O aborto em discussão.
O aumento de casos de fetos com microcefalia, anomalia suspeita de vinculação com o zika vírus, traz à tona o debate sobre a interrupção da gravidez no país.
No início de 2016, a disseminação do zika vírus e sua associação com o crescimento de casos de recém-nascidos com microcefalia – má-formação congênita em que a cabeça do bebê é menor do que o padrão, com possíveis danos neurológicos – reacenderam o debate sobre o aborto no país. De acordo com a legislação nacional, a interrupção da gravidez é crime, sendo permitida apenas em três casos extremos: resulta- do de estupro, quando traz risco de vida para a mãe ou se o feto sofrer de anencefalia, condição rara caracterizada pela ausência parcial do cérebro.
Organizações humanitárias e grupos feministas passaram a defender que gestantes que contraíram o vírus tenham o direito de decidir se desejam ou não interromper legalmente a gestação. Um dos argumentos é que a proibição do aborto penaliza, sobretudo, as mulheres mais pobres, que se sub- metem a práticas clandestinas e sem a supervisão médica adequada, colocando em risco a própria vida – pois aquelas que têm melhores condições financeiras podem recorrer a uma clínica particular, com procedimentos mais seguros.
A discussão sobre o aborto é sempre muito polêmica. Esbarra, sobretudo, em princípios morais e religiosos e enfrenta forte resistência de alas mais conservadoras da sociedade. Vai nessa linha a aprovação, em outubro de 2015, pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 5096/13, de autoria do presidente da Câmara, o deputado evangélico Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O projeto determina penas específicas para quem induzir ou orientar gestantes ao aborto. Conhecido como PL do aborto, também dificulta o aborto legal ao incluir a exigência de exame de corpo de delito para atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS) em casos de estupro – hoje, basta a palavra da mulher. Repudiada por grupos em defesa dos direitos das mulheres, a proposta ainda precisa ser aprovada no plenário da Câmara e do Senado para virar lei.
As questões relativas à moralidade e aos juízos de valor foram amplamente exploradas por Gil Vicente, o principal nome do Humanismo, um dos movimentos literários tratados neste capítulo. Em sua obra Auto da Barca do Inferno (1517), os mortos chegam a um porto onde ocorre o julgamento de suas ações e atitudes durante a vida. Há uma defesa clara da moral cristã, baseada na recompensa das virtudes e na punição dos pecados.
NO GRUPO DE RISCO. Jovem grávida, em janeiro de 2016, moradora da periferia de Recife (PE). Pernambuco é considerado o epicentro dos casos de microcefalia associada ao zika vírus no Brasil.