Brasil República: República Oligárquica (“Café com Leite”)
SENHORES DA TERRA – Prudente de Morais (ao centro) foi o primeiro presidente civil do Brasil
Poderosos oligarcas
Após o breve comando militar no inicio do período republicano, o Brasil passou a ser controlado pelas oligarquias de Minas Gerais e São Paulo
Entre 1894 e 1930, o Brasil esteve sob o comando de setores das oligarquias paulista e mineira, que controlaram eleições, fizeram presidentes e dominaram o país. Esses grupos controlavam as principais questões políticas do país com o apoio de outras oligarquias estaduais.
República do café com leite
A denominação República do Café com Leite é feita em alusão à aliança que garantia o controle político para os estados de Minas Gerais (grande produtor de leite) e São Paulo (líder cafeeiro). Por meio dessa política, instalada para garantir os interesses de suas oligarquias regionais, os dois estados mais ricos e populosos do Brasil – reunidos nos partidos Republicano Paulista (PRP) e Republicano Mineiro (PRM) – escolhiam um candidato único às eleições presidenciais. Dessa forma, mineiros e paulistas dominaram o país e ditaram os rumos da nação.
Prudente de Morais (1894-1898)
As eleições de 1894 fizeram do paulista Prudente de Morais o primeiro presidente civil do Brasil. Ele procurou conter a oposição militar e restaurar as finanças, mas enfrentou muitas crises. Dois anos após sua posse, estourou a Guerra de Canudos. A situação econômica também não melhorou, e a moeda brasileira quase perdera o valor. Apesar disso, Prudente de Morais elegeu seu sucessor.
O QUE ISSO TEM A VER COM PORTUGUÊS
Ao cobrir a Guerra de Canudos para o jornal O Estado de S. Paulo, o escritor Euclydes da Cunha produziu a obra-prima Os Sertões, considerada o marco inicial do pré-modernismo. Saiba mais no GUIA DO ESTUDANTE PORTUGUÊS.
Campos Salles (1898-1902)
Para garantir o domínio das oligarquias, o presidente seguinte, o paulista Campos Salles, montou o esquema conhecido como política dos governadores: o presidente dava suporte aos candidatos oficiais nas eleições estaduais, e os governadores, por sua vez, apoiavam o indicado do governo nas eleições presidenciais. O plano contava com a autoritária prática do coronelismo, por meio da qual os coronéis usavam seu poder sobre o eleitorado regional. Cada coronel controlava o próprio “curral eleitoral”, garantindo os votos dos eleitores para os candidatos por ele indicados. Além disso, o governo mantinha o controle da Comissão de verificação de Poderes do Congresso Nacional, responsável pelos resultados eleitorais e pela diplomação dos eleitos. Organizava-se, assim, a fraude eleitoral.
Rodrigues Alves (1902-1906)
Em 1902 foi eleito o paulista Rodrigues Alves. O novo presidente adotou uma política de valorização do café, batizada de socialização das perdas: sempre que o preço do produto caía no mercado internacional, o governo reduzia a taxa cambial, desvalorizando a moeda e aumentando, assim, o lucro dos cafeicultores. Essa desvalorização provocava mais inflação e aumentava o custo de vida da população, que pagava caro para beneficiar a classe dominante.
Amparados por essa política benevolente, os fazendeiros elevaram demasiadamente a produção cafeeira, causando uma crise de superprodução. Para tentar valorizar o produto, foi criado, em 1906, o Convênio de Taubaté – acordo entre os governadores de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro para comprar o excedente estocado. Em troca, os barões do café evitariam futuras superproduções. Apesar de ser cafeicultor paulista, o presidente não reconheceu o convênio, e suas políticas só foram implantadas no governo seguinte.
Ainda no plano econômico, Rodrigues Alves investiu na realização de obras públicas. Com o auxílio do prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos, modernizou a capital federal, que, naquele momento, era uma cidade suja, com focos de ratos e mosquitos transmissores de doenças. A falta de saneamento básico no Rio de Janeiro deixava os moradores vulneráveis a epidemias de febre amarela, varíola e outras doenças. Coube ao governo realizar o alargamento de ruas, o saneamento da Lagoa Rodrigo de Freitas e o acerto do serviço de limpeza pública.
Uma reforma sanitária foi conduzida pelo prefeito e pelo cientista Osvaldo Cruz, chefe do Departamento Nacional de Saúde Pública. Mas a tensão foi imediata quando, em 1904, o governo impôs a vacinação à população. Na raiz da chamada Revolta da Vacina estava a reurbanização do centro da cidade, que removeu parte da população à força dos cortiços e morros centrais para bairros distantes. O descontentamento fez da cidade um campo de batalha. A oposição militar aproveitou-se da situação para tentar depor o presidente. Mas a revolta foi sufocada, deixando centenas de mortos de ambos os lados.
Afonso Pena (1906-1909)
O paulista Rodrigues Alves foi sucedido pelo mineiro Afonso Pena, que pôs em prática as decisões do Convênio de Taubaté. Promoveu a construção de estradas de ferro e portos e ampliou a colonização do interior brasileiro. Em 1907 expandiu a rede de comunicações do país ao ligar a Amazônia ao Rio de Janeiro por meio do telégrafo. Na sucessão de Afonso Pena, porém, ocorreu um cisma na aliança entre mineiros e paulistas: o nome indicado pelos paulistas não foi aceito pela maioria do Partido Republicano Mineiro, e o desacordo fez com que os mineiros se aliassem aos gaúchos na escolha do marechal Hermes da Fonseca. Os paulistas, por sua vez, uniram-se aos baianos para lançar a candidatura de Rui Barbosa. O esforço de Rui Barbosa ganhou o nome de Campanha Civilista, por opor um civil a um militar. À época das eleições, o governo já era ocupado pelo fluminense Nilo Peçanha, vice de Afonso Pena, que assumira em 1909, com a morte do presidente. O triunfo de Hermes da Fonseca, em 1910, representou a vitória da situação.
Hermes da Fonseca (1910-1914)
Hermes da Fonseca buscou recuperar para os militares a influência antes exercida na esfera pública. Com esse objetivo, pôs em prática a política das salvações, que derrubou as velhas oligarquias estaduais do Nordeste por meio de intervenções militares e colocou no poder grupos mais afinados com o presidente.
LUTA MESSIÂNICA – Sob a liderança de Antônio Conselheiro, milhares de camponeses combateram na Guerra de Canudos, entre 1896 e 1897
CANUDOS E CONTESTADO: A FÉ EM ARMAS
Os movimentos de Canudos e do Contestado foram bem diferentes, apesar do caráter messiânico de ambos. O primeiro ocorreu em 1896, no sertão da Bahia. Sob a liderança do pregador Antônio Conselheiro, milhares de pessoas juntaram-se no Arraial de Canudos. Conselheiro proclamava o início de uma nova era e convocava os fiéis a combater a República. Fazia duras críticas à Igreja Católica, além de recusar o pagamento de impostos. Canudos, com cerca de 20 mil moradores, começou a ser visto não só como “arraial de fanáticos”, mas também como reduto de rebeldes monarquistas, apesar de seu líder não defendê-la. Em 1897, o povoado foi destruído por tropas federais, deixando milhares de mortos.
Já o Contestado ocorreu em Santa Catarina, entre 1912 e 1916. O beato José Maria aglutinou milhares de camponeses no Contestado, região de Santa Catarina na divisa com o Paraná. Uma enorme massa de desempregados engrossava o rol dos aflitos: eram trabalhadores da Brazil Railway Company, contratados em cidades como Salvador para a construção de uma estrada de ferro na região e, após concluído o trabalho, demitidos e largados à própria sorte. Nos primeiros combates com as tropas estaduais, José Maria foi morto. Os fiéis resistiram, mas o Exército decidiu o conflito, com milhares de revoltosos mortos.
Várias rebeliões ocorreram no seu governo. A Revolta da Chibata, também conhecida como Revolta dos Marinheiros, ocorreu no Rio de Janeiro, em 1910. Os rebelados queriam o fim dos castigos corporais aplicados por oficiais brancos em marujos negros, a redução da jornada de trabalho e a concessão de anistia. Liderados pelo gaúcho João Cândido, assumiram o controle de navios da Marinha de Guerra, ancoradas na Baía de Guanabara. O presidente prometeu, inicialmente, atender às reivindicações, mas acabou prendendo e deportando muitos deles.
Já a Revolta de Juazeiro foi consequência da política das salvações, que, no Ceará, opôs oligarquias locais ao governo federal, em 1911. Para retirar o poder da família Acioli, o presidente indicou um novo governador, Marcos Franco Rabelo. Os coronéis, apoiados pelo padre Cícero, então prefeito de Juazeiro do Norte, reagiram armando centenas de sertanejos e enviando-os à capital, onde foram contidos pelas forças federais. Rabelo renunciou, e Hermes da Fonseca nomeou um novo interventor, o general Setembrino de Carvalho.
No fim do mandato de Hermes da Fonseca ainda estouraria a Guerra do Contestado.
Venceslau Brás (1914-1918)
Passado o mandato de Fonseca, o mineiro Venceslau Brás foi eleito presidente em 1914. É durante seu governo que o Brasil toma parte na I Guerra Mundial. Nesse contexto do conflito global, a atividade industrial crescia no país, formando, um contingente expressivo de operários nos grandes centros. Em 1917, influenciados pela Revolução Russa, os trabalhadores do bairro paulistano da Mooca formaram um movimento que se espalhou por todo o país. Foi organizada uma greve nacional por aumento salarial, jornadas de oito horas e abolição do trabalho noturno para mulheres e menores. Após intensos confrontos, a classe patronal concordou em negociar, pondo fim à mobilização.
Tenentismo
O paulista Rodrigues Alves foi eleito para suceder Venceslau
Brás, mas morreu antes de assumir o cargo. Seu vice, o mineiro Delfm Moreira, governou por um ano até convocar novas eleições, em 1919. No novo pleito, venceu o paraibano Epitácio Pessoa, candidato apoiado pelo PRM e pelo PRP, que governou de 1919 a 1922. Seu sucessor foi o mineiro Artur Bernardes (1922 a 1926), que não conseguiu obter a unanimidade de paulistas e mineiros.
Bernardes também despertou uma oposição militar, principalmente da ala jovem do Exército. Descontentes diante das instituições fraudulentas da República, os oficiais formaram um movimento armado para derrubar o governo – o Tenentismo. Contavam com o apoio de oligarquias dissidentes e de parte da classe média e defendiam o voto secreto, o combate à corrupção e um governo central forte. Em 1922, os tenentistas tomaram o Forte de Copacabana, mas a revolta foi sufocada e a maioria dos líderes, morta.
O auge do movimento tenentista ocorreu após uma tentativa frustrada de tomar a cidade de São Paulo em 1924, que ficou conhecida como Revolução Paulista. Derrotados, os oficiais fugiram para o interior e, unidos com rebeldes paranaenses e gaúchos, lutaram sob a liderança de Miguel Costa e Luís Carlos Prestes. Buscando conquistar a adesão popular, a Coluna Prestes – também conhecida como Coluna Prestes- Miguel Costa – marchou por 25 mil quilômetros de sul a norte do país, mas seu esforço foi em vão. Em 1927, embora não tenham perdido uma única batalha, cansados e sem o apoio popular, os rebeldes refugiaram-se na Bolívia.
Revolução de 1930
Em 1926 foi eleito o paulista Washington Luís. Durante seu governo, ele enfrentou o endividamento interno e externo do país, a retração das exportações e, a partir de 1929, os problemas provocados pela crise econômica mundial com a quebra da Bolsa de Nova York (veja a matéria na pág. 70). Na verdade, era o auge de toda uma década de crise, com a falência do Convênio de Taubaté e a ascensão da classe média e dos movimentos operário e tenentista formando uma oposição importante ao governo, com demandas por maior liberdade, modernização e democracia.
Para sua sucessão, para defender os interesses da cafeicultura, Washington Luís lançou como candidato o governador de São Paulo, Júlio Prestes, do PRP. Ao indicar outro paulista, rompeu com a política do café com leite. Em represália, o PRM foi para a oposição e, com o apoio do Rio Grande do Sul e da Paraíba, compôs a Aliança Liberal. O gaúcho Getúlio Vargas seria candidato a presidente e o paraibano João Pessoa, a vice.
O programa da Aliança Liberal continha reivindicações democráticas, como a defesa do voto secreto e da Justiça Eleitoral. Mas, em 1930, a chapa de Júlio Prestes venceu a eleição. A princípio, a oposição aceitou o resultado. Mas quando João Pessoa foi assassinado, em crime passional, os aliancistas atribuíram motivos políticos ao crime, deflagrando uma rebelião político-militar. Articulada entre o Sul e o Nordeste, e liderada por Getúlio Vargas, a Revolução de 1930 tomou o poder, pondo fim à República Velha.
PARA IR ALÉM
Na HQ A Luta contra Canudos, os desenhos de Jozz e Akira Sanoki captam a essência da pobreza do interior da Bahia no fim do século XIX, enquanto o roteiro de Esteves utiliza uma linguagem interiorana carregada, típica da região.