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Ciência e Meio Ambiente – Doenças transmissíveis: o fantasma da febre amarela

Depois da explosão de casos no país em 2017, governo tenta conter um novo surto da doença em 2017 com vacinação em massa nas áreas consideradas de risco

Depois da explosão de casos no país em 2017, governo tenta conter um novo surto da doença com vacinação em massa nas áreas consideradas de risco

A febre amarela voltou a assombrar o país. Depois de registrar no primeiro semestre de 2017 o pior surto da doença em mais de 30 anos, quando foram notificados 777 casos e 261 mortes, o Brasil convive novamente com o avanço da doença. Segundo o Ministério da Saúde, 723 casos de febre amarela e 237 óbitos foram confirmados entre julho do ano passado e o fim de fevereiro de 2018. Minas Gerais e São Paulo são os estados mais atingidos pelo surto.

A gravidade da situação levou a Organização Mundial de Saúde (OMS) a declarar, no início de 2018, o estado de São Paulo como área de risco para a febre amarela. Diante da possibilidade de intensificação do surto, a entidade recomendou a vacinação para todos os viajantes internacionais que planejam passar pelo estado, e não descartou estender a orientação para outras regiões do país.

A declaração da OMS conflitou com o posicionamento do governo federal. Em setembro de 2017, o Ministério da Saúde havia anunciado o fim do surto no país. Na ocasião, as autoridades sanitárias afirmaram que o último caso havia sido notificado em junho daquele ano. Depois de uma trégua durante os meses de inverno, a doença voltou com força devido à chegada do verão, estação propícia para a proliferação de mosquitos, os principais vetores da enfermidade.

Os dois tipos da doença

Há duas variedades de febre amarela – a silvestre e a urbana. Ambas são causadas por um mesmo vírus da família Flaviviridae, e a transmissão se dá por meio da picada dos mosquitos transmissores infectados (não é passada de pessoa para pessoa). As duas formas também têm as mesmas características do ponto de vista clínico. A doença recebe esse nome porque ao atacar o fígado provoca icterícia, deixando amarelados os olhos e a pele do doente.

Todos os casos notificados até o início de fevereiro são de febre amarela silvestre, variedade da enfermidade transmitida pela fêmea de mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes, que vivem somente em áreas rurais ou de mata. Outra característica dessa variedade é que os insetos se infectam a partir de um hospedeiro silvestre, no caso os macacos.

Na febre amarela urbana, que se dissemina pelas cidades, o vetor da transmissão é a fêmea do mosquito Aedes aegypti, o mesmo responsável pela transmissão da dengue, chikungunya e zika, e o homem é o único hospedeiro com relevância epidemiológica. No final do século XIX, a febre amarela urbana já foi um dos piores males no país, mas foi erradicada em 1942, graças a campanhas de vacinação.

Em fevereiro de 2018, a cidade de São Paulo registrou o primeiro caso autóctone da doença, ou seja, a pessoa foi infectada no próprio município de São Paulo. A transmissão, porém, não foi urbana, pois aconteceu em área rural, de mata. Até então, em todas as outras ocorrências registradas na capital, as pessoas haviam sido infectadas em outras cidades.

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Vacinação fracionada

Para conter o avanço da doença e, principalmente, evitar a volta da circulação do vírus nas grandes metrópoles – o que traria o risco de eclosão de uma epidemia de febre amarela urbana no país –, o governo deu início em janeiro de 2018 a uma grande campanha de vacinação em São Paulo e em outras áreas com risco de surto. Grandes filas se formaram em postos de saúde da capital paulista depois da confirmação de que macacos encontrados mortos em parques das zonas norte e leste da cidade estavam contaminados pelo vírus da febre amarela. A morte de macacos é um sinal de que o vírus está se disseminando rapidamente naquela região.

Principal forma de prevenção da doença, a vacinação já era recomendada pelo Ministério da Saúde em vários municípios do país, localizados principalmente nos estados do Norte e Centro-Oeste, onde havia a circulação do vírus. Com o alastramento da doença em direção ao sul, 21 estados entraram na lista de recomendação de vacinação do Ministério. Sem estoque suficiente para atender toda a população em áreas de risco, o governo decidiu fracionar a vacina, cujo índice de eficácia chega a 99%. No lugar da dose padrão de 0,5 mililitro (ml), passou a administrar em alguns locais uma quantidade menor, de 0,1 ml.

Tal medida, segundo o governo, é recomendada pela OMS quando há casos de febre amarela silvestre de forma intensa, com risco de expansão da doença em centros urbanos com elevado índice populacional e sem recomendação anterior para vacinação. A segurança conferida pela vacina fracionada é a mesma da original, mas sua validade é menor. Enquanto a dose- padrão imuniza por toda a vida, a reduzida vale por, pelo menos, oito anos.

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Causas do surto

Ainda não se sabe ao certo a causa do recente avanço da doença no Brasil, mas uma hipótese levantada é de que um descuido na vacinação durante o surto que acometeu áreas rurais de Minas Gerais no início de 2017 pode estar na raiz do problema. Identificar prontamente os casos e vacinar a população do entorno em caráter de emergência é o procedimento indicado na ocorrência de surtos de febre amarela silvestre. A lentidão no diagnóstico e no alerta pode transformar um surto numa epidemia.

A degradação ambiental é outro fator que pode ter favorecido o alastramento da febre amarela silvestre. Com o desmatamento dos últimos anos, macacos passaram a viver em fragmentos reduzidos de florestas. O empobrecimento do ecossistema, ao mesmo tempo, favoreceu a proliferação de mosquitos. Caso eles estejam infectados, poderiam rapidamente contaminar um número maior de macacos, elevando o risco de infectar também populações no entorno. Especialistas traçaram o caminho percorrido pela doença para chegar a São Paulo. Seguindo corredores ecológicos (regiões de mata e rios), o vírus entrou na região da Cantareira pela divisa com Minas Gerais, e atingiu a área metropolitana de São Paulo. É provável que siga em direção à Serra do Mar, podendo atingir cidades litorâneas. Caso esse cenário se confirme, o estado de São Paulo poderá tornar-se uma área endêmica, com ocorrência contínua de febre amarela.

Outros males transmissíveis por vetores

A febre amarela não é a única enfermidade transmitida por vetores com a qual a população brasileira convive. Pelo menos 357 municípios brasileiros encontram-se em situação de risco de surto de dengue, zika vírus e chikungunya no final de 2017, segundo dados do Ministério da Saúde. Outras 1.139 cidades também estão em estado de alerta. Diante desse quadro, especialistas temem um repique do surto desses males, também transmitidos pela fêmea do Aedes aegypti.

Apesar do cenário preocupante, houve um declínio de registros dessas enfermidades em 2017. Foram notifcados 17,4 mil casos prováveis de zika vírus, número bem inferior ao de 2016 (216,2 mil registros). O que mais preocupa na zika é a infeção em gestantes, já que o vírus pode provocar a morte do feto e aborto, a microcefalia (malformação em que o cérebro do feto não se desenvolve adequadamente na gestação) ou outras complicações neurológicas.

Os casos de dengue também apresentaram queda substancial. Foram notificados 252 mil casos prováveis da doença em 2017, contra 1,48 milhão no ano anterior. Os sintomas clássicos da dengue incluem febre, dores musculares, de cabeça e atrás dos olhos e prostração. Circulam no Brasil quatro tipos (cepas) de vírus. A infeção por uma delas não desenvolve no indivíduo imunidade contra as demais, e uma segunda contaminação pode provocar a dengue hemorrágica, a forma mais grave da doença.

Também foi verificado declínio de casos de chikungunya – os 277,8 mil registros de 2016 caíram para 185,7 mil em 2017. A letalidade da chikungunya é rara e menos frequente que a da dengue. Mas os infectados podem ter infamação e dor nas articulações durante meses ou até mesmo para sempre.

Sanitaristas apontam que o trabalho de prevenção contra as três doenças iniciado no país no final de 2015, quando o Ministério da Saúde registrou um número recorde de casos, deve ter surtido efeito dois anos depois. Mas temem que um relaxamento nas medidas preventivas possa provocar um avanço dessas enfermidades.

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Doenças sexualmente transmissíveis

Entre as doenças transmitidas diretamente de uma pessoa para outra estão as sexualmente transmissíveis, como a aids, que ainda causa preocupação no país. O número anual de novos casos no Brasil sofreu um ligeiro aumento de 3% entre 2010 e 2016, segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAids) divulgado em julho de 2017. Esse crescimento vai na contramão do que é verificado no resto do mundo. No planeta, as novas infecções pelo vírus causador da aids caíram 11% no mesmo período.

O aumento no número de casos no país pode estar relacionado, em parte, com um registro mais eficaz, dado pela implementação dos testes rápidos e a obrigatoriedade, desde 2014, da notificação de todos os novos casos de HIV pelos serviços de saúde – anteriormente, os números eram levantados a partir de amostragens. Além disso, com o avanço no tratamento da doença, a percepção de que a aids tornou-se menos letal pode ter levado muitas pessoas a deixar de usar preservativos, tornando- se mais suscetíveis ao contágio.

O abandono do uso da camisinha também está associado à expansão, nos últimos anos, de outra doença sexualmente transmissível, a sífilis, cujo contágio também ocorre, em menor escala, por meio de transfusão ou contato com sangue contaminado. A sífilis é causada pela bactéria Treponema pallidum e seu risco é particularmente preocupante na gravidez: a bactéria pode provocar malformação cerebral no feto, inclusive a microcefalia, contaminar os olhos do bebê e causar cegueira.

A infecção produz ínguas duras, também chamadas cancros, no pênis e no interior da vagina. Mas, como essas ínguas não costumam doer, a doença pode passar despercebida e evoluir para estágios mais graves e perigosos. A boa notícia é que a sífilis é facilmente tratável e curável com o antibiótico penicilina.

Doenças negligenciadas

Outro desafio das autoridades é com as chamadas doenças negligenciadas, infecções típicas das regiões tropicais e equatoriais, nas quais o clima quente e úmido favorece a proliferação de vírus e bactérias e dos vetores que as transmitem. Além de dengue, zika vírus e chikungunya, são exemplos dessas doenças o ebola, a malária e a leishmaniose. As regiões no mundo onde elas ocorrem com mais frequência são ocupadas por populações pobres e, por isso, recebem pouca atenção e baixos investimentos de institutos de pesquisa, laboratórios farmacêuticos e governos dos países ricos, que geralmente se encontram em regiões de clima temperado e mais frio.

Esse cenário tende a mudar, porque essas doenças estão chegando cada vez mais às nações desenvolvidas devido à intensificação do turismo, ao transporte de cargas intercontinental e aos fluxos migratórios.

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RESUMO

Doenças transmissíveis

DOENÇAS INFECCIOSAS Transmitidas por microrganismos como vírus, bactérias, fungos e parasitas, elas podem ser contagiosas, ou seja, transmitidas diretamente de uma pessoa para outra (como a gripe, a tuberculose e a aids) ou transmitidas por vetores, como os mosquitos (febre amarela e dengue, por exemplo). São potencialmente perigosas de tornarem-se epidêmicas em um mundo com cidades cada vez mais povoadas, como é o caso do Brasil.

SURTO DE FEBRE AMARELA Pelo segundo ano seguido, o Brasil sofre com um surto de febre amarela silvestre, típica das regiões de mata. Os macacos constituem os principais hospedeiros, e os vetores de transmissão ao ser humano são as fêmeas dos mosquitos das espécies Haemagogus e Sabethes. Os estados de São Paulo e Minas Gerais são os mais atingidos pelo surto.

VACINAÇÃO Para conter o alastramento da enfermidade e evitar a eclosão de uma epidemia de febre amarela urbana – em que o vetor da doença é a fêmea do mosquito Aedes aegypti e o homem, o principal hospedeiro –, o governo iniciou uma campanha de vacinação em massa nas regiões afetadas. Com estoque limitado de vacina, o Ministério da Saúde fracionou a imunização, aplicando em alguns lugares uma dose com um quinto do volume da quantidade-padrão.

DENGUE, ZIKA E CHIKUNGUNYA Além da febre amarela, autoridades sanitárias também temem um aumento no número de casos de outras doenças transmissíveis por vetores, como dengue, zika vírus e chikungunya. Em 2017, o país teve uma redução significativa no número de casos prováveis dessas três enfermidades, depois de dois anos de números alarmantes.

AIDS E SÍFILIS O aumento no número de casos dessas doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) tem gerado preocupação. Um dos motivos desse crescimento seria o próprio avanço no tratamento da aids, que leva à percepção de que a doença tornou-se menos letal. Com isso, muitas pessoas deixam de usar preservativos, expondo-se ao perigo de todas as DSTs.

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Ciência e Meio Ambiente – Doenças transmissíveis: o fantasma da febre amarela
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