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Literatura: Modernismo – Poesia em Portugal (Fernando Pessoa)

Fernando Pessoa é o principal nome do Modernismo português

O Modernismo português tem início oficialmente em 1915, com a publicação do primeiro número da revista Orpheu. O poeta Fernando Pessoa (1888-1935) integrava o grupo de escritores envolvidos no lançamento do periódico. Pessoa tornou-se um grande nome da literatura portuguesa do século XX por haver criado inúmeras teorias estéticas e diversos heterônimos (personalidades artísticas com estilo próprio) para assinar suas obras. As principais criações heteronímicas são Alberto Caeiro, um sábio homem do campo; Ricardo Reis, um amante da poesia clássica; e Álvaro de Campos, um engenheiro que trata dos avanços tecnológicos do início do século XX. Existem textos assinados pelo próprio Fernando Pessoa (trata-se da poesia ortônima), como é o caso da obra Mensagem (1934).

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O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente[1]
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente[2].
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão[3],
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

[0] METALINGUAGEM: O poema reflete sobre o fazer poético, criando mundos e realidades concebidos artisticamente.

[1] ADVÉRBIO DE MODO: Este ADVÉRBIO reforça a intensidade do processo ficcional, capaz de transformar em objeto estético um elemento do mundo real.

[2] SENTIMENTO ESTÉTICO O poeta não expressa os sentimentos tal como percebidos individualmente, mas explora a sensibilidade por meio das palavras e cria um novo sentimento, de natureza estética.

[3] OBRA DE ARTE: No jogo das palavras, o processo racional de composição trabalha com as emoções e cria uma obra de arte.

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IX 

Sou um guardador de rebanhos
O rebanho é os meus pensamentos[1]
E os meus pensamentos são todos 
sensações[2]
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma for é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto[3].
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes[4]
Sinto todo o meu corpo deitado
na realidade
Sei a verdade e sou feliz.

O Eu Profundo e os Outros Eus, Nova Fronteira, 2006


HOMEM DO CAMPO Alberto Caeiro é considerado o mestre de todas as outras vozes poéticas de Pessoa. É o homem do campo que se aproxima da visão de mundo pagã e apresenta um pensamento lúcido, simples e sábio.


[1] METÁFORA: O eu lírico considera que seus pensamentos, transitando livremente, são como animais de um rebanho. O universo campestre está presente até mesmo na criação das imagens poéticas.

[2] SENSAÇÕES: Alberto Caeiro não é adepto de uma visão de mundo racionalizante. Para ele, o importante é o conhecimento do mundo por meio dos sentidos.

[3] FILOSOFIA DE VIDA: A exemplificação é um dos principais recursos argumentativos empregados para concretizar uma ideia. Caeiro comprova sua filosofia de vida com a experiência de um dia ensolarado no campo.

[4] SINESTESIA: É a figura de linguagem que mistura vários tipos de sensação em uma imagem – neste caso, a experiência tátil é associada ao órgão da visão.

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Quando, Lídia, vier o nosso outono[1]
Com o inverno[1] que há nele, reservemos
Um pensamento, não para a futura
Primavera[1], que é de outrem,
Nem para o estio, de quem somos
mortos,
Senão para o que fica do que passa
O amarelo atual que as folhas vivem
E as torna diferentes[2]

[1] METÁFORA: As estações do ano apresentam-se metaforizadas nas fases da vida do eu lírico. A compreensão tranquila da vida é representada pela forma como o eu lírico compreende as etapas e fases que devem ser cumpridas como se apresentam.

[2] ESTOICISMO: Ricardo Reis era adepto do estoicismo, doutrina que propõe viver de acordo com a lei racional da natureza. Nos últimos versos, o comportamento sereno do eu lírico considera, sem juízo de valor, que cada momento da vida é diferente do outro

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Cruz[1] na porta da tabacaria!
Quem morreu? O próprio Alves? Dou
Ao diabo o bem-estar que trazia.
Desde ontem[2] a cidade mudou.

Quem era? Ora, era quem eu via.
Todos os dias o via. Estou
Agora sem essa monotonia.
Desde ontem[2] a cidade mudou.

Ele era o dono da tabacaria.
Um ponto de referência de quem sou
Eu passava ali de noite e de dia.
Desde ontem[2] a cidade mudou.

Meu coração tem pouca alegria,
E isto diz que é morte aquilo onde estou.
Horror fechado da tabacaria!
Desde ontem[2] a cidade mudou.

Mas ao menos a ele alguém o via,
Ele era fixo, eu, o que vou,
Se morrer, não falto, e ninguém diria[3].
Desde ontem[2] a cidade mudou.

Quando Fui Outro, Objetiva, 2006

[1] ALEGORIA E METAFÍSICA: A presença da cruz na porta é a representação da morte de Alves e do assombro do eu lírico diante da finitude da vida, tema metafísico por excelência.

[2] MARCADORES TEMPORAIS: A repetição reforça a ideia de transformação na vida do eu lírico. É como se “desde ontem” houvesse a descoberta da temporalidade da vida e da sua insignificância nos centros urbanos.

[3] SOLIDÃO E MODERNISMO: O tema da solidão é típico em Álvaro de Campos, que disseca a vida anônima nas grandes cidades.  A constatação de que ele também morrerá e não seria sequer notado o angustia e revela sua condição solitária.

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Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa compor muitos
rocks rurais
E tenha somente a certeza
Dos amigos do peito e nada mais

Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa ficar no tamanho da paz
E tenha somente a certeza
Dos limites do corpo e nada mais
(…)

Eu quero o silêncio das línguas cansadas
Eu quero a esperança de óculos
Meu filho de cuca legal
Eu quero plantar e colher com a mão
A pimenta e o sal

Eu quero uma casa no campo
Do tamanho ideal, pau a pique e sapé
Onde eu possa plantar meus amigos
Meus discos e livros
E nada mais


A canção acima retoma a visão idealizada de que a vida no meio rural pode trazer mais felicidade que a vida no meio urbano. Assim como na poesia de Caeiro, no romance A Cidade e as Serras ou nos poemas árcades, nota-se uma oposição implícita entre cidade e campo, com valorização da vida junto à natureza.


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O Vento Lá Fora (2014) é um documentário sobre a poesia de Fernando Pessoa, dirigido por Marcio Debellian. A cantora Maria Bethânia e a professora Cleonice Berardinelli, da Academia Brasileira de Letras (ABL), leem os versos do poeta. Elas apresentam a obra de Pessoa e destacam diversos aspectos, como os heterônimos. Manuscritos e imagens raras completam o filme.

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