Crise política: Como os jornais noticiaram o vazamento de denúncias do senador Delcídio do Amaral (PT) contra o governo
IstoÉ divulga delação de senador
Como os três principais diários do país repercutiram a suposta revelação de que Dilma e Lula interferiram na Lava Jato.
O fato
Em 3 de março de 2016, a revista IstoÉ publicou reportagem em que afirma que teve acesso ao termo de delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) ao Ministério Público Federal. Ele acusa a presidente Dilma Roussef e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobrás e na tentativa de impedir as investigações da Operação Lava Jato. Ex-líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral foi preso em novembro de 2015, ele mesmo acusado de interferir na Lava Jato. Segundo a IstoÉ, em de fevereiro de 2016, quando passou a cumprir prisão domiciliar, ele teria feito o acordo de delação premiada, em que o acusado conta o que sabe e, em troca, recebe benefícios, como redução da pena. O senador emitiu nota dizendo que não reconhece a autenticidade dos documentos divulgados pela revista.
No mesmo dia, o resultado do PIB em 2015 e a votação de ação penal contra o presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também foram notícias.
Folha de São Paulo
A Folha trouxe a manchete relacionada ao fato – “Ex-líder do governo liga Dilma e lula à lava Jato, e oposição pede renúncia” – para a parte superior da sua capa. ao contrário do Estadão e do Globo, não colocou o nome do senador Delcídio no título (mas apenas no texto abaixo da manchete) e preferiu usar a expressão “ex-líder do governo”, mostrando que a delação vem do próprio ex-aliado da presidente Dilma. a manchete também destacou o efeito provocado nos partidos de oposição, que mencionaram incluir a delação no pedido de impeachment.
O jornal reproduziu as acusações contra Dilma (“tentou interferir três vezes na operação com ajuda de José Eduardo Cardozo, então ministro da Justiça) e lula (“Delcídio intermediou, a pedido de Lula, propina ao ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró para tentar evitar a sua delação”), citou algumas consequências da declaração (como a subida da Bolsa e a queda do dólar) e incluiu que “devem dar força a protestos anti-Dilma”.
Chama atenção a articulação das duas fotos presentes na capa: a do rosto parcial da presidente Dilma em primeiro plano (em que aparecem apenas seus olhos e nariz) e a que mostra somente os lábios costurados de um refugiado iraniano, que vem um pouco abaixo, formando uma unidade. a Folha noticiou a queda no PIB na parte inferior da página, mas com um certo destaque, e afirmou que é o “pior resultado desde 1990”. Não houve menção à notícia sobre Eduardo Cunha – a capa do dia anterior já havia adiantado que a maioria dos ministros do supremo tribunal Federal havia votado pela abertura da ação penal.
O Globo
No jornal carioca, a delação de Delcídio também ganhou espaço nobre, ocupando cerca de três quartos da página. uma foto de Dilma em primeiro plano, com um olhar triste, mostrava, ao fundo, o ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que cumprimentava um colega ao se despedir do cargo. a ideia que Dilma está só foi reforçada pela forte manchete “delação de Delcídio põe Dilma no centro da lava-Jato”. diferentemente da Folha e do Estado, o Globo não colocou o nome do ex-presidente Lula no título; apenas o mencionou abaixo, nas subchamadas.
O resumo da reportagem na capa focou nas acusações do delator contra Dilma: que a pedido dela “negociou o voto de um ministro do STJ para tentar soltar os empresários Marcelo Odebrecht e Otávio azevedo” e que “ela sabia das irregularidades na compra da refinaria de Pasadena, nos EUA”. Completam o conjunto de informações sobre a delação fotos das personalidades envolvidas, como Delcídio, Dilma e Lula, e um pequeno resumo da atuação do senador e das acusações que recaem sobre a presidente e o ex-presidente.
A notícia sobre Eduardo Cunha veio logo abaixo do conjunto de informações sobre a delação de Delcídio, com o título “Por unanimidade, Cunha vira réu no supremo”. Já o recuo do PIB (“Brasil a caminho de outra década perdida”) contou com a publicação de indicadores negativos (recessão histórica, queda dos investimentos, tombo na indústria), reforçando “o pior resultado desde o confisco de Collor” e as projeções feitas (novo tombo de 4% este ano e recessão como a da década de 80).
O Estado de São Paulo
A cobertura do jornal sobre a suposta delação de delcídio – que também mereceu a manchete principal e o maior espaço na capa – parece ser mais focada na atuação do ex-presidente lula do que na da própria presidente Dilma. a manchete é semelhante à da Folha, que traz o nome de ambos, mas, no texto da capa, é citada apenas uma acusação contra a presidente Dilma (“acompanhou o processo de compra da refinaria de Pasadena”), enquanto sobre o ex-presidente são citadas duas (“atuou para evitar a delação de Nestor Cerveró e intermediou pagamentos à família do ex-diretor da Petrobras em troca do silêncio dele” e “trabalhou para frear as investigações da CPI do Carf sobre a suposta compra de MPs”). a foto de Dilma – única imagem da capa – sugere certa fragilidade da presidente, ao mostrá-la abraçando o ex-ministro da Justiça na cerimônia de transferência de cargos. além do texto que acompanha a notícia principal, outras duas chamadas repercutem a delação e ampliam a cobertura: “Planalto critica ‘vazamentos como arma política’” e “Oposição reforça pedido de renúncia”.
assim como O Globo, o Estado também traz na capa a informação que delcídio não confirmou a autenticidade dos documentos da reportagem da revista IstoÉ – a Folha só menciona esse fato na reportagem interna.
O jornal ainda destaca na capa a queda de 3,8% do PIB e o resultado final da votação do STF (“supremo, por unanimidade, instala ação contra Cunha”), embora tivesse antecipado o fato – assim como a Folha e O Globo – na edição do dia anterior.