Assine Guia do Estudante ENEM por 15,90/mês

Brasil: Ditadura militar: Manifestantes pedem a volta dos militares

Manifestações pedem a volta dos militares

Grupos defendem a volta de um regime que violou os direitos humanos e deixou um desastroso legado político, econômico e social

         Em meio aos protestos contra a presidente Dilma Roussef em várias cidades brasileiras em 2015, alguns manifestantes chamaram atenção: ainda que minoritários, eles pediam a volta dos militares ao poder. Grupos como o Direita Pernambuco e o SOS Forças Armadas, além de outros movimentos ativos nas redes sociais, alegam que uma intervenção militar é necessária para evitar que o país se transforme em uma ditadura de esquerda, “bolivariana” ou comunista. Duramente crítico ao Partido dos Trabalhadores (PT), os simpatizantes desses grupos criticam a corrupção e o que chamam de “aparelhamento do Estado” – alegam que o PT se apoderou das instituições governamentais para um projeto de autobenefício e manutenção de poder. Segundo eles, apenas os militares são capazes de enfrentar a crise.
         Esses grupos fazem apologia de um regime que deixou um rastro de marcas negativas na história brasileira. A ditadura militar teve a duração de 21 anos, de 31 de março de 1964 a 15 de março de 1985. Chamada por seus defensores de“Revolução de 1964”, foi caracterizada pelo controle do Estado pela cúpula das Forças Armadas, pela ruptura do regime jurídico em vigor, pela cassação de direitos políticos de opositores e pela violação das liberdades individuais. No período, a tortura foi uma prática sistemática do regime e pelo menos 434 pessoas morreram ou desapareceram, vítimas de crimes cometidos por agentes do Estado. Além do autoritarismo e da violação dos direitos humanos, a ditadura militar deixou como herança um país endividado, com alta inflação, salários desvalorizados e uma enorme desigualdade social.
         Com a retirada dos militares em 1985 e a consolidação da ordem democrática nos anos seguintes, o Brasil mantém o equilíbrio de poderes baseado no sistema republicano, pelo qual o Executivo, o Legislativo e o Judiciário exercem controle um sobre os outros. Trata-se de um sistema típico das democracias modernas. De acordo com a atual Constituição, as Forças Armadas estão sob controle do Ministério da Defesa, que, por sua vez, está subordinado ao Presidente da República. Seu papel fica restrito à defesa do território nacional. Em momentos de crise política e econômica, cabe à sociedade e aos representantes por ela alçados democraticamente ao poder encontrar as vias para superar os problemas – não aos militares. Por isso, ainda que conte com a simpatia de grupos específicos, a cúpula das Forças Armadas rechaça qualquer possibilidade de romper a ordem institucional. Mesmo organizações de direita críticas à presidente Dilma e partidos de oposição são contrários às manifestações em favor da volta dos militares.

Golpe e junta militar

         A atual polarização política, acirrada com a manifestação de setores contra e a favor do impeachment da presidente Dilma, está longe de ser comparável ao cenário de radicalização que levou ao golpe de 1964. A ruptura da ordem democrática naquele período foi precedida por uma grave crise institucional, causada pela renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, ainda em início de mandato. O vice, Jango, fazendeiro gaúcho, mas considerado esquerdista, sofreu forte oposição de militares e conservadores, e só conseguiu assumir a Presidência ao aceitar a formação de um governo parlamentarista, chefado pelo primeiro-ministro Tancredo Neves. Mas o presidencialismo foi restabelecido em janeiro de 1963, quando o Congresso realizou um plebiscito popular sobre o tema.
         O país enfrentou, então, um período de radicalização política, com greves e manifestações públicas pelas reformas de base (agrária, bancária, fiscal) propostas pelo presidente. Ao mesmo tempo, havia uma mobilização de setores conservadores em uma forte conspiração conduzida pela embaixada dos Estados Unidos (EUA) junto a parlamentares, governadores e militares. Era uma ofensiva norte-americana na América Latina depois de Cuba ter aderido ao comunismo em 1961. Nessa operação, houve golpes militares também no Uruguai e Chile (1973) e na Argentina (1976). O Paraguai já estava sob ditadura militar desde 1954. Os fatos são relatados em documentos do governo norte-americano tornados públicos recentemente.
         Nesse cenário, o golpe de Estado promovido pelas Forças Armadas, em 31 de março de 1964, teve como pretexto o combate à ameaça comunista, à corrupção e à crise político-econômica do país – por sinal, os argumentos são bastante semelhantes aos utilizados na crise atual contra o governo de Dilma. O Exército ocupou as ruas das principais cidades. Jango partiu para o exílio, e em seu lugar assumiu o presidente da Câmara Federal, Ranieri Mazzilli. O golpe recebeu apoio de setores importantes da elite nacional. Uma onda de repressão atingiu entidades populares como a União Nacional dos Estudantes (UNE), a Central Geral dos Trabalhadores (CGT) e as Ligas Camponesas. Milhares de pessoas foram presas.

Screenshot_23

COMANDO_MILIATRES

Autoritarismo e violência

         Entre 1964 e 1985, o país foi governado por cinco presidentes militares do Exército, escolhidos por uma junta militar, formada pela cúpula das Forças Armadas. Eles eram referendados em eleições indiretas no Congresso, por colégios eleitorais controlados, em que os militares mantinham maioria. Nesses 21 anos, eles impuseram ao Congresso e à sociedade Atos Institucionais (AI), usados para dar força de lei às ações do regime. As mudanças iniciais incluíram o fim da eleição direta de governadores e prefeitos das capitais.
         Em 13 de dezembro de 1968, o general Arthur da Costa e Silva fechou o Congresso e decretou o AI-5, iniciando a fase mais dura do regime militar, conhecida como “anos de chumbo”. O AI-5 permitia ao presidente fechar o Congresso, instituir censura prévia nos meios de comunicação e limitar a ação do Judiciário. Com a suspensão do habeas corpus, as forças policiais e militares passaram a ter carta branca para prender opositores sem precisar de acusação formal nem registro, e ficou facilitada a prática da tortura. O AI-5 vigorou por dez anos, gerando uma onda de exilados políticos.
         Em 1969, para fortalecer o poder de repressão, o decreto 1.072 extinguiu as forças de segurança estaduais, anexando-as às forças militares, criando as atuais polícias militares estaduais, então subordinadas à inspeção do Exército. A partir de 1970, a ditadura impôs a censura prévia a toda imprensa escrita, rádio e TV, peças de teatro, livros, novelas, músicas e filmes, que deviam ser enviados previamente aos setores de comunicação do governo para autorização ou proibição do material.
         O aumento da repressão policial e as restrições às liberdades individuais levou parte da esquerda a refugiar-se na clandestinidade e a adotar a luta armada. Grupos radicais organizaram- se para a guerrilha urbana, passaram a promover atentados e, para obter fundos, a assaltar bancos. Em resposta, os militares endureceram a repressão, criando programas e novas sedes militares para interrogatórios, as torturas e os assassinatos.

A euforia pelo Milagre Econômico no auge da ditadura foi solapada pela crise internacional do petróleo

Economia e abertura

         Para reorganizar a economia, a partir de 1969, o governo do general Emílio Garrastazu Médici adotou um programa que fez a economia crescer, em média, 11,2% ao ano. É o chamado Milagre Econômico, impulsionado por grandes empréstimos feitos no exterior para investir em infraestrutura e pela entrada de empresas multinacionais. Um clima de euforia tomou conta da classe média, que apoiava o regime, e o slogan do governo virou “Brasil, ame-o ou deixe-o”.
Mas, em 1973, houve um aumento significativo nos preços do petróleo – fato conhecido como “choque do petróleo” –, o que provocou uma grave crise mundial e atingiu principalmente os países dependentes da importação do produto, como o Brasil. A partir daí, o país entrou num período de estagnação econômica, desemprego e elevação da inflação.
         Politicamente, a ditadura começou a ruir a partir de 1978, com a volta de greves e protestos de rua e a revogação do AI-5. Entre os governos de Ernesto Geisel e João Figueiredo, os militares revogaram o AI-5, assinaram a Lei de Anistia aos acusados de crimes políticos – que permitiu a volta dos exilados – e restabeleceram a liberdade partidária. Na sucessão política, os militares entregaram o bastão sem que houvesse eleições para presidente. A disputa no Colégio Eleitoral foi vencida por Tancredo Neves– da Aliança Liberal, formada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), de oposição à ditadura, e uma dissidência do Partido Democrático Social (PDS), de apoio ao regime. No entanto, Tancredo morreu antes de tomar posse. Como resultado, quem assumiu a Presidência foi o vice, José Sarney, um político ligado ao regime militar. As primeiras eleições diretas para presidente só aconteceriam no fim de 1989.

Legado de problemas

         Alguns indicadores mostram que a ditadura militar deixou graves prejuízos e problemas sociais:
• Dívida externa gigante Ela cresceu mais de 30 vezes: subiu de 3,3 bilhões de dólares, em 1964, para 102 bilhões de dólares (3.000%) até 1984. Isso gerou crise e baixo crescimento econômico nos anos de 1980 e 1990.
• A renda piorou O poder de compra do salário mínimo caiu a quase a metade, em valores atualizados.
• A inflação disparou A taxa anual subiu de 85% para 178%. A inflação persistiu alta nos anos seguintes até ser controlada com o Plano Real (1994).

screenshot_481

Volks é a primeira empresa a tentar reparar apoio à ditadura na Justiça

         A Volkswagen é a primeira empresa a negociar uma reparação judicialmente por ter financiado ou participado ativamente da repressão à oposição política e ao movimento operário durante a ditadura militar no Brasil. Dirigente da matriz do grupo que esteve no Brasil neste mês a pedido do Ministério Público Federal (MPF) afirmou que a companhia busca um acordo com o órgão, que baseia sua ação nas investigações feitas pela Comissão Nacional da Verdade (CNV). (…)
Entre os documentos apresentados pelos sindicalistas estão os relatos de que a montadora doou equipamentos — como modelos Fusca — para o Destacamento de Operações de Informações (DOI) do 2.o Exército. (…)
Há ainda cópias de cerca de 200 “boletins de ocorrência” feitos pela segurança da empresa e enviados ao Dops. (…) Há ainda relatos de espancamento e torturas de operários ligados a partidos comunistas ocorridos dentro da empresa. (…)
Zero Hora, 1/11/2015

• Maior desigualdade social Além da queda na renda, a economia não acompanhou o crescimento da população nas décadas seguintes. O indicador de desigualdade, o índice Gini, só melhorou nos governos civis e apenas nos anos 2000 começou a voltar ao patamar da década de 1960.
• Inchaço das cidades A falta de uma ampla reforma agrária foi substituída por uma precarização das condições de vida no campo, o que aumentou a migração da população rural para as cidades e os problemas urbanos.
• Corrupção A centralização absoluta de poder gerou uma corrupção impune em superfaturamento de obras, desvio de dinheiro público e nos negócios militares.
• Violência Além da atuação criminosa de agentes públicos em tortura, assassinatos e desaparecimento dos corpos, a unificação das polícias e a criação das polícias militares é apontada como uma das principais causas da violência policial atual.

Comissão da Verdade

         Em 2011, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) começou a investigar as violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura. O relatório final, divulgado em dezembro de 2014, revela que a repressão atingiu cerca de 20 mil pessoas, das quais 191 foram assassinadas e 243 desapareceram. Além disso, identificou 377 responsáveis por violações dos direitos humanos. A CNV defende que os 196 que ainda estão vivos devem ser levados à Justiça. No entanto, há uma controvérsia jurídica. Isso porque a Lei de Anistia, aprovada em 1979, livra de qualquer processo os que cometeram crimes como funcionários do Estado. A CNV defende que se trata de crimes contra a humanidade e, portanto, imprescritíveis. A Corte Internacional de Direitos Humanos também pressiona para que os responsáveis sejam punidos.

PARA IR ALÉM O documentário O Dia que Durou 21 Anos (de Camilo Galli Tavares, 2012) revela a participação do governo norte-americano na preparação do golpe militar no Brasil.

linha_tempo_ditadura

LINHA_TEMPO_2

RESUMO

DITADURA MILITAR

DITADURA MILITAR Período em que o país foi governado por militares, marcado pela ausência de democracia e por graves violações aos direitos humanos. Teve início em 31 de março de 1964, com um golpe militar que depôs o presidente João Goulart, e terminou em 15 de março de 1985. O golpe recebeu o apoio de setores do empresariado, da imprensa, da Igreja Católica e de políticos conservadores.
AI-5 Os governos militares governaram com atos de exceção impostos à sociedade e ao Congresso, chamados Atos Institucionais (AI). Com o AI-5, decretado em dezembro de 1968, os militares assumem poder absoluto e eliminam os direitos civis e políticos. Ele inicia a fase de maior repressão do regime, chamada “Anos de Chumbo”.
MILAGRE ECONÔMICO A economia cresceu fortemente durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). Mas a crise internacional do petróleo (1973) pôs fim ao milagre econômico e a inflação continuou a crescer.
LEGADOS NEFASTOS Durante a ditadura, a inflação tornou-se crônica, a dívida externa cresceu mais de 30 vezes e aumentaram a desigualdade, a pobreza e o inchaço das cidades, problemas que se estenderam pelas décadas seguintes. a participação do governo norte-americano na preparação do golpe militar no Brasil.

Brasil: Ditadura militar: Manifestantes pedem a volta dos militares
Estudo
Brasil: Ditadura militar: Manifestantes pedem a volta dos militares
Manifestações pedem a volta dos militares Grupos defendem a volta de um regime que violou os direitos humanos e deixou um desastroso legado político, econômico e social          Em meio aos protestos contra a presidente Dilma Roussef em várias cidades brasileiras em 2015, alguns manifestantes chamaram atenção: ainda que minoritários, eles pediam […]

Essa é uma matéria exclusiva para assinantes. Se você já é assinante faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

MELHOR
OFERTA

Plano Anual
Plano Anual

Acesso ilimitado a todo conteúdo exclusivo do site

a partir de R$ 15,90/mês

Plano Mensal
Plano Mensal

R$ 19,90/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.