Neste mês, o governo brasileiro anunciou um plano de concessões de rodovias, aeroportos e ferrovias, com o objetivo de estimular os investimentos em infraestrutura. Está prevista para o primeiro trimestre de 2017 a realização de um leilão oferecendo as concessões dos aeroportos de Porto Alegre, Salvador, Florianópolis e Fortaleza. O governo também planeja lançar os editais de cinco trechos rodoviários, além das ferrovias Norte-Sul e Ferrogrão.
Ao atrair os investimentos da iniciativa privada, o governo pretende destravar aquele que é um dos grandes gargalos da infraestrutura brasileira: a matriz de transportes, considerada desequilibrada e insuficiente. Mas o modelo de concessões é o mais adequado para promover o desenvolvimento? Entenda a seguir as questões que envolvem a matriz de transportes no Brasil.
O QUE É MATRIZ DE TRANSPORTE?
Matriz de transporte é o conjunto dos meios de que um país dispõe para transportar pessoas e, principalmente, mercadorias. A ideal é aquela que consegue equacionar de forma adequada as distâncias e a geografia das regiões a ser atravessadas, as características do produto transportado e as exigências econômicas e sociais, minimizando custos financeiros e ambientais incluindo todas as modalidades de transporte:
transporte terrestre, composto de rodovias e ferrovias. As rodovias são indicadas para interligar pontos próximos e cargas urgentes, mas não volumosas. Já as ferrovias são adequadas a trajetos médios e longos, para grandes volumes;
transporte aéreo, dentro do país e para o exterior. O frete é mais caro, mas ideal para o transporte de cargas delicadas e perecíveis ou de urgência para as indústrias;
transporte hidroviário, que inclui os rios, a navegação costeira (chamada cabotagem) e a transatlântica. É feito por barcaças e navios, que são mais lentos, porém muito mais baratos para grandes volumes;
transporte por dutos ou tubulações, fundamental para o transporte de gás, petróleo e água para a agricultura e a indústria.
QUAL A SITUAÇÃO DA MATRIZ BRASILEIRA?
O Brasil enfrenta um déficit de infraestrutura logística. Ou seja, faltam rodovias, hidrovias, ferrovias, hidrovias, aeroportos e estrutura portuária para atender a uma demanda reprimida. Afora isso, nossa matriz é extremamente desequilibrada. Um país de dimensões continentais como o Brasil, que movimenta mercadorias internamente e exporta grande volume de grãos e minérios produzidos em áreas distantes do litoral, deveria usar, de forma integrada, várias modalidades de transporte. Não é o que acontece. Mais de 60% de todo o transporte do país acontece em rodovias. De outro lado, as hidrovias, ideal para o transporte de grãos do interior para o litoral, representa apenas 13% da matriz.
Hoje, qualquer ideia sobre modernização, manutenção e expansão da matriz de transportes se baseia na intermodalidade ou transporte intermodal – a integração das várias opções de transporte. Por exemplo: transportar determinada carga por caminhão até um trem ou barcaça que a levará até um porto para exportação. A intermodalidade exige, além das vias de transporte, a construção de galpões para o estoque de produtos.
O QUE SÃO CONCESSÕES?
Para um setor que depende de volumosos investimentos financeiros para reduzir o déficit de infraestrutura, a crise política e econômica que o Brasil enfrenta só tende a piorar a situação. Com as contas públicas desequilibradas, o governo federal não tem dinheiro em caixa para bancar as obras necessárias à ampliação da malha de transportes pelo Brasil. Uma das alternativas para desatar este nó logístico tem sido a adoção de um modelo conhecido como concessão.
Concessão é um sistema pelo qual o governo transfere à iniciativa privada serviços de construção, reformas e administração de rodovias, ferrovias, hidrovias, portos e aeroportos infraestrutura. Nessa transferência, as empresas fazem um investimento que, naturalmente, terá algum retorno financeiro. Por exemplo, uma empresa assume as obras de duplicação de uma rodovia. Em troca, ela recolhe o pedágio cobrado dos motoristas. Para ganhar uma concessão, uma empresa deve oferecer em leilão a melhor oferta de serviços e investimentos – na construção de novos ramais ferroviários e terminais portuários – ou, no caso das rodovias federais, as menores tarifas de pedágio.
QUAIS AS VANTAGENS E DESVANTAGENS?
Os planos de concessões lançados nos últimos anos pelo governo de Dilma Rousseff encontraram dificuldades para avançar devido ao fato de não haver empresas suficientemente interessadas em investir. O setor privado reclamava das restrições impostas pelo governo na participação dos leilões – as empresas não achavam o retorno financeiro suficientemente atraente para um negócio considerado arriscado.
Entre as condições colocadas pelo governo Dilma para a parceria com o capital privado estava a limitação no período de concessão. Uma empresa que construísse uma rodovia, por exemplo, poderia explorá-la financeiramente por até 35 anos, período que os investidores consideram baixo para obter o lucro desejado. Além disso, as regras também fixavam uma taxa de retorno máximo para os investidores.
Ao conceder a exploração de rodovias, portos e aeroportos, o governo perde uma importante fonte de receitas em troca dos investimentos financeiros da iniciativa privada. Por isso, o governo anterior justificava ser importante manter tais regras para garantir um retorno financeiro adequado aos cofres públicos e trazer mais benefícios aos usuários ao impedir que os investidores cobrassem preços abusivos de empresas e pessoas que utilizassem a malha de transportes.
Já o governo de Michel Temer lançou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) com o objetivo declarado de retirar os “excessos de interferência do Estado”. Para isso, sinaliza que irá flexibilizar as regras das concessões para torná-las mais atraentes aos investidores. De todo modo, o desafio em qualquer modelo de concessão continua sendo atrair o capital privado sem que o Estado perca a capacidade de gerenciar os investimentos na matriz de transportes e garantir o retorno adequado à sociedade.