Já imaginou não precisar escolher sua carreira agora? Ou ainda ter a opção de cursar por três anos uma grande área para somente depois decidir qual curso deseja seguir? Pois esses são os conceitos que embasam os chamados Bacharelados Interdisciplinares (BIs).
Os BIs são cursos de graduação que permitem uma formação mais ampla e com maior flexibilidade na organização das disciplinas que se deseja cursar. Funciona assim: o aluno faz um ciclo de formação básica numa grande área de conhecimento (curso de ingresso), como Artes, Saúde, Ciência e Tecnologia e Humanidades, entre outras.
Durante o curso, ele estuda conteúdos gerais da área escolhida e de outras também, podendo direcionar seu currículo para um campo específico ou mesmo se aprofundar em várias áreas. Ao término de três anos, ele decide se quer seguir para o mercado de trabalho com o diploma de bacharel na área que escolheu, e atuar como um profissional generalista, ou partir para o segundo ciclo (profissionalizante), com duração demais um a dois anos. Neste caso, ele opta por um outro curso relacionado à grande área que estudou anteriormente. Exemplo: o candidato que fez um BI em Ciências e Humanidades, após concluir os três anos de curso, pode escolher estudar Filosofia, Ciências Econômicas, Políticas Públicas ou Relações Internacionais. Assim, ele conclui o segundo ciclo e recebe um novo diploma.
Origens
O bacharelado interdisciplinar é uma proposta relativamente nova de educação superior. Começou a ser oferecido no Brasil, em 2005, e hoje já são mais de 40 cursos nesse formato ofertados por 19 universidades federais. A Universidade Federal do ABC (UFABC), em Santo André (SP), foi uma das pioneiras na implantação dos BIs no país e hoje só oferece esse tipo de graduação. Segundo José Fernando Queiruga Rey, pró-reitor de graduação da universidade, a ideia partiu de um projeto pedagógico da Academia Brasileira de Ciências, no qual a universidade deveria ser pensada para desenvolver soluções para os problemas da sociedade contemporânea. “O bacharelado interdisciplinar permite que o aluno se aproprie de temas atuais, passeando pelas diversas áreas de conhecimento. Na UFABC, por exemplo, 20% das disciplinas são livres, o que possibilita que o aluno se aprofunde nos temas que mais tem interesse”, explica o pró-reitor.
Por que fazer um BI
Uma das vantagens de cursar um BI é não precisar definir o curso que você vai seguir no momento de ingressar na universidade. “O jovem entra no 1º ano de Ciência e Tecnologia querendo fazer o curso opcional de Engenharia Aeroespacial, por exemplo. No 3º ano do curso, ele já mudou de ideia e quer fazer Engenharia de Gestão. O bacharelado interdisciplinar permite trocar de opção e de forma muita rápida, o que em um bacharelado comum não acontece”, esclarece o pró-reitor Queiruga.
Se, para o aluno, cursar um BI representa uma oportunidade de amadurecer a sua escolha inicial checando com a própria experiência se ela corresponde a sua expectativa, para a instituição o BI tem trazido outro bom resultado: a redução da taxa de evasão. “Diferentemente de um bacharelado tradicional, o aluno não abandona o curso no meio do caminho. O estudante pode mudar de ideia dentro do próprio curso e escolher uma nova área”, explica Wesley Góis, coordenador do BI em Ciência e Tecnologia da UFABC.
O teste do mercado
Embora muitas empresas ainda estranhem alunos que tenham diploma em uma área mais generalista, o mercado de trabalho para os bacharelados interdisciplinares vêm se abrindo nos últimos anos. Segundo os coordenadores dos BIs, as universidades têm recebido uma sinalização positiva das empresas que contratam estudantes com essa formação, e a área que tem mais demanda é a de pesquisa e desenvolvimento. Segundo Milton Júlio de Carvalho Filho, coordenador do curso de Humanidades da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador (BA), “esse perfil mais crítico do aluno facilita a tomada de decisões, e isso é um grande diferencial valorizado pelo mercado”.
O analista de cultural Israel Marques, 24 anos, que cursou o BI em Humanidades na UFBA confirma isso. “O trabalho que exerço no SESC (Serviço Social do Comércio) da Bahia é um exemplo de que o curso abriu portas para mim no mercado de trabalho”, diz.
Após concluir o curso generalista, Israel optou por fazer Estudo das Cidades, o que possibilitou uma análise aprofundada de diversos aspectos da cidade, como saúde, artes, segurança e política. A partir dessa escolha, ele iniciou um mestrado em Desenvolvimento e Gestão Social e começou a atuar na área social e cultural.
Escolha consciente
Outro estudante satisfeito com sua escolha é Leonardo Borges Koslosky, 24 anos, que cursou o BI em Ciência e Tecnologia na UFABC. No início, ele queria fazer engenharia, mas foi o dinamismo do BI que chamou sua atenção e o fez mudar de ideia. “Foi uma oportunidade de vivenciar a multidisciplinaridade em um curso que envolvia engenharia, tendo a possibilidade de estudar matérias que eu tinha interesse, mas não conseguiria facilmente fazer em um curso tradicional”, explica Leonardo. Depois que ele concluiu o BI, escolheu fazer o curso opcional, ou “pós-BI”, como a UFABC o chama, em Engenharia Aeroespacial. “Eu me formo em 2015 nessa área específica, mas já tenho meu diploma em Ciência e Tecnologia. Estudo disciplinas com pessoas que fazem outros cursos, como Engenharia de Energia ou Ambiental, por exemplo. A comunicação entre os alunos flui muito mais e chegamos às soluções de forma muito mais rápida”, avalia. Segundo Leonardo, que atualmente faz estágio no setor de Planejamento e Controle de Manutenção Aeronáutica da Gol Linhas Aéreas, em São Paulo (SP), os alunos têm um sistema de ensino quadrimestral: três quadrimestres com três meses de aula cada, o que faz com que os estudantes tenham mais opções de escolha e de troca de matérias que desejam realizar.
Particularidades
A UFBA oferta bacharelados interdisciplinares nas áreas de Humanidades, Artes, Saúde e Ciência e Tecnologia, e o aluno pode escolher durante o BI o curso de concentração que desejar. Se o estudante cursa Artes, por exemplo, ele pode fazer a área de Estudos Coreográficos durante o BI, o que facilita a interdisciplinaridade e abre mais portas para o estudante. A UFBA tem áreas de concentração com características bem particulares, como Estudo da Subjetividade e do Comportamento Humano, Política e Gestão das Culturas e Estudos Feministas e de Gênero na Contemporaneidade. O coordenador do curso de Humanidades, Milton Júlio de Carvalho Filho, explica que o objetivo é relacionar as mais diversas áreas profissionais e aprofundar o debate. “Os nossos cursos tratam de temas da contemporaneidade, que são de extrema importância para que a sociedade esteja preparada para debater os mais distintos problemas e encontrar soluções para eles”, afirma. Além disso, quando o aluno conclui o BI, ele pode, por meio de um processo seletivo interno, fazer qualquer curso de formação específica dentro da Universidade.
Licenciaturas Interdisciplinares
As licenciaturas interdisciplinares são uma experiência pioneira no Brasil e têm por objetivo formar professores para atuação no ensino fundamental e médio, nas mais diversas áreas como, Linguagens e Códigos, Ciências Humanas e Ciências Naturais. A ideia é a mesma dos BIs: o aluno cursa uma grade comum com disciplinas mais generalistas e em seguida opta por um curso mais específico. Por enquanto, as Universidades que oferecem esses cursos são: Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e Universidade Federal do Cariri (UFCA).
Cursos e instituições
Confira as universidades que oferecem BIs e as opções de cursos que possuem