Afinal, o Enem deste ano está garantido? A pergunta, que foi pouco ou nada cogitada nos últimos 10 anos de Enem (quando ele passou a valer como vestibular), tem inquietado os dirigentes das universidades públicas e estudantes que já se inscreveram para a edição de 2019.
A razão principal são diversas medidas tomadas pelo Ministério da Educação, que desde o começo do ano atravessa uma crise política e já trocou três vezes a presidência do Inep — autarquia responsável, dentre outras coisas, pela elaboração e aplicação do Enem. Conversamos com Ocimar Alavarse, coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional (Gepave) da Faculdade de Educação da USP, e Cláudia Costin, professora da FGV-RJ e diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais (CEIPE) para entender se — e como — as confusões no MEC e no Inep impactam na realização do Enem.
Demissões no Inep
O penúltimo presidente do Inep, Elmer Coelho Vicenzi, ficou menos de um mês no cargo e foi exonerado em meio a polêmicas envolvendo um pedido seu de quebra de sigilo das informações dos candidatos inscritos no Enem. No dia seguinte, foi anunciado que Alexandre Ribeiro Pereira Lopes o substituiria.
O novo presidente, assim como o anterior havia feito, reforçou esta semana que o cronograma do Enem será mantido. Vicenzi chegou a afirmar em coletiva de imprensa na última sexta que o Enem estava dentro do cronograma previsto, embora originalmente o contrato com a RR Donnelley — gráfica que imprimia a prova e que declarou falência no começo de abril — previsse o início das impressões do exame durante o período de inscrições. As inscrições do Enem se encerraram no último dia 17, e só terça (21) o Inep contratou uma nova gráfica para realizar a impressão.
Para além de imprevistos como a falência da gráfica, a inexperiência em gestão educacional das pessoas nomeadas para presidir o Inep também são um fator de influência para as incertezas que rondam o exame, como aponta o professor Ocimar Alavarse: “uma coisa é ser professor, outra questão é a gestão na área de educação”.
Tanto ele quanto Claudia Costin concordam que o atual governo federal e a gestão do MEC não têm uma política educacional definida. Alavarse diz ainda que a autarquia tem mantido seu funcionamento muito por conta de seu corpo técnico, composto por funcionários de carreira do Estado e com muita experiência na realização dessas atividades.
É também por causa desses técnicos e de o Enem já contar com um processo de realização muito definido (como um banco de questões prontas) que Costin acredita que o Enem ocorrerá normalmente. Apesar disso, Lavarse destaca que o cenário não deixa de ser preocupante, e que o cancelamento do exame implicaria na mudança de calendário das universidades que fazem uso dele como processo seletivo, além do prejuízo para os estudantes que realizariam a prova. “Abala o conjunto”, afirma.
Questões financeiras
Embora os cortes nas universidades federais e na Capes tenham sido os que mais repercutiram na imprensa, as escolas de Ensino Básico e até mesmo órgãos e autarquias do MEC também sofreram com os bloqueios. O Inep foi uma delas, e teve 26% da verba que era destinada a suas despesas discricionárias bloqueadas.
Em entrevista ao jornal O Globo, técnicos do instituto afirmaram temer que o bloqueio afete a realização da exame. Do total de R$ 1,5 bilhão a que o Inep tinha acesso, R$ 394,6 milhões estão “contingenciados”. É importante lembrar que além do Enem, o Inep aplica diversos outros exames, avaliações e censos como o Encceja e o Enade. O MEC já informou que o gasto com a avaliação da Educação Básica esse ano será de R$ 500 milhões e, nos últimos anos, o Enem teve uma média de gastos de R$ 600 milhões. A soma desses valores resultaria em um gasto médio de R$ 1,1 bilhão — quase a totalidade da verba da autarquia depois do contingenciamento.
Por outro lado, o Inep já anunciou uma série de medidas para reduzir os gastos com a aplicação de provas esse ano, como um novo material reaproveitável para colher a biometria no dia da prova e uma nova diagramação que ofereça espaço para a resolução das questões no próprio caderno de questões, evitando o gasto com folhas de rascunho. No total, estima-se uma economia de R$ 42 milhões.