Enem 2023: confira modelo de redação sobre trabalho invisível das mulheres
Professora mostra - citando um vídeo que viralizou - um exemplo do caminho que os candidatos poderiam ter seguido na dissertação
O tema de redação do Enem 2023 foi “os desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”. Segundo especialistas ouvidas pelo GUIA DO ESTUDANTE, o tema é atual e tem extrema relevância social.
“Antes da entrada da mulher no mercado de trabalho, no século 20, a divisão social do trabalho atribuía à mulher o papel social do cuidado com a casa e com os filhos e aos homens o ato de prover por meio do trabalho externo. No entanto, com as mudanças sociais, cada vez mais a mulher divide o mundo do trabalho com o homem, por outro lado, as atividades do cuidado do lar não são divididas, culminando na sobrecarga para um dos gêneros e na desconsideração dessas atividades como um trabalho, inclusive por não ser remunerado”, comenta Gabrielle Cavalin, Coordenadora Geral de redação do Poliedro.
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A pedido do GUIA DO ESTUDANTE, Gabrielle elaborou uma redação-modelo do tema. Lembrando que a ideia aqui não é mostrar o exato caminho que o candidato deveria ter seguido, mas apenas apresentar uma das possibilidades do texto e de argumentação. Confira:
Modelo
Ana Terra, atriz e estudante de psicologia, viralizou nas redes sociais ao divulgar, em seu perfil na rede social Instagram, vídeos em que entrevista homens e mulheres na rua com o objetivo de mostrar a diferença do papel social atribuído ao gênero feminino e ao masculino por meio das respostas dadas por eles. Uma das perguntas foi sobre o que os entrevistados fazem quando chegam em casa. As mulheres entrevistadas disseram que preparam o jantar e cuidam dos filhos, ao passo que os homens compartilharam que tomam banho e assistem à televisão. Essas respostas evidenciam um problema social histórico da sociedade brasileira: a invisibilidade do trabalho de cuidado das mulheres no Brasil. Sem dúvidas, essa invisibilidade passa por desafios, como a naturalização do papel social da mulher em relação ao cuidado e a falta de debate sobre o assunto, que precisam ser enfrentados.
De início, é necessário salientar que a problemática tem suas raízes na naturalização do ato de cuidar como responsabilidade feminina. Isso ocorre porque, antes da entrada da mulher no mercado de trabalho, no século XX, a divisão social do trabalho atribuía à mulher o papel social do cuidado com a casa e com os filhos e aos homens o ato de prover por meio do trabalho externo. No entanto, com as mudanças sociais, cada vez mais a mulher divide o mundo do trabalho com o homem, por outro lado, as atividades do cuidado do lar não são divididas, culminando na sobrecarga para um dos gêneros e na desconsideração dessas atividades como um trabalho, inclusive por não ser remunerado. Desse modo, justamente por ainda haver a naturalização do cuidado como uma obrigação feminina e não como um trabalho, as atividades de cuidado realizadas pelas mulheres no país continuam invisibilizadas.
Ademais, a falta de debate sobre essa temática permite a manutenção dessa invisibilidade. Segundo o filósofo e sociólogo alemão Jurgen Habermas, autor de uma teoria de comunicação, uma sociedade é justa quando há troca de informação entre as instituições sociais, como o Estado e a mídia, e a sociedade. Nesse contexto, percebe-se que faltam iniciativas, especialmente por parte do Estado, em colocar a problemática da sobrecarga do trabalho feminino do cuidado – seja da casa, dos filhos ou da própria comunidade – em pauta. São tímidas as tentativas de debate que evidenciam os números do problema, a exemplo da pesquisa do IBGE de 2019 que confirma que as horas dedicadas ao trabalho doméstico por parte das mulheres é o dobro em relação aos homens, e também os projetos de leis para tentar retificar a situação. Logo, é evidente que essa ausência de debate público sobre o assunto torna a sociedade menos justa às mulheres que sofrem com o não reconhecimento em relação às jornadas duplas de trabalho.
Portanto, para reverter a ausência de debate sobre o problema e a naturalização feminina do cuidado são necessárias ações contundentes. Para isso, cabe à Câmara dos Deputados – responsável pela promoção de leis – a criação de um projeto que vislumbre o pagamento de um salário mínimo para remuneração de mulheres que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico. Além disso, cabe ao Governo Federal – especialmente o Ministério das Mulheres – aumentar o debate sobre o assunto, por meio de campanhas divulgadas em mídias, como redes sociais, rádio e televisão, a fim de evidenciar a necessidade de corresponsabilidade da divisão desse trabalho. Somente assim, entrevistas como as elaboradas por Ana Terra passarão a revelar uma equidade entre os gêneros e não o abismo entre eles, como ainda existe hoje.
Por Gabrielle Cavalin, Coordenadora Geral de redação do Poliedro.
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