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Internacional – China: uma potência ainda mais forte

O presidente Xi Jinping amplia seu poder na China e se consolida como uma das principais lideranças mundiais, desafiando a hegemonia dos Estados Unidos

O presidente Xi Jinping amplia seu poder na China e se consolida como uma das principais lideranças mundiais, desafiando a hegemonia dos Estados Unidos

“O socialismo com características chinesas já entrou em uma nova era que confirma a nova posição histórica do desenvolvimento da China”. Foi com esse tom ufanista que o presidente chinês, Xi Jinping, se referiu ao atual status da potência asiática durante a abertura do 19º Congresso Nacional do Partido Comunista, realizado em outubro de 2017. Para além da retórica característica dos discursos políticos, Xi Jinping exibiu o ar confiante de quem consolidou ainda mais seu poder e desponta aos olhos do mundo como a mais forte liderança que a China já teve desde a morte de seu comandante histórico Mao Tsé-tung.

Na China, onde vigora uma ditadura de partido único e não há eleições diretas, o Congresso é o principal evento político. Nesse encontro, o Comitê Permanente do Politiburo, órgão que reúne as principais lideranças chinesas, aponta as diretrizes para o desenvolvimento do país e comanda o processo de sucessão presidencial.

Desde os anos 1990, os presidentes chineses governam o país por dois ciclos consecutivos de cinco anos. Assim, Xi Jinping, que assumiu o poder em 2013, teve seu mandato presidencial renovado até 2022. Mas, ao contrário do que se esperava, o Comitê não apontou nenhuma liderança política para suceder o atual presidente no próximo Congresso, em 2022. Isso indicaria o desejo do Politiburo na permanência de Xi Jinping para além dos dez anos usuais no poder. As expectativas se confirmaram em fevereiro de 2018, quando o Partido Comunista propôs o fim do limite para a reeleição presidencial, o que pode abrir o caminho para que Xi Jinping continue indefinidamente na liderança do país.

Outro sinal inequívoco do prestígio de Xi Jinping foi a inclusão de suas ideias na Constituição do Partido Comunista. Tal honraria havia sido concedida apenas aos maiores líderes históricos da república: Mao Tsé-tung, o comandante da Revolução Chinesa, que governou o país entre 1949 e 1976, e Deng Xiaoping, responsável por introduzir as reformas que impulsionaram a economia chinesa entre 1978 e 1992.

Estilo centralizador

Com o respaldo do Partido Comunista, Xi Jinping vem conquistando aval para imprimir um estilo mais personalista de comando. Assim que assumiu o poder em 2013, Xi Jinping promoveu uma liderança carismática e centralizadora, cuja maior expressão foi a campanha de combate à corrução. Ao colocar sob investigação altos dirigentes do Partido Comunista e oficiais graduados das Forças Armadas, Xi Jinping ganhou a simpatia da população. Seus críticos, porém, argumentam que essa campanha foi feita de forma seletiva, que mirou principalmente facções do partido não alinhadas com o presidente.

Em sintonia com esse estilo de governo mais centralizador, Xi Jinping vem reforçando o controle sobre a sociedade. A ditadura chinesa sempre reprimiu as oposições e restringiu o trabalho da imprensa. Mas à medida que cresce no país a organização operária e o interesse da classe média nos rumos políticos do país, a pressão por reformas democráticas e maior liberdade de expressão tende a aumentar.

Para conter as tensões sociais e a ação de dissidentes que passaram a desafar abertamente o regime, Xi Jinping ampliou o aparato repressivo do Estado. Sob seu comando, a China aumentou a vigilância sobre os cidadãos, tornou mais rigorosa a censura aos meios de comunicação e à internet e expandiu o cerco aos ativistas de direitos humanos.

Socialismo de mercado

Se por um lado a China mantém um Estado tão repressivo quanto nas décadas passadas, no plano econômico o país vem promovendo uma abertura gradual aos mercados, ainda que o governo continue desempenhando um papel decisivo para promover o desenvolvimento. É disso que se trata o socialismo com características chinesas tão frisado por Xi Jinping. Para entender o seu funcionamento, cabe uma explicação a respeito das transformações pelas quais vem passando o comunismo chinês.

Em 1949, após o Partido Comunista derrotar o Partido Nacionalista (Kuomintang) na guerra civil, a China foi reorganizada nos moldes comunistas. O líder da Revolução Chinesa Mao Tsé- tung proclamou a República Popular da China e tornou-se o governante supremo do país. Entre as medidas adotadas pelo governo chinês estava a coletivização das terras, dos bancos e das companhias estrangeiras, além da expropriação das fábricas e do controle estatal da economia. No entanto, os progressos iniciais foram solapados por ações desastrosas como o Grande Salto Para Frente. Lançado em 1958 para acelerar a industrialização, o plano gerou caos econômico, provocando fome e a morte de milhões de camponeses.

A morte de Mao, em 1976, abriu caminho para a ascensão do reformista Deng Xiaoping. Na esfera política, o país manteve o regime fechado. Já na esfera econômica, adotou um modelo de desenvolvimento conhecido como socialismo de mercado – ou socialismo com características chinesas. Ele combina aspectos do socialismo, como o controle da produção e de setores estratégicos pelo Estado, com medidas de abertura ao capitalismo, como é o caso da atuação de empresas estrangeiras e da permissão da propriedade privada em determinadas situações.

Nesse processo de abertura econômica do país ao mercado mundial, Deng Xiaoping criou as Zonas Econômicas Especiais, onde empresas multinacionais poderiam instalar-se e produzir artigos para exportação. Atraídas por incentivos fiscais e pela farta e barata mão de obra chinesa, as empresas estrangeiras passaram a atuar no país. Esse modelo transformou a China no maior exportador mundial. Se a princípio os produtos chineses eram associados à baixa qualidade, hoje eles possuem maior valor agregado, como eletroeletrônicos e automóveis. Paralelamente, para suprir sua demanda por alimentos, energia e matérias-primas para o setor de construção, a China tornou-se um grande importador de commodities, como petróleo, soja e minério de ferro.

Alçando voo – Obras do aeroporto de Daxing, próximo à capital, Pequim: infraestrutura impulsiona a economia chinesa. Foto: Jason Lee ()

Reformas internas

Impulsionada pelo comércio exterior, a China fez uma bem-sucedida transição, deixando de ser uma nação pobre e agrária para se tornar uma potência mundial. Com um Produto Interno Bruto (PIB) de mais de 11 trilhões de dólares, o país ostenta a segunda maior economia do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos (EUA). A média de crescimento econômico manteve-se por vários anos acima dos 10% ao ano, mas estacionou entre 6% e 7% nos anos recentes.

Agora, a China se prepara para dar o passo seguinte. Embora a iniciativa privada tenha ampliado sua participação na economia chinesa, o Estado ainda mantém setores estratégicos sob seu controle e desempenha papel determinante na regulação da economia. O desafio está justamente em equilibrar o papel desses dois atores.

A proposta de desenvolvimento para as próximas décadas apresentada por Xi Jinping durante o Congresso não deixa claro como essa combinação será feita. Por um lado, o presidente anunciou que pretende atrair mais investimentos estrangeiros, acabar com o controle absoluto do Estado sobre determinadas empresas públicas e estimular a concorrência entre as companhias que atuam no país. Mas também reafirmou o compromisso em fortalecer as empresas estatais e aumentar a sua eficiência.

Outra missão a ser encarada pelo governo chinês é estimular o mercado interno e fomentar o desenvolvimento de uma classe média consumidora. Para isso, o governo vem aumentando os salários, facilitando o crédito e ampliando os benefícios sociais aos trabalhadores. Mas, se por um lado essas medidas elevam o poder de compra dos chineses, por outro pode afetar as exportações, bastante dependentes dos baixos salários pagos à mão de obra local para garantir a competitividade dos produtos no mercado externo.

A elevada desigualdade social é outro problema a ser enfrentado pelo governo chinês. Apesar de a renda per capita do país ter atingido 8,2 mil dólares, o valor ainda está aquém da média mundial, que é de 10,3 mil dólares. O maior problema é na área rural, onde ainda vivem 55 milhões de pessoas em situação de pobreza. Para tentar atingir a meta de eliminar a pobreza até 2020, Xi Jinping vem ampliando os investimentos em saúde, educação e habitação direcionados principalmente para as províncias menos urbanizadas.

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Diplomacia econômica

Os desafios internos enfrentados pela China não fazem o país desviar o foco de suas ambições externas. “A China se aproxima cada dia mais do centro do cenário mundial para oferecer maiores contribuições para a humanidade”, disse Xi Jinping no discurso de abertura do Congresso. De fato, algumas ações recentes do governo chinês revelam uma nação empenhada em se tornar uma liderança global e ter ainda mais influência no cenário internacional.

Para isso, o país aposta na chamada “diplomacia econômica”, como forma de converter sua pujança financeira em força política. Ao oferecer financiamento, comprar matérias-primas e realizar obras de infraestrutura em diversas partes do mundo, a China aposta no poder de sua economia para angariar aliados. É uma forma de estabelecer uma relação na qual os outros países se tornem cada vez mais dependentes do capital chinês.

A mais ousada iniciativa nesse sentido é a “Nova Rota da Seda”. Trata- se de um projeto bilionário, no qual a China financiará diversas obras de infraestrutura e logística pelo mundo. O objetivo é criar um corredor econômico, composto de estradas, ferrovias, oleodutos e cabos de fibra ótica, que irá conectar, por via terrestre e marítima, a China à Europa e à África, atravessando a Ásia Central, o Oriente Médio e o Oceano Índico.

O projeto é ousado: abrange 68 países, que somam 4,4 bilhões de pessoas e representam 40% do PIB mundial. Em troca, a China espera conquistar novos mercados e garantir contratos internacionais para suas empresas de infraestrutura, além de fortalecer a logística para atender à sua demanda por matérias-primas.

A “diplomacia econômica” chinesa também avança para outras partes do mundo, como a América Latina. Para o governo de Pequim, a região representa um excelente mercado para os produtos manufaturados da China, de maior valor agregado, ao mesmo tempo que se torna um dos principais fornecedores de matéria-prima e recursos energéticos para sustentar o desenvolvimento chinês. Além disso, Pequim aposta no financiamento de obras de infraestrutura na região. No Brasil, os chineses planejam financiar a construção de uma ferrovia ligando a cidade de Figueirópolis (TO) até Ilhéus (BA), com o objetivo de facilitar o transporte da soja que compram do Brasil, escoando o produto do Centro-Oeste até o porto baiano.

O continente africano, com suas vastas reservas minerais e abundantes jazidas de petróleo, é outro mercado de interesse para a China. Em troca da matéria-prima, empresas chinesas empreendem gigantescas obras de infraestrutura, necessárias para o desenvolvimento dos países da região. Com isso, a China se converteu no principal parceiro comercial do continente, desbancando aliados tradicionais dos africanos, como EUA e Europa.

Globalização e Trump

Com a ampliação dessas parcerias internacionais, a China se credencia ainda mais para se firmar como uma liderança global. O pouco apreço do presidente dos EUA, Donald Trump, às relações exteriores e aos acordos internacionais, cria um vácuo de liderança que começa a ser preenchido pela assertividade de Xi Jinping.

Desde que assumiu a Presidência dos EUA em janeiro de 2017, Donald Trump vem adotando uma postura mais isolacionista na relação de seu país com o mundo. Desdenha abertamente o papel da ONU como órgão de decisões multilaterais e critica os acordos comerciais, tendo inclusive se retirado do Acordo Transpacífico (TPP), um bloco criado para se tornar a maior área de livre-comércio do mundo. Além disso, isolou-se ainda mais da comunidade internacional ao fazer dos EUA a única nação a não ratificar o Acordo de Paris sobre o clima.

Por sua vez, Xi Jinping se credencia para assumir o protagonismo internacional tão menosprezado por Trump. A China vem aumentando sua contribuição a órgãos internacionais como a ONU e o Banco Mundial, além de ter criado um banco de desenvolvimento para financiar projetos em países em desenvolvimento. Apesar de ser o país que mais polui, a China tem participado ativamente das discussões sobre o clima e estabelecendo metas de redução de emissão de gases do efeito estufa. Além disso, Xi Jinping vem se tornando uma das vozes mais proeminentes na defesa da globalização e do livre-comércio.

Se as duas potências adotam posições distintas na forma como se relacionam com a comunidade internacional, as divergências se acentuam quando se trata do comércio bilateral. Trump acusa a China de ser desleal no comércio internacional com suas políticas de incentivo às exportações. O déficit comercial dos EUA com a China foi da ordem de 347 bilhões de dólares em 2016 e, para tentar reverter o quadro, Trump ameaçou impor tarifas de importação aos chineses. Embora os EUA tenham recuado da decisão, a questão comercial mantém o clima tenso entre os dois países.

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Potência militar

Não é só nos aspectos econômicos e políticos que a China se credencia para se tornar uma potência. Militarmente o país se organiza para consolidar sua força regional e até se projeta em regiões fora de seu entorno geográfico. Em agosto, o país inaugurou uma base naval no Djibuti, a primeira fora de seu território. A presença militar nesse país localizado no chifre da África garantirá à China acesso privilegiado ao Mar Vermelho e ao Golfo de Áden, uma região estratégica para o transporte marítimo mundial. Pequim justifica a criação da base como forma de dar apoio logístico às forças chinesas que atuam em missões das Nações Unidas na África.

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No entanto, a base no Djibuti também pode ser analisada a partir de um contexto mais amplo de expansionismo militar chinês, cuja principal expressão é a disputa territorial no Mar do Sul da China. A vasta área de 410 mil quilômetros é reivindicada pela China, que alega ter precedência histórica com base em um pedido feito em 1947. No entanto, países como Filipinas, Vietnã, Brunei, Malásia e Taiwan também disputam a soberania sobre a região e querem negociar com base na convenção da ONU sobre o Direito do Mar, que define zonas de 200 milhas para cada país.

A região é alvo de grande disputa devido à sua relevância econômica. Trata-se de uma área de interesse para a indústria pesqueira e que possui grandes reservas de petróleo, além de ser uma importante rota por onde circulam 5 trilhões de dólares em comércio anual. Mesmo com a indefinição das fronteiras, a China ampliou ofensiva para consolidar a ocupação da área a partir de 2014, ao construir ilhas artificiais com potencial uso militar e enviar plataformas para a exploração de petróleo na região. Nem mesmo uma decisão da Corte Permanente de Arbitragem da ONU, que em 2016 afirmou que o país não tem base legal para reivindicar “direitos históricos” sobre o Mar do Sul da China, demoveu Pequim de seus interesses na região.

Com ambições ousadas na economia, nas relações exteriores e na segurança nacional, Xi Jinping consolida seu poder no ambiente doméstico enquanto projeta seu país como uma grande potência internacional. A questão para o futuro próximo é saber até que ponto essa ascensão chinesa poderá avançar em um tabuleiro geopolítico ainda dominado pelos EUA.

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RESUMO

China
Xi Jinping O 19º Congresso Nacional do Partido Comunista garantiu mais poderes a Xi Jinping, que se consolida como a maior liderança chinesa desde Mao Tsé-tung. O presidente tem um estilo mais centralizador de governar, promovendo uma campanha de combate à corrupção e intensificando a repressão e a censura.

Potência Econômica Por meio do “socialismo de mercado”, a China mantém o controle estatal da economia e, ao mesmo tempo, a instalação de multinacionais no país. Esse modelo impulsionou a exportação e ajudou a tornar a China a segunda maior economia do planeta, atrás apenas da dos Estados Unidos. O desafio agora é equilibrar a abertura da economia à iniciativa privada sem abrir mão do controle de setores estratégicos.

Nova rota da seda É um projeto bilionário de integração comercial que irá conectar, por via terrestre e marítima, a China à Europa e à África. Esta e outras iniciativas de diplomacia econômica são vistas como uma forma de aumentar a relação de dependência de países menos desenvolvidos em relação à China. Com isso, Xi Jinping tenta se firmar como uma liderança mundial, defendendo a globalização e ocupando o espaço de poder que os EUA vêm abdicando desde que Donald Trump assumiu a Presidência do país.

Mar do Sul da China As reivindicações chinesas por áreas no Mar do Sul da China a colocam em rota de colisão com outros vizinhos no Sudeste Asiático – Vietnã, Filipinas, Brunei, Taiwan e Malásia. A China construiu ilhas artificiais e explora petróleo na região, a despeito da decisão de um tribunal da ONU condenando essas ações.

Coreia do Norte A China tenta mediar a crise nuclear entre a Coreia do Norte e os EUA. Para Pequim, é importante manter a estabilidade na região para evitar um fluxo de refugiados para dentro de seu território e uma eventual reunificação das Coreias. Os EUA tentam pressionar a China a ser mais enérgica em relação às ambições nucleares da Coreia do Norte.

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Internacional – China: uma potência ainda mais forte
Internacional – China: uma potência ainda mais forte
O presidente Xi Jinping amplia seu poder na China e se consolida como uma das principais lideranças mundiais, desafiando a hegemonia dos Estados Unidos

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