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Como entrei em uma universidade de Portugal usando o Enem

Isabella Fernandes conta sua experiência cursando Engenharia Civil na Universidade do Porto

Por Luccas Diaz
Atualizado em 3 Maio 2021, 12h41 - Publicado em 9 abr 2021, 18h42
Mulher usando máscara de proteção é fotografada sentada em um gramado ensolarado. Do ângulo da foto, apenas vemos ela, no que parece uma conversa com amigos, e o ombro de outra pessoa.
Isabella conta que durante a pandemia a universidade adiou as provas presenciais e assumiu aulas online. (Isabella Fernandes/Arquivo Pessoal/Reprodução)
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Estudar fora do país é o sonho de muitos estudantes. Universidades renomadas, oportunidades de emprego e a experiência de conhecer outra cultura são todos aspectos que encantam estudantes brasileiros. Não é a toa que, segundo relatório da Open Doors de 2019, o Brasil é o 9° país que mais envia jovens para estudar fora. Se você é daqueles que fica desanimado achando que isso é apenas um sonho distante em tempos de pandemia, o GUIA traz uma história hoje que pode te inspirar.

Isabella Fernandes, 20, nasceu em São Paulo (SP). Ela está estudando Engenharia Civil na Universidade do Porto, em Portugal. Ela conta como foi o processo de adaptação e como entrou na faculdade usando a nota do Enem.

Como ela entrou?

Mulher posa no meio da rua, em centro turístico de Portugal. Com um semblante feliz, ela usa roupas pretas e uma mochila. Na calçada, pessoas passam.
Isabella usou a nota do Enem para ingressar no curso de Engenharia Civil, na Universidade do Porto. (Isabella Fernandes/Arquivo Pessoal/Reprodução)

Você pode ficar surpreso com a notícia, mas o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não é aceito apenas em universidades brasileiras. O exame pode ser utilizado como forma de ingresso (parcial ou integral) em universidades de Portugal, dos Estados Unidos, da França, do Canadá e do Reino Unido. E foi isso que a Isabella fez!

“Quando eu estava no Ensino Médio, eu decidi que queria algum curso relacionado a exatas. Eu sempre me interessei pela área de construção, de projetos, de sustentabilidade e, depois de pesquisar bastante, eu decidi que queria Engenharia Civil”, conta Isabella.

Sobre fazer o curso fora do país, a jovem diz que desde cedo recebeu o incentivo dos pais, mas que depois de uma desilusão que sofreu após descobrir os custos de uma faculdade na Espanha, tinha desistido do sonho. “Quando eu estava no terceiro ano do Ensino Médio, minha mãe começou a conversar de novo comigo sobre eu fazer alguma faculdade fora. Mas eu já tinha descartado essa possibilidade quando eu vi os preços de estudar em Madrid, então no último ano eu só foquei nos vestibulares nacionais e no Enem mesmo”, conta.

O que ela não esperava era que o Enem também servia para universidades internacionais. Seguindo o conselho dos pais, se candidatou para uma vaga na Universidade do Porto, em Portugal. “Eu comecei a pesquisar e vi que o curso de Engenharia lá era muito renomado e que eles aceitavam a nota do Enem. Fiz minha candidatura de última hora, no dia 28 de janeiro de 2019, faltando apenas dois dias para acabar o prazo. Nem pesquisei muito, nem vi nota de corte, só me apliquei, mandei os documentos e pensei ‘seja o que Deus quiser’”, explica.

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A estudante confessa que não deu muita atenção para a candidatura e que quando os resultados dos vestibulares tradicionais que tinha prestado foram saindo, ela ficou chateada que não havia passado em nenhuma que queria. “Eu até cheguei a passar em Engenharia dos Materiais na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mas vi que era muito improvável conseguir uma transferência para Civil. Depois de pensar e conversar muito com os meus pais, decidi que não iria para Santa Catarina e que faria um ano de cursinho”, conta.

Quando foi se matricular no cursinho, Isabella recebeu a notícia de que não havia mais vagas disponíveis para a turma de exatas. “Parecia que meu mundo tinha desabado. Eu não tinha passado onde eu queria, não ia para a USFC e agora o cursinho não tinha mais vaga. Eu saí de lá chorando horrores, fiquei com muita raiva. Eu estava desesperada”, lembra a jovem.

No mesmo dia, Isabella se encontrou com amigos para almoçar quando recebeu a ligação de sua mãe. “Você passou, você passou!”, ela falou chorando. “Eu não estava entendendo. Então ela disse: ‘Você passou na Universidade do Porto, em Portugal!’”.

Do momento em que Isabella se candidatou para a vaga até o dia em que ela desembarcou no aeroporto de Portugal foram exatos sete meses.

Como usar a nota do Enem?

Em Portugal, só é possível utilizar a nota do Enem se nem você e nem seus pais tiverem cidadania portuguesa. Além disso, o candidato também não pode estar residindo legalmente no país há mais de dois anos. É necessário ter feito a prova do Enem nos últimos três anos e, junto das notas, deve-se enviar uma série de documentos. “Passaporte, histórico escolar, certificado de conclusão do Ensino Médio, uma carta de motivação, uma carta de recomendação, várias declarações… essa parte foi bem chata, sendo sincera”, ri Isabella.

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Há especificidades para cada universidade e cada curso, claro No caso de Isabella, para o curso de Engenharia Civil no Porto, sua nota no Enem deveria ser, no mínimo, 600 na prova de Matemática, 600 em Ciências da Natureza e 475 nas áreas restantes. “Essas notas não significam que você irá passar na faculdade, mas, sim, que você que você pode se candidatar para a vaga”, explica.

Os interessados devem pesquisar nos sites das universidades que deseja como é o processo, os prazos e as notas de corte. Universidades internacionais não participam do Sistema de Seleção Unificada (SiSU).

Como é o curso?

Jovens posam no letreiro da Universidade do Porto, em frente a um dos prédios principais da instituição.
Isabella e amigos posam em frente a Universidade do Porto. A instituição é reconhecida pelo grande número de estudantes estrangeiros. (Isabella Fernandes/Arquivo Pessoal/Reprodução)

A graduação de Isabella segue um formato um pouco diferente de uma tradicional brasileira. “Eles chamam aqui de mestrado integrado; é basicamente uma graduação já seguida de um mestrado”, explica. O curso tem duração de 5 anos. No final, a jovem sairá com um diploma de mestre em Engenharia Civil na área que ela escolher se especializar. “A única questão é que, caso eu volte para o Brasil, o meu diploma da graduação é aceito, mas o mestrado não. Será como se eu fosse apenas graduada”, diz.

Isabella conta que os estudantes brasileiros antes de começarem nas aulas regulares têm de fazer um curso de duas semanas de uniformização em matemática. “Os planos de estudos do Brasil e de Portugal são diferentes, então acaba que os portugueses têm algumas matérias durante o Ensino Médio que nós não temos”, esclarece. “O curso foi bom. Eu consegui aprender muita coisa que me ajudou chegar nas aulas normais sem estar tão perdida”, conta.

Depois dessas duas semanas de preparação, começam as aulas regulares e há uma semana com palestras e tours pela faculdade. “No primeiro dia eu fiquei assustada porque o professor falava rápido e a matéria também era nova para mim”, se diverte lembrando. “A infraestrutura que a faculdade oferece é maravilhosa, com laboratórios, equipamentos, enfim”, conclui.

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Como foi a adaptação?

A Universidade do Porto é reconhecida por acolher muitos estudantes estrangeiros. Além disso,  Portugal recebe muitos estudantes brasileiros – segundo as instituições lusitanas, cerca 40% dos alunos imigrantes são do Brasil. “Não é nenhuma novidade para eles ter brasileiros pelo campus”, diz Isabella.

A mãe de Isabella a acompanhou o processo de mudança. “Me sentia em um filme. Essa cidade é linda, me sinto apaixonada por cada canto”, diz. A jovem fez um contrato de seis meses para o aluguel de um quarto em um prédio que era muito procurado por brasileiros, segundo dados de um site de turismo.

“Parecia muito confiável, mas quando cheguei aqui não era muito parecido com as fotos que vi. Acabei ficando para não ter que pagar a multa do contrato. Mas tive vários problemas. Foi uma fase ruim, bem cansativa. Mas agora encontrei um lugar melhor, onde alugo um quarto também e divido o apartamento com mais três amigas”, conta Isabella.

Segurando um contrato nas mãos, mulher tira uma selfie. Ela utiliza uma máscara de proteção e tem um semblante de comemoração.
Isabella comemorou quando conseguiu um quarto melhor para morar na cidade do Porto. (Isabella Fernandes/Arquivo pessoal)

Segundo ela, a universidade até disponibiliza alojamento para os estudantes, mas a maioria das vagas é dedicada aos bolsistas, não sobrando muitos quartos para estudantes estrangeiros. “O pessoal costuma alugar quarto mesmo. Existe a possibilidade de alugar um apartamento, mas os preços aqui são altos. O quarto individual sai mais conta”, esclarece.

Sobre o seu relacionamento com os portugueses, a estudante conta que se sentiu muito acolhida, mas não nega que há, sim, casos de preconceito. “Eu nunca saí na rua e escutei alguém me xingando por ser brasileira – apesar de ter amigos que já passaram por isso”, ela diz. “Aqui, como em todos os lugares, é comum as pessoas utilizarem as redes sociais para espalharem mensagens de ódio. E algumas postagens são direcionadas diretamente aos estudantes brasileiros na universidade.”

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Aprendendo a viver sozinha

Para Isabella, a maior dificuldade não foi a adaptação no país. O maior desafio foi a descoberta da vida adulta. “Além de estudar para a faculdade, que é bem difícil, eu precisei começar a lavar louça, lavar roupa, cozinhar, limpar a casa, pagar as contas…”, diz. A estudante conta que sempre foi muito tímida, mas que a oportunidade a fez ter que aprender a se virar e dar a cara a tapa. “Morar sozinho não é mil maravilhas como todo mundo acha. Sinto muita falta da minha família, dos meus amigos, do meu gato, do meu cachorro…”, confessa.

Ainda assim, ela considera o saldo positivo. “Eu vejo a Isabella de 2019 e me vejo hoje. Percebo a quantidade de coisas que eu aprendi, as experiências que eu vivenciei, o quanto eu amadureci”, relata. “Acho que é o que mais me deixa feliz é ver o quanto eu cresci com tudo isso, as pessoas que conheci, os lugares que visitei”.

Com roupas de frio e touca, mulher posa feliz em meio à neve
Conhecer lugares novos é uma das vantagens que Isabella considera de sua experiência até agora na Europa. (Isabella Fernandes/Arquivo Pessoal/Reprodução)

A universitária ainda conta que em março de 2020, os casos de covid-19 começaram a aumentar em Portugal e a faculdade suspendeu as aulas presenciais. “Eu fiquei assustada e meus pais também. Com medo das fronteiras fecharem, eles acharam melhor eu voltar pro Brasil e ficar lá com eles”, conta. Isabella explica que ficou na casa dos pais, em São Paulo, de março a agosto e durante todo esse período teve aulas online. “A faculdade foi muito atenciosa e apoiou muito todos os estudantes internacionais que quiseram voltar para o seu país durante a pandemia”, afirma.

Para quem também quer estudar fora, Isabella tem um último conselho: “Não tenha medo. Antes de vir para cá, eu sentia medo de tudo: da faculdade, do país, da minha adaptação, se eu iria conseguir fazer amizade”. Para ela, a experiência vale a pena mesmo com todos os obstáculos. “Tenha mente que não vai ser fácil, não vou mentir, mas vai valer muito a pena. Eu sou muito grata por toda a experiência que estou vivendo. Vai fundo!”, termina.

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