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“Quarup” – Análise da obra de Antônio Callado

Entenda os principais aspectos da obra

Por Redação do Guia do Estudante
Atualizado em 12 abr 2018, 15h35 - Publicado em 17 set 2012, 00h54

Considerado pela crítica uma das obras mais representativas do Brasil após a instauração do Regime Militar, Quarup retrata através seu protagonista Nando, o retrato de um país em conflito.

– Leia o resumo de Quarup

Um recomeço para o Brasil
Pertencente ao terceiro momento do Modernismo no Brasil, “Quarup” é uma obra que mostra quase que didaticamente a dura realidade brasileira do período que vai do suicídio de Getúlio Vargas ao começo dos “anos de chumbo” com o golpe militar em 1964. Porém, apesar de tratar cronologicamente e com certo realismo e objetividade os dados narrador, o autor utiliza muitas metáforas e constrói o livro como uma alegoria, aproximando a obra de um romance fantástico.

Obra representativa da literatura engajada dos anos 1960, “Quarup” trata de temas diversos, tais como o surgimento dos sindicatos rurais no Brasil, o começo dos movimentos populares e discussões sobre a influência estrangeira no país. Assim como outras obras do período, há uma forte crítica ao regime militar vigente.

A personagem principal, padre Nando, começa a narrativa como um homem extremamente engajado nos dogmas da igreja e tem como sonho reconstruir o Brasil a partir de seu “centro geográfico”. Suas ideias buscam origem na República dos Guaranis, uma comunidade criada pelos jesuítas no Rio Grande do Sul no século XVII. Para ele, somente a pureza dos índios poderia resgatar os valores morais para fundar um novo começo histórico para o Brasil. Encarcerado dentro do mosteiro, padre Nando é um símbolo da alienação da igreja, que desconhece a dura realidade dos trabalhadores.

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Porém, conforme vai passando por diversas cidades e situações, Nando começa a sofrer uma transformação em seu modo de pensar e entender seu país. Essa transformação reflete as próprias mudanças que o Brasil sofreu ao longo de sua história. Assim, a trajetória de Nando pode ser entendida como uma alegoria ao processo de amadurecimento por que passa o Brasil. Após abandonar o sacerdócio e se entregar ao sexo e às drogas, Nando volta a seu estado de origem, o Pernambuco, desiludido de seu projeto inicial, e junta-se à luta armada no sertão.

Essa volta às origens para poder recomeçar uma nova vida encontra eco no próprio título do romance. “Quarup” é um antigo rito dos índios do Xingu em homenagem aos mortos. Por meio de um rito de ressureição, celebra-se o eterno ciclo da vida. Assim, o “quarup” do qual Nando participa, funciona como um rito de passagem para uma nova vida, tanto do próprio Nando, quanto do Brasil.

Chegando no Rio de Janeiro, Nando passa a ter contato com a alienada burguesia e suas festas regadas à éter e álcool. No meio de seus delírios causados pela droga, Nando quase se esquece da realidade e dá a impressão de que abandonará seu projeto. Porém, ele é salvo por Otávio, que representa a seriedade do movimento comunista daquela época. É ele que devolve a Nando o senso de responsabilidade e engajamento político.

Ao ir para o Xingu, Nando idealiza uma nação onde as diferenças entre o campo e a cidade pudessem ser resolvidas e superadas. A medida em que ele vai amadurecendo e construindo sua nova identidade, Nando vislumbra uma nação onde as lutas de classes, os problemas entre trabalhadores rurais e latifundiários, invasão de terras indígenas e outras questões pudessem ser resolvidas. E assim, para que seu plano de um novo Brasil pudesse ser alcançado, Nando vai se envolvendo cada vez mais nas lutas sociais e ternando-se um verdadeiro revolucionário.

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Ao tornar-se um guerrilheiro no final do livro, Nando traduz o momento em que o Brasil passava: se por um lado os militares tentavam impor o silêncio através da força, por outro os intelectuais tentavam se unir e a esquerda pressionava o início de uma luta armada. Assim, mostra-se na figura engajada de Nando o símbolo de um povo que consegue superar a inação e iniciar sua jornada rumo a um novo país.

Foco narrativo
O romance é narrado em terceira pessoa e o narrador é onisciente, ou seja, ele conhece todos os pensamentos e sentimentos das personagens e os revela ao leitor. A característica principal da onisciência é que o narrador sempre descreverá a narrativa, mesmo em uma cena, da forma como ele a vê, e não como suas personagens a veem. Há o emprego em algumas passagens do discurso indireto livre, onde a voz do narrador em terceira pessoa se confunde com a voz/pensamento de alguma personagem.

Tempo
O romance segue o tempo cronológico e abrange um período de dez anos da história recente do Brasil. A narrativa começa com o governo do presidente Getúlio Vargas na década de 1950 e termina logo após a deposição do presidente João Goulart, após o golpe militar de 1964, que instaura a ditadura militar no país.

Comentário do professor
O professor Deco Duarte do Colégio Gregor Mendes comenta a obra:
Para se entender “Quarup”, de Antonio Callado, é necessário resgatar o período da ditadura militar no Brasil, implantada em 1964. O livro narra a história de Nando, que, de padre, transforma-se em um guerrilheiro que lutará contra os militares. A trama se inicia no final dos anos 1950, tendo como cenário Pernambuco, local onde o protagonista desenvolve uma atividade sacerdotal afastada dos reais problemas da sociedade, enclausurando-se em um “ossuário” — metáfora da alienação social. Com planos de ir ao Xingu catequizar os índios, Nando se mostra um personagem fraco, inseguro e incapaz de realizar sua missão evangelizadora. Tudo começa, entretanto, a mudar quando entram em sua vida personagens como Levindo, Francisca e o casal inglês Leslie e Winifred. Estes serão os responsáveis pela sua inserção no drama dos trabalhadores rurais bem como pela descoberta do amor e do sexo.

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“Quarup” é um típico romance de formação e de viagem, no qual Nando amadurecerá gradativamente até atingir um nível de consciência acerca das reais necessidades do povo brasileiro. E, como em toda trajetória de vida, não faltarão erros e acertos. Após a perda de seus medos relacionados à ida ao Xingu, ele chegará ao mundo dos índios e poderá ver a situação de vida desses povos, percebendo como a religião em nada melhoraria aquela realidade. Nando então se livra da batina e parte para uma vida em contato com os índios e dentro das suas reais necessidades. Mais tarde, volta a Pernambuco, pouco antes de explodir o golpe e mais uma vez o país, que começava a esboçar um quadro de esperança, volta aos rumos da incerteza e da desilusão. “Quarup”, como diz o autor, Antonio Callado, foi uma tentativa de se entender o Brasil, um país tão complexo, ainda com índios e com problemas de posse de terra, tendo uma classe dirigente fútil e alheia aos problemas de seu povo, como simboliza o personagem Ramiro, por exemplo. Uma minienciclopédia do Brasil de meados do século XX.

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