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Aluna mil na redação do Enem é contra modelos prontos e diz que feminismo ajudou a alcançar a nota

"É triste que muitos homens não sabiam falar do assunto", lamenta Ana Luiza, aprovada em Direito na UFRJ

Por Taís Ilhéu
Atualizado em 11 set 2024, 19h02 - Publicado em 11 set 2024, 19h00
a estudaante ana luiza
 (Arquivo Pessoal/Reprodução)
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Basta ler a redação que Ana Luiza Teodoro Coutinho Loureiro, de 19 anos, escreveu no Enem 2023 para logo perceber que a estudante deixou ali sua marca. Longe de citar pensadores que figuram nas listas de citações coringas, a jovem escolheu referenciar uma obra de sua escritora preferida, Clarice Lispector. Ao longo do texto, também emprestou as reflexões de um pensador contemporâneo, o sul-coreano Byung Chul-Han. “As pessoas me veem muito na minha redação, e eu também me vejo”, conta a estudante, que hoje cursa direito na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

O resultado não poderia ser outro: Ana conquistou a nota mil na redação, e aponta o caminho das pedras para os candidatos que farão a prova deste ano. “Tenta usar um filme que você gosta, uma série que você gosta, porque um dos critérios para o mil é a originalidade”.

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Em entrevista ao GUIA DO ESTUDANTE, a jovem do Rio de Janeiro também destacou a importância de estar próximo dos debates sociais. Segundo ela, o contato com o feminismo foi essencial para que desenvolvesse bem sua argumentação na redação. “É muito triste porque um tema tão importante quanto o trabalho doméstico e muitos homens não sabiam falar sobre o assunto”, reflete, “demonstra que esses homens não têm consciência social nenhuma”.

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Sem cópia

Se você é vestibulando e costuma procurar dicas de estudo no TikTok, certamente já se deparou com vídeos mostrando modelos de redação, prontinhos para serem “printados” e reproduzidos na íntegra. “É só mudar a frase-tema e fazer os ajustes”, prometem os TikTokers – alguns deles, autores dos textos. Muita gente até consegue uma boa nota com a estratégia, mas está longe de ser o caso da Ana Luiza. “Acho que todo mundo é capaz de fazer uma redação do seu jeito, do seu estilo”, opina a estudante, que se dedicou à prática da dissertação desde o primeiro ano do Ensino Médio. “Acho que a gente tem que confiar mais na gente, confiar mais nos nossos gostos, nem tudo precisa ser erudito”, destaca, incentivando que os jovens recorram às séries, filmes e livros que costumam consumir.

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No seu próprio caso, a jovem acabou citando um conto do livro “Laços de Família”, de Clarice Lispector. Além de sua escritora preferida, também referenciou a feminista Simone de Beauvoir e o sociólogo Byung Chul-Han. “Foi um autor que eu aprendi na escola, em sociologia, e foi um livro que eu acabei comprando para ler, porque me interessei muito”, relata, destacando que sempre teve muito gosto pela leitura.

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Uma mentalidade social

Ana Luiza na Faculdade de Direito da UFRJ
Ana Luiza na Faculdade de Direito da UFRJ (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Em 2022, um ano antes de ser aprovada, Ana chegou muito perto do mil: fez 980 pontos. Isso a estimulou ainda mais, e seguiu praticando. Ela conta que não havia feito nenhum simulado com o tema específico do ano passado, os “desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”. Mas nem por isso se desesperou: quando viu o tema, na verdade, sentiu que lhe era muito familiar.

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“É um tema que eu sempre gostei de estudar mesmo, por conta própria”, contou ao GUIA, “sempre gostei de ler livros sobre feminismo”. Para além da pauta das mulheres, a jovem enfatiza a importância de estar inteirado de outros temas sociais, já que o Enem é uma prova interdisciplinar e que cobra que o estudante esteja a par dos vários contextos sociais do Brasil. “É muito importante até como sociedade a gente estar ligado a esses temas”, finaliza.

Leia a redação nota mil de Ana Luiza:

espelho redação ana luiza
(Inep/Reprodução)

Um dos contos presentes no livro “Laços de Família”, de Clarice Lispector, acompanha a epifania da personagem Ana ao fugir de seus afazeres domésticos. Ela, que se via sentenciada a cuidar da casa e dos filhos, assemelha-se a muitas mulheres brasileiras, que exercem essa e outras tarefas diariamente, sem valorização e, até mesmo, sem remuneração. Nesse sentido, cabe analisar as causas socioeconômicas da invisibilidade do trabalho de cuidado no Brasil contemporâneo.

Em primeira perspectiva, a sociedade limita a mulher e sua função social ao ambiente caseiro e à realização de cuidados especiais. Isso ocorre porque, de acordo com o corpo social estabelecido, a essência cuidadosa é algo inerente ao feminino, muitas vezes associada à maternidade. Todavia, essa característica é construída e imposta às mulheres, que são frequentemente moldadas — assim como elucidado por Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher, torna-se”. Esse cenário é instigado pela cultura patriarcal e machista da nação, que atribui o cuidado e o lar somente ao sexo feminino. Desse modo, esse trabalho é visto como uma obrigação da mulher, e não como um trabalho de fato, o que, por conseguinte, gera a desvalorização de tão importante exercício.

Ademais, o cuidado não é percebido com valor de mercado. Isso, porque não é uma atividade altamente lucrativa e produtiva, do ponto de vista mercadológico, o que, segundo Byung Chul-Han em “A Sociedade do cansaço”, são fatores valorizados nos dias atuais. Esse panorama se dá pela lógica capitalista que norteia as relações de trabalho no mundo hoje, priorizando o lucro de indústrias e empresas em detrimento do cuidado com pessoas — majoritariamente exercido por mulheres. Consequentemente, há a má remuneração dessa ocupação, o que afeta a igualdade de gênero na inserção no mercado de trabalho e atrapalha a emancipação feminina.

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Portanto, fazem-se evidentes as matrizes da invisibilidade do trabalho de cuidado em solo nacional. Logo, não se deve hesitar: são necessárias medidas para a erradicação da problemática. É responsabilidade, então, do Ministério da Educação — órgão federal que gere o ensino brasileiro — alterar a estrutura machista e patriarcal nas salas de aula. Isso pode ser feito por meio da inserção na Base Nacional Comum Curricular de formas de empoderamento feminino como assunto obrigatório na formação cidadã. Essa mudança deve ser alcançada com a finalidade de valorizar o trabalho exercido por mulheres, principalmente os mais invisíveis, como o de cuidado. Outrossim, cabe ao Governo Federal aumentar o salário mínimo atual, com o objetivo de garantir uma remuneração adequada a todos, bem como às mulheres, que se ocupam com o cuidado, favorecendo suas independências financeiras. Quem sabe, assim, todas as “Anas” que cuidam do Brasil tornar-se-ão visíveis, valorizadas e prestigiadas.

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Aluna mil na redação do Enem é contra modelos prontos e diz que feminismo ajudou a alcançar a nota
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