Interdisciplinaridade é destaque na primeira fase da Unesp 2026
De Charles Darwin a Bob Marley: confira a análise de professores sobre as questões da prova
Neste domingo (2), estudantes que sonham em ingressar na Unesp encararam 90 questões objetivas na primeira fase. No total, 60.760 candidatos compareceram aos seus locais de prova, o que fez com que a edição de 2026 tivesse a menor taxa de abstenção dos últimos sete anos.
A lista de aprovados para a 2ª fase será divulgada no dia 28 de novembro. Enquanto espera o resultado, que tal saber o que professores acharam da primeira etapa?
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Para começar, os especialistas que conversaram com o GUIA DO ESTUDANTE foram unânimes: interdisciplinaridade foi o destaque da edição.
“Em todas as disciplinas, tivemos pelo menos uma, e em alguns casos até mais, questões que relacionavam conhecimentos de diferentes áreas. No caso específico desta edição, essa interdisciplinaridade foi muito positiva”, afirma Viktor Lemos, diretor geral do Curso Anglo.
Segundo o professor, em muitas das questões, não se tratava apenas de abordar um tema de outra disciplina, mas realmente de exigir o domínio de conteúdos de duas ou mais áreas simultaneamente.
Confira abaixo a análise de cada área do conhecimento.
Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
“A prova apresentou uma distribuição equilibrada entre temas clássicos e contemporâneos, preservando o perfil interpretativo característico da Vunesp”, explica Julia Brazil, coordenadora pedagógica do Poliedro Curso.
Os conteúdos abordaram desde a expansão territorial dos Estados Unidos, cristianismo em Roma e feudalismo até discussões decoloniais sobre a contribuição africana para a formação econômica, social e cultural do Brasil. Um destaque foi o esforço do exame em romper com a visão eurocêntrica tradicional, trazendo uma leitura mais plural da história.
O diretor do Anglo também destaca a questão que trazia a capa do álbum Survival, de Bob Marley, lançado em 1979. “Embora o candidato pudesse chegar à resposta correta por eliminação, a questão demandava um conhecimento bastante aprofundado de iconografia, especialmente sobre o tráfico negreiro. Esse é um ponto de atenção, pois não é comum que alunos do Ensino Médio dominem esse tipo de conteúdo com tanta profundidade.”
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Em Filosofia e Sociologia, a cobrança foi sofisticada: autores como Georges Gusdorf e referências à Escola de Frankfurt apareceram em questões que exigiam leitura densa e articulação interdisciplinar entre filosofia, arte e ciência. A prova explorou conexões complexas, como a que uniu arte popular mineira, o projeto RadamBrasil e o sensoriamento remoto.
O modelo do exame favorece candidatos com repertório teórico consistente e capacidade de leitura crítica de textos acadêmicos, evidenciando um perfil seletivo voltado à formação humanística e reflexiva, segundo a coordenadora do Poliedro. Temas sobre História e Filosofia da Ciência (Darwin, Galileu, Kepler) reforçaram a importância da compreensão dos processos de construção do conhecimento.
Já prova de Geografia foi de nível médio para difícil, abordando temas tradicionais como cartografia, solos e geomorfologia, além de tópicos contemporâneos e interdisciplinares, como transgênicos e a relação entre solos e construção civil. Chamou a atenção, contudo, a ausência de questões sobre demografia e geografia urbana.
“Trouxe mapas, charges, estimativas e porcentagens. Foi uma prova bastante interdisciplinar e tivemos questões exigentes, fazendo conexões entre os conteúdos teóricos e situações, acontecimentos do mundo real”, afirma Luis Felipe Valle, professor de geografia e atualidades do Colégio Oficina do Estudante.
Por fim, a parte de História teve um nível de dificuldade médio, mas incluiu questões que exigiam certa interpretação e atenção do candidato. “Foi uma prova tranquila, com temas clássicos, documentos históricos clássicos, nada de muito surpreendente”, diz Victor Rysovas, professor de história do Colégio Oficina do Estudante.
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Ciências da Natureza
Segundo os professores, a prova manteve a tradição da banca: valorização da leitura, da interpretação de textos e da aplicação prática dos conceitos científicos. Com número reduzido de questões, a seleção de temas foi criteriosa e equilibrada, privilegiando conteúdos clássicos e situações contextualizadas.
Em Física, o foco recaiu sobre Eletricidade e Mecânica, áreas historicamente centrais nas provas da Unesp. “Duas questões se destacaram pela complexidade e caráter mais técnico: uma de Óptica e outra de Mecânica. Ainda assim, o nível geral exigiu mais raciocínio interpretativo do que cálculos elaborados”, diz Julia Brazil, do Poliedro.
A coordenadora também destacou a questão 58, que abordou os telescópios galileano e kepleriano dentro do contexto do desenvolvimento da Ciência, um tema de fronteira entre Física, História e Filosofia da Ciência. Essa interdisciplinaridade reforça a tendência da Unesp de explorar o caráter cultural e humano da produção científica.
Nesse contexto, Luiz Filipe Campos Faria, professor de física do Colégio Oficina do Estudante, também destacou uma questão em particular misturava ondulatória e botânica, demandando uma integração do conhecimento por parte do candidato.
Em Biologia, a prova foi muito bem elaborada e moderna, com questões analíticas e temas relevantes, sem foco excessivo em detalhes decorativos, segundo o diretor do Anglo, Viktor Lemos.
“A prova está bem distribuída com questões interdisciplinares com química, além de conceitos de zoologia, ecologia, genética e fisiologia humana, tudo aquilo que os professores sempre reforçam em sala. Além de questões com botânica também”, reforça Giovanni Ferri, professor de biologia do Colégio Oficina do Estudante.
Já a prova de Química trouxe questões dentro do esperado, como cálculo relacionado a pH e termoquímica. “Apesar de ser um tema previsto, a questão de termoquímica foi mais teórica, em que os alunos não precisavam calcular a variação de entalpia, apenas identificar se a reação era endotérmica ou exotérmica. Também caíram cálculos envolvendo quantidade de matéria, como já imaginávamos. O que sentimos falta foi de alguma questão sobre radioatividade, que não apareceu, e também de um exercício mais completo sobre o cálculo de termoquímica”, afirma Kaiki Chaves do Nascimento, professor de química do Colégio Oficina do Estudante.
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Linguagens
Para Vinicius Teixeira, professor de Literatura do Colégio Oficina do Estudante, a prova manteve as características dos anos anteriores na maior parte das questões.
“Foi apresentado um desenho sofisticado, reafirmando a ênfase tradicional da banca na interpretação, análise de discursos e leitura crítica”, explica Julia Brazil, coordenadora pedagógica do Poliedro Curso. A estrutura valorizou a compreensão de diferentes linguagens (verbal, visual e artística), exigindo do candidato sensibilidade para conectar texto, contexto e forma de expressão.
Em Língua Portuguesa e Literatura, o foco esteve na interpretação de textos literários e artísticos. Obras como “Esaú e Jacó”, de Machado de Assis, e a pintura “A Primeira Missa no Brasil”, de Victor Meirelles, ilustraram o compromisso da prova com a interdisciplinaridade entre literatura, arte e história. Essa integração reforçou o caráter interpretativo e a necessidade de leitura aprofundada, indo além da simples identificação de conteúdos.
“Os temas sociais e críticos, como a herança cultural africana, a presença da mulher no mercado de trabalho e a descolonização africana, reiteraram a vocação humanista e engajada da prova”, completou Julia. A abordagem alinhou-se à tendência das últimas edições, privilegiando uma leitura reflexiva sobre identidade, cultura e sociedade.
Para a coordenadora, um ponto de destaque foi a redução das questões de gramática – apenas três nesta edição. Isso confirma a preferência da banca por avaliar competências de leitura, interpretação e análise contextual.
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Viktor Lemos, do Anglo, destaca também a forte interdisciplinaridade da prova. Houve, por exemplo, uma questão que relacionava gramática e figuras de linguagem com progressão aritmética e geométrica da Matemática; outra que unia interpretação de texto com lógica; uma terceira que conectava Literatura e Filosofia; e uma quarta que relacionava Literatura, História e Artes.
“Ao observarmos mais detalhadamente a prova de Português, chama atenção o uso de um romance em quadrinhos nas questões de 1 a 5, algo inédito nas provas da Unesp. Essa escolha contribuiu para torná-la bastante diferente dos anos anteriores, reforçando o caráter interdisciplinar e inovador da prova”, afirma o diretor.
Já prova de Inglês manteve-se fiel ao padrão Vunesp: foco em interpretação textual, compreensão de conectivos e leitura de gêneros variados. As questões exploraram desde textos de divulgação científica ligados à agricultura até uma tirinha clássica de Calvin e Haroldo e um gráfico sobre produção agrícola. O nível de dificuldade foi fácil a médio, segundo os especialistas.
“Tivemos diferentes gêneros textuais, cartazes, tirinhas, reportagens, gráficos, então o aluno precisava ter um conhecimento lexical interessante, principalmente para compreender a reportagem, que era um pouco mais desafiadora”, diz Carlos Alexandre Torres, professor de inglês do Colégio Oficina do Estudante.
Matemática
Por fim, a prova de Matemática manteve a coerência com o perfil tradicional da banca, valorizando raciocínio lógico, interpretação e aplicação de conceitos fundamentais, segundo Julia Brazil, coordenadora pedagógica do Poliedro Curso.
“A estrutura das questões exigiu leitura atenta de enunciados extensos, compreensão de tabelas e domínio dos princípios de proporcionalidade”. De acordo com Julia, o exame apresentou um formato próximo ao do Enem, com predominância de questões contextualizadas e interpretativas, especialmente em porcentagem e funções que foram pilares da prova. Esses temas foram explorados em situações cotidianas e práticas, exigindo que o candidato traduzisse o texto em modelo matemático antes de resolver.
As questões conteudistas mais diretas ficaram concentradas na geometria, mantendo o equilíbrio entre a abordagem conceitual e a aplicação de fórmulas clássicas. A presença de uma questão interdisciplinar envolvendo trigonometria e geografia reforçou a proposta de integrar o raciocínio matemático à leitura de fenômenos reais e representações espaciais.
Em contrapartida, probabilidade e análise combinatória, tradicionalmente presentes nas edições anteriores, estiveram ausentes nesta primeira fase — o que abre espaço para que esses conteúdos ganhem destaque na segunda fase do exame.
“Em síntese, a prova foi consistente, interpretativa e bem calibrada, valorizando candidatos com pensamento lógico estruturado, capacidade de leitura e domínio dos conceitos essenciais da matemática do ensino médio”, completou Julia.
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