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Ciência e Meio Ambiente – Desmatamento: novas ameaças à Floresta Amazônica

Decisões do governo federal para atender à bancada ruralista reduzem o grau de proteção de extensas áreas na Amazônia e geram protestos da sociedade civil e da comunidade internacional

Decisões do governo federal para atender à bancada ruralista reduzem o grau de proteção de extensas áreas na Amazônia e geram protestos da sociedade civil e da comunidade internacional

A maior floresta tropical do planeta voltou a chamar a atenção do mundo em 2017. Uma série de decisões tomadas pelo governo do presidente Michel Temer reduziu o grau de proteção legal de centenas de milhares de hectares das matas da Amazônia, o que provocou protestos da sociedade civil e da comunidade internacional. A pressão surtiu efeito no caso da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), cujo decreto que a extinguia acabou sendo suspenso. No entanto, medidas como a que permite a exploração econômica na Floresta e no Parque Nacional de Jamanxim, no Pará, representam um duro golpe nos esforços para a preservação da Amazônia.

De modo geral, essas medidas visam a atender as pressões exercidas pela bancada ruralista no Congresso Nacional, um dos principais bastiões de sustentação do presidente Temer. O grupo congrega o maior e mais influente lobby de congressistas de diferentes partidos na defesa dos interesses dos grandes proprietários de terra e latifundiários – o que inclui a ampliação das áreas destinadas à agropecuária na Amazônia.

Renca

Rica em cobre, ouro e outros minérios, a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca) foi criada no fim da ditadura militar, em 1984, como uma área de preservação mineral que estabelecia a exclusividade para o governo realizar pesquisas na região. Com mais de 46 mil km2, a Renca fica localizada no nordeste da Amazônia, na fronteira entre Pará e Amapá. O território delimitado pela Renca abrange sete unidades de conservação – ou seja, trata-se de áreas protegidas, onde as atividades de exploração econômica são totalmente proibidas ou, dependendo do caso, podem ser permitidas com algumas restrições. Na Renca ainda estão duas terras indígenas, também protegidas ambientalmente. Ao todo, a área sob proteção representa entre 70% e 85% da Renca.

Em agosto de 2017, o governo federal emitiu um decreto extinguindo a reserva e permitindo que a porção de terra não protegida, entre 15% e 30% do total, pudesse ser explorada por empresas mineradoras do setor privado. A proposta fazia parte de um pacote de medidas para ampliação do setor mineral. A perspectiva do governo é que a participação da mineração no Produto Interno Bruto (PIB) salte dos atuais 4% para 6%. Segundo o governo, o decreto trazia regras estritas de proteção das áreas de conservação e apenas regularizaria a exploração de minérios que já ocorre atualmente, através de garimpos ilegais, que não seguem quaisquer regras e, portanto, causam um maior impacto ambiental.

Ambientalistas, pesquisadores e indígenas argumentam que os impactos da extinção da Renca seriam devastadores, mesmo que a permissão para a mineração fosse restrita apenas à área não protegida. Isso porque o decreto daria início à corrida pela exploração mineral na Amazônia e com ela chegariam também o desmatamento, a poluição hídrica e o garimpo ilegal nas áreas preservadas. Além disso, a instalação de mineradoras na região exigiria grande infraestrutura, como estradas cortando a floresta para a chegada de maquinário e o escoamento da produção, o que ampliaria significativamente a devastação ambiental. Outro fator seria um aumento vertiginoso na população local, atraída pela possibilidade de exploração do terreno.

A reação contra a extinção da reserva foi forte e imediata. A sociedade civil condenou a decisão do governo e celebridades usaram as mídias sociais e a imprensa para se manifestarem enfaticamente contra a extinção da reserva, entre elas Gisele Bündchen, Ivete Sangalo e Letícia Sabatella. O repúdio internacional também foi estridente. Artistas como Leonardo DiCaprio, Brad Pitt e Bono Vox usaram suas redes para criticar a decisão do governo brasileiro. A imprensa internacional, da mesma forma, publicou reportagens condenando o decreto, como os jornais Le Monde (francês) e The Guardian (inglês). Devido à intensa reação negativa, o Ministério de Minas e Energia suspendeu o decreto no dia 31 de agosto, mantendo a Renca como uma reserva mineral.

Jamanxim

Localizado entre os municípios de Itaituba e Trairão, no Pará, a Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim é um santuário ecológico de mais de 1,3 milhão de hectares. Ao norte do Flona está situado o Parque Nacional (Parna) de Jamanxim, com uma área de 900 mil hectares. As duas regiões são ricas em recursos hídricos e minerais e abrigam uma das mais exuberantes biodiversidades do planeta. Segundo o Ibama, o Parna é a área mais preservada da região, com 99% de seu território intacto. A situação ambiental da Flona do Jamanxim é oposta – o desmatamento ilegal na região responde por 37,7% do total registrado nas unidades de conservação federais.

Em 2016, o governo editou duas medidas provisórias (MP) que transformavam parte da Floresta Nacional e do Parque Nacional do Jamanxim em Áreas de Proteção Ambiental (APA). Essa mudança é impactante, pois há enormes diferenças entre as três categorias, especialmente no que se refere à permissão de exploração de recursos naturais:

• Parque Nacional (Parna): Permite apenas o uso da terra para turismo e pesquisa. O poder público detém a posse e o controle da terra.
• Floresta Nacional (Flona): Permite o turismo, a pesquisa e o corte seletivo de madeira, desde que apresentado um plano de manejo. As terras são de posse e controle do poder público.
• Área de Proteção Ambiental (APA): Permite turismo, pesquisa, atividade madeireira e exploração de outros recursos através da agropecuária e da mineração, desde que apresentado um plano de manejo aprovado por conselhos de moradores, empresários e governo local. As terras podem ser de posse e controle do poder público e privado. É a categoria mais fraca de proteção das matas.

As medidas provisórias foram aprovadas pelo Congresso com profundas alterações. O texto original da MP 756 previa transformar 300 mil hectares do Flona de Jamanxim em APA. Porém, durante a tramitação, a área foi ampliada para 486 mil hectares. Já a MP 758 transformava 862 hectares do Parna em APA. No decorrer da tramitação na Câmara, a proposta foi estendida para 101 mil hectares.

As medidas provisórias foram imediatamente atacadas por ambientalistas, pesquisadores, indígenas e ONGs nacionais e internacionais. Também levaram a Noruega a cortar em 50% seus aportes ao Fundo Amazônia, criado para captar investimentos para a conservação da floresta. Como resposta às reações negativas, Temer vetou parcialmente a MP 758, sobre o Parna, devolvendo-a à proposta original, que transforma 862 hectares em APA. Com relação à MP 756, referente à Flona, o veto foi integral. No entanto, o recuo do governo é uma decisão estratégica que visa dar segurança jurídica aos posseiros, grileiros e grandes proprietários que hoje ocupam ilegalmente a Flona do Jamanxim. Isso porque no mesmo dia em que vetou a MP 756, o governo entrou com um Projeto de Lei idêntico à proposta original da medida provisória. O governo entende que uma MP pode ser questionada e anulada liminarmente na justiça, o que não ocorreria no caso da promulgação de uma nova lei. A proposta será votada pelo Congresso em 2018.

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Outras medidas

Também tramitam no Congresso diferentes projetos de Lei que alteram as regras para o licenciamento ambiental – exigência legal para qualquer empreendimento que emprega recursos naturais ou possa degradar o meio ambiente. Pela proposta, vários tipos de empreendimento e atividades ficariam livres do licenciamento ambiental, como projetos de rodovias, ampliação de portos e agropecuária extensiva. Os projetos propõem menos laudos técnicos, prazos exíguos para estudos e autorização e, em alguns casos, dispensam a consulta às comunidades que serão afetadas. Os ruralistas alegam a necessidade de diminuir as restrições para destravar o desenvolvimento econômico, mas as medidas podem intensificar ainda mais a devastação na Amazônia.

Em outra vitória da bancada ruralista, a MP 759 foi aprovada no Congresso em julho de 2017, tornando-se assim lei federal. Chamada pelo governo de Programa Nacional de Regularização Fundiária, a medida ficou conhecida como Lei da Grilagem, por permitir a legalização de enormes áreas públicas invadidas, especialmente na Amazônia Legal, anistiando grileiros e aumentando significativamente o desmatamento e os conflitos de terra. O então procurador- geral da República, Rodrigo Janot, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, atendendo ao pedido de 61 entidades de diversas áreas. A ação será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2018.

Queda no desmatamento

A boa notícia no campo ambiental ficou por conta da diminuição da taxa de desmatamento na Amazônia: segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre agosto de 2016 e julho de 2017 foram derrubados 6.624 quilômetros quadrados de floresta, uma queda de 16% em relação ao mesmo período anterior. Segundo o instituto, todos os estados registraram redução no desmate, com destaque para o Tocantins, 54%, e Pará, 31%.

Os números foram utilizados pelo governo para rebater as críticas em relação às políticas ambientais. Contudo, especialistas alertam que não há muito para comemorar. Isso porque os novos indicadores só são animadores quando comparados a 2016, ano com alto índice de desmatamento. Soma-se a isso o fato de que a taxa de 2017 é 70% maior do que a meta estabelecida pela Política Nacional de Mudança do Clima, que prevê uma área de desmate de no máximo 3.900 km2 por ano até 2020.

Além disso, o Brasil se comprometeu a alcançar os objetivos firmados na Conferência do Clima de Paris (COP-21), realizada em 2015 com o propósito de estabelecer metas conjuntas de redução de emissões de gases do efeito estufa. Entre outros compromissos, o país propôs restaurar 12 milhões de hectares de forestas e de zerar o desmatamento ilegal da Amazônia, tudo isso até 2030.

De acordo com o Grupo de Trabalho (GT) pelo Desmatamento Zero, composto pelas ONGs Greenpeace, Instituto Socioambiental, WWF, entre outras, 26% dos gases de efeito estufa brasileiros são provenientes do desmatamento da Amazônia. As principais causas desse desmatamento são atividades econômicas, especialmente os avanços da pecuária, da agricultura e da mineração em áreas de floresta.

Para o GT, as novas medidas provisórias e leis propostas pelo governo brasileiro estão em desacordo com as políticas necessárias para alcançar as metas firmadas na COP-21, e apenas atendem a pleitos históricos da bancada ruralista. Os esforços deveriam se concentrar na restrição drástica do mercado para produtos associados a novos desmatamentos, no apoio a usos sustentáveis da floresta e melhores práticas agropecuárias, cerceadas às áreas já desmatadas.

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RESUMO

Desmatamento

Bancada Ruralista O grupo representa os interesses de latifundiários e grandes proprietários de terra no Congresso Nacional e, entre outras demandas, defende a ampliação das áreas destinadas à agropecuária na Amazônia. A bancada exerceu forte pressão sobre o governo Temer para que o presidente levasse adiante um pacote de medidas que reduzem o grau de proteção das florestas na Amazônia.

Renca A Reserva Nacional do Cobre e Associados faz parte do plano de expansão do setor mineral encaminhado pelo governo federal. Cerca de 85% de sua área está sob proteção. Em 2017 o governo tentou editar uma medida provisória extinguindo a reserva e permitindo a exploração de sua área não protegida por grandes mineradoras. Devido a forte pressão interna e externa, que alertaram sobre a destruição ambiental que esses empreendimentos trariam, a MP foi suspensa.

Jamanxim A Floresta Nacional (Flona) e o Parque Nacional do Jamanxim (Parna) são duas áreas com alto nível de proteção ambiental. O governo federal editou duas medidas provisórias alterando o status de partes da Flona e do Parna do Jamanxim para áreas de proteção ambiental, que permite exploração dos recursos naturais pela iniciativa privada, incluindo a mineração. Após pressão de ambientalistas e de governos estrangeiros, a MP relativa ao Flona foi suspensa. No entanto, o governo encaminhou um projeto de lei com o mesmo texto, que será votado em 2018 pelo Congresso. O Parna do Jamaxim, contudo, perdeu 862 hectares de sua área, transformados em APA.

Desmatamento A taxa de desmatamento da Amazônia caiu 16% em 2017. Ainda assim, o nível está acima dos índices registrados no período entre 2011 e 2015 e da meta estabelecida pela Política Nacional de Mudança do Clima. Um dos compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris, sobre as mudanças climáticas, é restaurar 12 milhões de hectares de florestas e zerar o desmatamento ilegal da Amazônia até 2030.

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Ciência e Meio Ambiente – Desmatamento: novas ameaças à Floresta Amazônica
Ciência e Meio Ambiente – Desmatamento: novas ameaças à Floresta Amazônica
Decisões do governo federal para atender à bancada ruralista reduzem o grau de proteção de extensas áreas na Amazônia e geram protestos da sociedade civil e da comunidade internacional

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