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Por que até mesmo os brasileiros foram expostos à radiação de Chernobyl

O acidente afetou muito mais que a região da antiga União Soviética, e tornou a Terra um lugar mais tóxico para se viver

Por Ludimila Ferreira
7 jun 2025, 15h00
Acervos históricos sobre o acidente de Chernobyl da Sociedade Ucraniana para Amizade e Relações Culturais com Países Estrangeiros (USFCRFC). A convocação para reservistas foi anunciada nos cartórios de registro e alistamento militar. Reservista durante atividades de descontaminação.
Acervos históricos sobre o acidente de Chernobyl da Sociedade Ucraniana para Amizade e Relações Culturais com Países Estrangeiros (USFCRFC). A convocação para reservistas foi anunciada nos cartórios de registro e alistamento militar. Reservista durante atividades de descontaminação. (USFCRFC/IAEA Imagebank/Reprodução)
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Na madrugada de 26 de abril de 1986, uma explosão no reator 4 da usina nuclear de Chernobyl, na antiga União Soviética, provocou o maior acidente da história da indústria nuclear até hoje. Os efeitos perduram na região de Pripyat, atualmente cidade fantasma na Ucrânia, local do acontecimento, mas o que muita gente não sabe é que até mesmo os brasileiros foram expostos à radiação de Chernobyl naquele ano.

Explicamos melhor. Durante um teste de segurança na usina, a liberação descontrolada de energia causou um incêndio que durou duas semanas e lançou nuvens de material radioativo sobre grande parte da Europa, com impacto inicial na população, solo e recursos hídricos da Bielorrússia, Rússia e Ucrânia.

A história costuma parar por aí, mas um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP) intitulado “Radiação: efeitos e fontes” mostra que o tamanho da explosão, do incêndio e o comportamento do vento fez com que a radiação se espalhasse para muito além do esperado, afetando outras regiões do planeta – incluindo o Brasil.

+ Chernobyl: livro, vídeo, fotos e textos para entender o acidente

O que foi liberado no acidente de Chernobyl?

A radiação liberada em Chernobyl era ionizante, um tipo de energia que pode causar alterações nas células humanas, aumentando o risco de doenças como o câncer. Os principais elementos radioativos liberados foram:

  • Iodo-131: rapidamente absorvido pela glândula tireoide, especialmente em crianças. Tem meia-vida de 8 dias. Esse foi o elemento responsável por milhares de casos de câncer de tireoide nas décadas seguintes ao acidente, especialmente na Ucrânia, Rússia e Bielorrússia.
  • Césio-134 e Césio-137: com meias-vidas mais longas (2 e 30 anos, respectivamente), continuam presentes no meio ambiente por décadas.
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Esses elementos podem ser absorvidos por meio da ingestão de alimentos e água contaminados ou pela inalação de partículas no ar. No caso do acidente em Chernobyl, mesmo que a exposição em países distantes tenha sido baixa, ainda assim contribuiu para a dose total de radiação que o corpo humano acumula ao longo da vida.

+ A produção de energia no Brasil e no mundo, em 4 gráficos

Como a radiação se espalhou pelo mundo?

O livro “Reflections on the Fukushima Daiichi Nuclear Accident” (Reflexões sobre o acidente nuclear de Fukushima Daiichi), produzido pela Universidade da Califórnia, explica que todos os seres humanos convivem com radiação diariamente.

A média global de exposição à radiação, calculada pela última vez em 2016, é de aproximadamente 3,1 milisieverts (mSv) por ano. Mas outras variáveis entram na conta, a depender da região habitada. Viver a 3.000 metros de altitude, por exemplo, pode representar até cinco vezes mais exposição à radiação cósmica do que viver ao nível do mar. Essa exposição vem de fontes naturais como os raios cósmicos (vindos do espaço), minerais presentes no solo e até elementos radioativos existentes no próprio corpo.

Tomando como base a média global, cerca de 2,4 mSv da radiação vêm de fontes naturais, e os 0,7 mSv restantes se dividem entre fontes artificiais, como exames médicos ou acidentes.

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Acontece que a explosão em Chernobyl não foi um acidente qualquer.

De acordo com o Comitê Científico das Nações Unidas sobre os Efeitos da Radiação Atômica (UNSCEAR) em seu relatório que saiu um ano após o ocorrido em Chernobyl, houve uma dose anual adicional de 25 mSv para toda a população do mundo. O método de cálculo para cada região do globo levou em conta a distância da usina e fatores como o padrão de ventos e precipitação nos dias seguintes ao acidente, assim como dados de 34 países.

Gráfico da UNSCEAR traduzido sobre a dose de radiação de Chernobyl em diferentes regiões do mundo.
Gráfico da UNSCEAR traduzido sobre a dose de radiação de Chernobyl em diferentes regiões do mundo. (UNSCEAR/Reprodução)

A UNSCEAR sempre expressou o risco de exposição maior a radiação através explosões nucleares do que de radiação natural de fundo em seus relatórios a partir de 1964. Até 1972, o Comitê havia calculado doses per capita ou compromissos de dose para toda a população mundial, avaliando uma dose coletiva de cada fonte.

A estimativa da dose de radiação de fundo natural aumentou de menos de 100 mrad (correspondendo a cerca de 1 mSv) ao ano no relatório de 1977, para 2,4 mSv no relatório de 1988, após o acidente de Chernobyl.

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Ou seja, os resíduos tóxicos da explosão contaminaram de tal forma o mundo que a radiação de fundo natural tornou-se mais elevada.

+ Como a descoberta da radioatividade mudou o mundo

A história de Chernobyl

A usina de Chernobyl foi inaugurada em 1977 para suprir a demanda de energia elétrica na Ucrânia. No fatídico dia do acidente, os operadores da central realizaram um teste para checar como o reator funcionaria com baixo nível de energia. Devido a uma falha no projeto e a erros operacionais, o nível de energia caiu demais, e o sistema de resfriamento parou de funcionar. Com o superaquecimento, o reator explodiu.

Somente no dia seguinte, as autoridades da URSS decidiram comunicar o acidente aos 50 mil habitantes da cidade de Pripyat, situada a apenas 3 quilômetros da central nuclear. Quando começaram a ser retirados da área, já haviam ficado expostos durante 36 horas a altas doses de radiação.

Apenas quando os funcionários da usina de Forsmark, na Suécia, descobriram que a radiação que estava chegando até lá vinha de Chernobyl é que o governo soviético admitiu o fato e intensificou a força-tarefa para lidar com a situação.

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Há uma grande controvérsia em relação ao número de vítimas. A explosão no reator matou dois funcionários. Em um período de três meses após o desastre, outras 29 pessoas que trabalharam na operação morreram devido à exposição direta à radiação – nas primeiras horas depois do acidente, bombeiros e equipe de socorro trabalhavam sem trajes adequados para lidar com a situação.

O número de mortos em decorrência do acidente em Chernobyl, contudo, é infinitamente maior. Como os problemas de saúde causados pela radiação se manifestam a longo prazo, é difícil estabelecer o número exato de vítimas fatais. Um relatório divulgado pelas Nações Unidas em 2005 aponta para a morte de cerca de 4 mil pessoas.

A organização ambientalista Greenpeace contesta esses dados e estima em cerca de 100 mil as vítimas fatais do desastre. A diferença se deve à dificuldade em precisar quantos casos de óbitos por câncer – especialmente de tireoide e leucemia – podem ser creditados à exposição à radiação da usina de Chernobyl.

Além disso, o impacto da contaminação nuclear sobre a saúde mental da população foi muito alto. Registram-se casos de depressão, alcoolismo e suicídios em número elevado. Mas não é só a exposição direta à radiação que afetou a população. Como o solo também foi afetado pelo material tóxico, durante anos as pessoas foram contaminadas pela ingestão de carne, leite e verduras produzidos na região.

+ Os mistérios e tragédias de Chernobyl e outros acidentes nucleares

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