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Relação desigual

A lei do feminicídio é um avanço na proteção das mulheres. Mas ainda falta muito para acabar com a desigualdade de gênero

Por Thaís Matos Pinheiro
Atualizado em 16 Maio 2017, 13h51 - Publicado em 26 out 2015, 12h10

Em março de 2015, a presidente Dilma Rousseff – primeira mulher a ocupar o cargo máximo do Executivo no país – sancionou a Lei 13.104, que classifica o feminicídio como um crime hediondo. Feminicídio é o assassinato de mulheres motivado apenas pelo fato de a vítima ser mulher. Um feminicida mata a mulher por ódio e pelo sentimento de posse sobre ela. Pela nova lei, condenados por esse tipo de crime merecem a pena máxima de reclusão (30 anos), não têm direito a indulto (perdão) ou anistia, e nem a responder a processo em liberdade mediante o pagamento de fiança. A lei é considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) um avanço na defesa da mulher, mas apenas um passo entre muitos ainda necessários para eliminar a desigualdade entre os gêneros, que ainda persiste de forma elevada no Brasil.

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Uma entre muitas – Agredida pelo ex-marido, mulher participa de programa de proteção em São Paulo para vítimas de violência / Crédito: RAQUEL CUNHA/FOLHAPRESS

Violência doméstica e sexual
O Brasil ocupa a sétima posição no ranking mundial na taxa de assassinatos de mulheres. Segundo o Mapa da Violência 2012, cerca de 92 mil mulheres foram assassinadas entre 1980 e 2010. E o número mais do que triplicou ao longo das décadas: de cerca de 1,3 mil no ano de 1980 para quase 4,5 mil em 2010. Trata-se de 12 mortes por dia – ou seja, uma mulher foi morta no Brasil a cada duas horas.É preciso notar que nem todos esses homicídios são feminicídios. Mas vários indicadores mostram que essa categoria de crime constitui boa parte dos assassinatos de mulheres. Um desses indícios é o número de casos de assassinato dentro de casa. Dos 4,5 mil homicídios registrados em 2010, 41% ocorreram na residência da vítima. Com ou sem morte, aliás, a violência doméstica e sexual faz mais vítimas entre as mulheres do que entre os homens. Em 2011, o Sistema Único de Saúde (SUS) prestou 107,5 mil atendimentos relativos a violência sexual ou doméstica. Em 65% dos casos, as vítimas eram mulheres. E 72% delas tinham sofrido a violência em casa.O estupro é outra forma brutal e comum de violência contra a mulher. Segundo a organização não governamental Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2013, foram registrados 50,3 mil estupros. No entanto, ela estima que o número real de estupros naquele ano tenha chegado a 143 mil. A razão dessa discrepância é cultural: é comum que mulheres vítimas de violência sexual não apresentem denúncia às autoridades, por sentir constrangimento, medo e culpa.

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Lei Maria da Penha
A lei do feminicídio não é a primeira na proteção da mulher. A Lei Maria da Penha, em vigência desde 2006, considera que, além da violência física e do sexo forçado, são crimes também as agressões psicológicas, como ameaça, constrangimento, humilhação e perseguição. Segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), essa lei fez diminuir em 10% a projeção de aumento da taxa de homicídios domésticos entre 2006 e 2011. O Ipea considera que o bom resultado não se deve apenas ao aumento no rigor das penas, mas também ao aperfeiçoamento dos sistemas judicial e policial. Apenas nos seis primeiros anos de vigência da lei, o número de denúncias pelo telefone 180 cresceu 600%.

Aborto
O Brasil ocupa a 85ª colocação no Índice de Desigualdade de Gênero (IDG), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O IDG adota como parâmetros a saúde reprodutiva, a educação, a inclusão no mercado de trabalho e a participação na vida política do país.

Os direitos à saúde reprodutiva incluem a liberdade da mulher de decidir sobre a realização de aborto. Pela legislação brasileira, a gravidez pode ser interrompida apenas em casos de estupro, risco de morte da gestante ou feto anencéfalo (sem cérebro). O Centro Feminista de Estudos e Assessoria, organização de defesa dos direitos da mulher, estima que, devido a essas restrições, sejam realizados mais de 1 milhão de abortos clandestinos por ano. E, de acordo com o Ministério da Saúde, esses abortos constituem a quinta maior causa de morte entre gestantes.

Trabalho e política
De acordo com o IBGE, o nível de escolaridade da mulher é maior que o do homem em todas as etapas de estudo e todas as faixas etárias. Porém, essa escolaridade não se reflete em boas oportunidades de trabalho e melhores salários. Em 2013, elas recebiam 30% menos que um homem para um mesmo cargo. E elas ainda são maioria em empregos informais e praticamente ausentes em alguns setores da economia (veja boxe ao lado).

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A representatividade política delas também é baixíssima. As mulheres compõem 51% da população brasileira e quase 52% do eleitorado. Mas ocupam apenas 9% das cadeiras da Câmara de Deputados e 16% das do Senado. Assim como ocorre com a disparidade de oportunidades e salários no mercado de trabalho, o fato está associado ao papel tradicional atribuído à mulher: responsável pelos cuidados da família e do lar, elas foram afastadas do espaço público. Em junho de 2015, a Câmara rejeitou a criação de reserva de 15% dos assentos parlamentares para as mulheres.

A discriminação contra a mulher, ou sexismo, é um fenômeno histórico e mundial, que torna as diferenças biológicas entre mulheres e homens determinantes na definição de seu papel social e político. A ciência aponta diversos aspectos da fisiologia e psicologia feminina que divergem entre os gêneros, a começar pelos hormônios que banham o cérebro do menino ou da menina, no útero da mãe. Elas nascem com o cérebro mais desenvolvido, vivem mais tempo, são mais propensas à depressão e enxergam melhor uma situação em um contexto mais amplo, por exemplo. Já eles têm cérebro maior, maior capacidade de se concentrar e são mais competitivos. Essas características distintas que homens e mulheres possuem para enxergar os problemas e se relacionar com o mundo são complementares e essenciais para a diversidade e o equilíbrio das relações sociais.

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