete, em São Paulo, entre 1892 e 1896, com profundidade de 488 metros, a qual não foi bem sucedida, jorrando apenas uma água sulfurosa, com grande concentração de enxofre. Somente no ano de 1939 que o petróleo foi descoberto no país, no estado da Bahia.
No entanto, na busca de fazer parte da cadeia produtiva do petróleo, o Brasil instalou em Uruguaiana a primeira refinaria do país, no ano de 1932. Vale a pena ressaltar que o petróleo só foi descoberto no país anos depois e, portanto, o petróleo utilizado pela refinaria era importado de outros países.
O setor de petróleo, na época de sua descoberta, ainda era uma iniciativa embrionária no país. Com isso, o Brasil era muito dependente de empresas privadas multinacionais em todas as etapas da exploração petrolífera. Porém, isso não impediu que, mesmo nesse momento inicial, tivesse surgido um debate polarizado, onde parte defendia o monopólio do estado em relação à cadeia produtiva do petróleo, e parte defendia a participação de empresas multinacionais. Com o final da Segunda Guerra Mundial, teve início no país uma grande movimentação em prol da nacionalização do setor.
Apesar de o país ter pequenas reservas e importar grande parte do óleo utilizado, o movimento que defendia a nacionalização através da campanha “o petróleo é nosso” ganhou muita força, pois ter o controle deste recurso estratégico era sinônimo de manter a soberania nacional. As principais consequências deste movimento foi a criação da Petrobras em 1953, no segundo mandato de Getúlio Vargas, através da lei 2004 de 3 de outubro de 1953 que garantia o monopólio da extração do petróleo ao Estado. Esta lei foi posteriormente incorporada à Constituição como artigo. A criação de uma empresa nacional se fez necessária para garantir o monopólio deste recurso, já que não existiam empresas nacionais com recursos financeiros e tecnologia necessária para a extração do petróleo.
Petrobras: a maior estatal brasileira
É impossível falar de petróleo no Brasil sem mencionar a Petrobras e, para tanto, é interessante entender como essa empresa foi criada e quais são os impactos dela na economia do país. A Petrobras é uma empresa de capital aberto, cujo acionista majoritário é o Governo Brasileiro, configurando assim uma empresa estatal de economia mista.
A empresa iniciou suas atividades com o acervo recebido do antigo Conselho Nacional de Petróleo (CNP), que tinha a atribuição de fiscalizar o setor, função hoje exercida pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). De 1954 até 1997, a Petrobras ficou responsável pela exploração, produção, refino e transporte de petróleo em todo território nacional, no regime monopolista, ou seja, no qual era a única empresa atuante.
Nesse período a empresa se tornou líder na comercialização de derivados de petróleo no país. Apesar de, em 1997, o então presidente Fernando Henrique Cardoso ter sancionado a lei que abria o mercado para empresas estrangeiras, a Petrobras permaneceu como a principal empresa no setor no Brasil.
Um importante acontecimento no ano 2000 foi a concessão recebida pela Petrobras por parte da ANP para explorar o bloco BM-S-10 na Baía de Santos. Com isso, foi lançado o Programa Tecnológico da Petrobras em Sistemas de Exploração em Águas Ultraprofundas (PROCAP-3000), o que teria como consequência a perfuração dos poços do pré-sal. No ano de 2005, a empresa chegou pela primeira vez à camada do pré-sal, ainda em caráter experimental, ou seja, para verificar a qualidade do óleo extraído – que acabou sendo de boa qualidade.
Em 2006, após 53 anos de operação da Petrobras, o país alcançava pela primeira vez autossuficiência em petróleo, sendo a produção de petróleo e derivados superior ao seu consumo. A autossuficiência é uma conquista simbólica, já que o parque de refino do país não é suficiente para suprir a demanda por combustíveis, por exemplo, deixando o país ainda dependente da importação do petróleo estrangeiro.
No ano seguinte foi descoberta a maior jazida de óleo e gás natural do país, no campo petrolífero de Tupi, na Bacia de Santos e, em 2008, a Petrobras tornou-se a petroleira mais sustentável do mundo, segundo o ranking da Management & Excellence (M&A), com uma pontuação de 92,25%.
Seguindo essa onda de boas notícias para a empresa, em 2009 esta saltou do vigésimo para o quarto lugar entre as empresas mais respeitadas do mundo, segundo o Reputation Institute. No mesmo período em que a empresa ganhava reconhecimento internacional, iniciavam-se perfurações nos poços da Bacia de Santos que tinham ótimas projeções de produção. Tais fatores fizeram com que a empresa se tornasse uma das mais valiosas do mundo em valor de mercado. Com o intuito de financiar a exploração da camada de pré-sal, a Petrobras realizou em setembro de 2010 uma oferta de ações da empresa, a qual arrecadou 120 bilhões de reais.
Corrupção: ANP no Panama Papers e Petrobras na Lava Jato
A maior investigação dos esquemas de corrupção do Brasil leva o nome de “Lava Jato”. A operação teve início na investigação de uma rede de postos de combustíveis e lava a jato de automóveis, utilizados para movimentar recursos ilícitos de uma organização criminosa. Apesar de posteriormente a investigação ter se expandido para outras organizações criminosas, o nome se manteve.
Inicialmente, a investigação processou, em 2014, quatro organizações criminosas lideradas por doleiros, que são operadores do mercado paralelo de câmbio de moedas. Como consequência desta investigação, o Ministério Público Federal (MPF) recolheu provas de um esquema criminoso ligado à Petrobras. Esse esquema, que segundo o MPF dura há pelo menos dez anos, organizava as empreiteiras em cartel. Isso significa que foi feito um acordo comercial entre as empresas com o intuito de distribuir cotas de participação nas licitações da Petrobras, limitando a concorrência e determinando os preços.
Essa empresas, no entanto, pagavam propina para altos executivos da estatal e outros agentes públicos para garantir vantagens ilícitas. O valor da propina variava de 1% a 5% do total dos contratos, que geralmente se davam na casa dos bilhões de reais, já que eram superfaturados. Os doleiros investigados eram os responsáveis, juntamente com outros operadores financeiros, de distribuir o suborno. Com isso, estima-se que o valor desviado dos cofres da Petrobras esteja na casa dos bilhões de reais.
Além da Petrobras, a ANP também se envolveu em um escândalo de corrupção, pois o auditor-chefe da Agência, Antônio Carlos Neves de Mattos, é citado no “Panamá Papers”. Esta investigação global conduzida pela ICIJ (sigla em inglês para Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), tinha como alvo a indústria de empresas offshore. Este modelo de empreendimento consiste na abertura no exterior de empresas como forma de investimento em bens e ativos. Apresenta-se como uma ótima opção de investimento para grandes empresários.
Porém, esse modelo também é utilizado de forma ilegal, com o intuito de burlar a fiscalização e sonegar impostos, já que muitas vezes as operações não são declaradas. O principal objetivo na abertura de uma offshore ilegal é a de esconder a origem do dinheiro usado para, por exemplo, pagamento de propina. Países conhecidos como paraísos fiscais, onde a incidência de impostos é baixa ou inexistente, são os principais destinos procurados para abertura deste tipo de empresa.
Mattos é servidor do Ministério da Transparência, que foi cedido à ANP, onde trabalha há mais de 10 anos auditando os procedimentos e contas internas, tais como licitações de áreas para exploração de petróleo e o pagamento de royalties. Apesar de Mattos negar ser proprietário de uma offshore, a denúncia levantou suspeitas em relação à honestidade das diversas gestões da agência.
Consequências da corrupção na Petrobras
No final de 2013, a Petrobras apresentava sinais de desaceleração no crescimento extraordinário observado nos anos anteriores. A empresa foi classificada, segundo relatório da Merrill Lynch, como a mais endividada do mundo. Em 2015, com a valorização do dólar, o endividamento da empresa alcançou patamares elevadíssimos, já que a desvalorização cambial gerou maiores despesas financeiras por a empresa ter muitos contratos em dólar.
Aliado a isso, os escândalos de corrupção que envolviam não só a maior empresa estatal do país, mas também as maiores empreiteiras, fizeram com que houvesse uma desaceleração no desenvolvimento da Petrobras. Como consequência o setor petrolífero do país também desacelerou, já que esta empresa estava concentrada na reformulação interna, tendo em vista que alguns dos seus principais executivos estavam envolvidos no esquema de corrupção. Estima-se que o volume de recursos desviados esteja na ordem de bilhões de reais, afetando a saúde financeira da empresa.
Outra importante consequência tem relação com a exploração do pré-sal. Desde a descoberta, a Petrobras se valia da regra conhecida como “operador único”, a qual diz que todos os poços devem ser obrigatoriamente explorados sob o comando da Petrobras, onde esta pode se unir a outras empresas, nacionais ou estrangeiras, desde que ela seja líder da operação e tenha no mínimo 30% de participação nesta associação de empresas.
No entanto, a Lei 13.365 de 2016 altera a forma como ocorre a exploração, anulando a obrigatoriedade da participação da Petrobras. Esta mudança na lei foi defendida pela própria empresa, já que por estar endividada, executa um programa de desinvestimento e quer autonomia para decidir quando entrar num leilão.
Essa medida abriu espaço para a atuação de empresas estrangeiras. Tal fato tem duas principais consequências, o provável aumento da atuação de empresas estrangeiras no setor estratégico, com estimativas de chegar em 30% de participação até 2026, e o aumento da arrecadação de royalties. Ambos são resultado das dificuldades financeiras da Petrobras, as quais limitam a capacidade de investimento da empresa no curto prazo e dificultam a exploração e produção de petróleo, especialmente nas camadas do pré-sal que tem um alto custo de realização. Com a permissão da exploração para outras empresas, a União vai aumentar a arrecadação com os royalties, já que haverá uma aceleração na produção e exploração do recurso energético.
Uma das principais fontes de recursos financeiros do petróleo são os royalties.
O royalty é uma compensação financeira paga ao proprietário da área onde ocorre a extração, no caso do petróleo. Os fatores que influenciam diretamente no valor dos royalties pagos são o volume de produção, o preço do petróleo e o câmbio, já que o pagamento dos royalties é feito em dólar. No Brasil, os royalties pagos são divididos da seguinte forma: 40% para União, 25% para os estados produtores, 10% para municípios produtores, 5% para os municípios com instalações de refinarias ou auxílio à produção e 25% para constituição de um fundo especial que será dividido entre todos os estados, mesmo que não sejam produtores. As empresas petrolíferas pagam de royalty 15% do valor de cada barril extraído, como forma de compensação pelo direito da exploração do petróleo.
Petróleo, um recurso energético e estratégico
O petróleo, assim como seus derivados, são recursos naturais de extrema importância para qualquer nação. Além de serem importantes no aspecto energético, também são importantes no aspecto estratégico. O fator estratégico foi responsável pela postura nacionalista adotada pelo país, com a consequente criação da Petrobras. Esta empresa por muitos anos teve um crescimento expressivo, tornando-se uma das maiores empresas do setor no mundo. No entanto, más decisões gerenciais e corrupção contribuíram para a desaceleração no crescimento da empresa. Por se tratar da maior empresa brasileira, tal fator contribuiu para o desaceleramento do crescimento do país, com impactos mais visíveis nos estados que se beneficiam da atividade, em especial o Rio de Janeiro, estado muito dependente do setor petrolífero.
A centralidade deste recurso, devido à sua importância estratégica, e os seus impactos para a sociedade e meio ambiente são questões que devem ser levantadas. A dependência do petróleo não se mostra interessante, tendo em vista que este não apresenta um efeito multiplicador na sociedade, se comparado a outros recursos, pois a forma de ingresso de recursos se dá através dos royalties, os quais vão diretamente para o cofre do Estado, tornando esse o principal e decisivo condutor da economia. Além disso, o país fica numa posição desfavorável em relação aos principais produtores, tendo em vista as Crises do Petróleo da década de 1970.
Apesar desse cenário, o país ainda depende muito do petróleo, já que o transporte interno é feito majoritariamente através de rodovias. No Dia Mundial do Petróleo, cabe a reflexão em relação aos impactos positivos e negativos deste recurso, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento econômico e social que a produção deste proporciona. Além disso, é interessante pensar em alternativas para não ficar exposto às variações deste mercado, nem a uma única empresa.
Fontes e referências:
Lei de exploração do pré-sal; Planalto; Presença estrangeira no petróleo brasileiro; O que mudou no pré-sal; Autossuficiência do petróleo; O que são royalties; Petrobras; ANP; ANP – Institucional; Crise mundial do petróleo; Segunda crise do Petróleo; Portal da Transparência; Corrupção: auditor-chefe da ANP; Panamá Papers; MPF: Lava Jato; Petrobras; Repsol; Globo: questão energética na atualidade; Lei 9478; Planalto: Constituição; Planalto: emendas
PACHECO, Carlos Augusto Góes. O IMPACTO DOS ROYALTIES DO PETRÓLEO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DOS MUNICÍPIOS DA REGIÃO NORTE FLUMINENSE. Disponível em: https://www.portalabpg.org.br/PDPetro/3/trabalhos/IBP0181_05.pdf