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Por que Machado de Assis não usou seu nome verdadeiro nessa obra polêmica

Um trecho de "História de Quinze Dias" foi citada pelo ministro Alexandre de Moraes em julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro

Por Luccas Diaz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
8 ago 2025, 15h00
Imagem mostra o escritor Machado de Assis
Machado de Assis (Wikimedia Commons/Guia do Estudante/Reprodução)
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O ano era 1876 e uma nova coluna chamava a atenção na recém-lançada revista Ilustração Brasileira. A publicação dos irmãos Henrique e Carlos Fleiuss propunha um jornalismo literário, misturando ilustrações e obras de arte com textos que refletiam acerca da sociedade da época. Entre as crônicas, a coluna fixa “Histórias de quinze dias” apresentava textos sobre política, cultura e modos, com muita ironia e sagacidade.

O nome do autor, um tal de Manassés, passava despercebido pela maior parte dos leitores. Mal sabiam eles que se tratava de um dos maiores escritores da literatura brasileira. Manassés era pseudônimo de ninguém mais, ninguém menos que Machado de Assis.

“História de quinze dias” voltou aos holofotes após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, usar uma citação de um dos textos da coluna para impor medidas cautelares ao ex-presidente Jair Bolsonaro. “A soberania nacional é a coisa mais bela do mundo”, citou o ministro.

No século 19, a escolha de Machado por assinar com o pseudônimo não foi à toa. Ao longo da carreira, o autor se disfarçou sob outros nomes para discorrer acerca de temas polêmicos, que poderiam causar alguma retaliação da elite intelectual carioca. Estamos falando de um Machado ainda em ascensão, alguns anos antes da publicação de “Dom Casmurro” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas“. Além de Manassés, escreveu como Dr. Semana, Boas Noites, Victor de Paula, João das Regras, Lélio e Sileno

Opiniões sem filtro

Entre 1º de julho de 1876 e 1º de janeiro de 1878, Machado escreveu 37 colaborações para a Ilutração Brasileira sob o nome de Manassés, abordando de tudo: o fim da escravidão (“De interesse geral é o fundo da emancipação, pelo qual se acham libertados em alguns municípios 230 escravos…”); o consumo de carne bovina (“”O boi, substantivo masculino, com que nós acudimos às urgências do estômago, pai do rosbife, rival da garoupa, entre pacífico e filantrópico, não é justo que viva… isto é, que morra obscuramente nos matadouros”); o direito das mulheres ao voto; a defesa dos prostíbulos (“Ora, se há também um amor ortodoxo, um amor do Estado, há outros amores dissidentes; daí a necessidade de se tolerarem as tais casas e regulá-las”); a inauguração dos bondes de Santa Teresa; uma nova regra que proibia a queima de fogos de artifício; e até mesmo o calor do Rio de Janeiro (“demônio do fevereiro, mês inventado pelo diabo”).

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Quando a revista mudou para o formato mensal, a coluna virou “História de trinta dias”, com mais 3 novas crônicas, somando 40 publicações no total. Todas hoje disponibilizadas em domínio público.

Os muito nomes de Machado

Foi na imprensa, nas crônicas publicadas com pseudônimos, que Machado de Assis exibiu sua face mais ousada. Publicar sob nomes fictícios lhe deu a liberdade para atacar, ironizar e, sobretudo, se proteger das muitas reações possíveis de uma elite sensível ao menor sinal de crítica. O autor — que era um homem negro e funcionário público, vale lembrar — utilizava esses outros nomes como uma forma de escudo. Era o escritor, mas também o observador oculto.

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A prática era bastante comum entre os escritores e jornalistas do século 19, tanto por opções de estilo quanto por estratégia. O ‘Bruxo do Velho Cosme’ usava desses textos não assinados para comentar costumes, fazer críticas mais incisivas e apontar contradições da sociedade sem despertar polêmicas. Durante o período de publicação da coluna “Histórias de quinze dias”, o país está mergulhado em crises políticas e sociais causadas pelo declínio da escravidão e o início dos debates sobre a democracia, cidadania e soberania nacional.

“Em julho de 1876, pouco depois de completar 37 anos, Machado de Assis assumia mais um desafio literário: a redação de uma série de crônicas quinzenais, para a qual deu o título de “História de quinze dias”. Fazia-o a partir do primeiro número da revista Ilustração Brasileira, elegante novidade que se apresentava naquele mês aos leitores do Rio de Janeiro. Como era costume entre os cronistas do período, não punha seu próprio nome em tais escritos, preferindo assiná-los com um pseudônimo. Em meio às incertezas que marcavam aquela década, tratava de oferecer ao público uma leitura do tempo, organizado na história proposta por sua narrativa quinzenal.”

– Leonardo Affonso de Miranda Pereira, na introdução da edição da editora Unicamp.

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