Em conversas sobre a política dos Estados Unidos, é comum ouvir que determinados políticos são republicanos, enquanto outros são democratas. Os dois termos ficam ainda mais em evidência em ano de eleição para presidente, quando os representantes de cada partido são eleitos e disputam a corrida presidencial. Fato é que o sistema eleitoral dos EUA é bem diferente do adotado no Brasil, e a distinção entre os dois partidos vai além da mera concepção de direita versus esquerda.
Compreender a diferença entre os dois principais partidos da política estadunidense é fundamental para entender minimamente as questões centrais do país. Em 2024, ao que tudo indica, o atual presidente Joe Biden, do Partido Democrata, enfrenta o ex-presidente Donald Trump, Republicano, nas eleições de novembro. Entenda, na prática, o que distingue os dois lados dessa disputa.
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Sistema eleitoral complexo
Antes de partir para a diferença entre os dois principais partidos, é preciso entender o roteiro básico do sistema eleitoral norte-americano. Os Estados Unidos, assim como o Brasil, é uma República Federal Presidencialista. É constituído pelo poder executivo (o Presidente), legislativo (o Congresso) e judiciário (os tribunais). A Constituição americana é uma das mais antigas ainda em exercício – considerada, inclusive, a primeira do mundo a ser escrita. Desde sua promulgação, em 1787, passou até hoje por somente vinte e sete emendas.
Assim como em qualquer outra república democrática, o presidente, os senadores e os deputados são eleitos pela população. No entanto, as eleições ocorrem de maneira indireta – ao contrário do que acontece no Brasil. Na corrida presidencial, antes da eleição geral, ocorre uma primária, em que os partidos elegem os seus representantes para o pleito. Essa etapa inicial, que ocorre entre janeiro e junho, pode ser tanto direta (com os votos da população interessada), quanto indireta (com decisão interna do partido). O representante eleito nas eleições primárias de cada partido se torna o candidato oficial para a disputa, anunciado em convenções nacionais, onde os seus vices também são apresentados.
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Após as campanhas eleitorais, acontece, então, a eleição propriamente. Sempre na primeira terça-feira após a primeira segunda-feira de novembro, os eleitores vão às urnas de maneira facultativa (ou seja, não obrigatória), e votam no seu candidato de preferência. No entanto, ao contrário de uma eleição direta, não estão votando somente em candidato X ou Y, mas sim nos membros que compõem o Colégio Eleitoral do estado onde votam – e que vão “votar por eles” na decisão final. Pense neles como “grandes eleitores”, que são afiliados a determinado partidos. Há estados, como a Califórnia, que contam com 55 eleitores (ou delegados), enquanto outros menores, como Wyoming, somente 3. Esse número é calculado de forma proporcional ao tamanho da população do estado. Ao todo, o Colégio Eleitoral é formado por 538 delegados.
Eleitos os membros do Colégio Eleitoral, parte-se para a segunda e última etapa das eleições, marcadas para a segunda-feira após a segunda quarta-feira de dezembro. Os delegados eleitos se reúnem na capital de seus estados e votam para eleger o presidente. Para vencer, o candidato deve ter o voto de 270 delegados, isto é, 50% mais 1 do Colégio Eleitoral. O candidato que vence em cada estado, porém, fica com os votos de todos os delegados dali. Assim, é possível um candidato não receber a maioria dos votos contados, mas ainda assim vencer as eleições e se tornar presidente. Foi o que aconteceu nas eleições que elegeram George W. Bush e Donald Trump, em que seus concorrentes, Al Gore (2000) e Hillary Clinton (2016), respectivamente, receberam mais votos.
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Origens dos dois grandes partidos
Os primeiros partidos políticos nascem já nos anos seguintes à promulgação da Constituição estadunidense. Historicamente, dois deles sempre se destacaram: o Partido Democrata, formado em 1828, e o Partido Republicano, em 1854. Não é que não existam outros partidos, mas o que é visto desde a metade do século 19 é a predominância dos dois no cenário político. Antes disso, houve presidentes que não eram de nenhum dos dois partidos, mas se limitam à primeira dezena de presidentes americanos. De 1869 até hoje, todo presidente americano é Democrata ou Republicano.
As origens dos dois partidos são interligadas e remontam à Independência dos EUA. O Partido Democrata nasce como uma derivação do Partido Democrata-Republicano, fundado por Thomas Jefferson e James Madison. O objetivo era ser uma força oposta ao Partido Federalista de Alexander Hamilton, que propunha um Estado forte e uma economia mercantil – ou seja, promover um Estado mínimo e alinhado aos interesses agrários, sobretudo os do sul do país. A proposta do Partido Democrata tinha um abordagem populista, com o desejo de expandir a democracia ao “homem comum” (que, não custa lembrar, era uma concepção que não incluía mulheres ou minorias raciais), seguindo o ideário de Thomas Jefferson.
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Já o Partido Republicano derivou do Partido Federalista – ao lado de dissidentes do Partido Whig e Democrata –, defendendo o desenvolvimento industrial e os valores do liberalismo econômico, como a propriedade privada e o trabalho livre e assalariado. Dessa forma, promovia uma postura abolicionista e reformista, com maior presença no norte do país.
Essas ideologias se mantiveram durante certo tempo. Os Republicanos dominavam o norte e foram figuras centrais no financiamento de universidades estaduais e na construção de ferrovias – eram expansionistas, por natureza. Por outro lado, os Democratas mantinham suas raízes no sul, promovendo a visão de Thomas Jefferson de uma sociedade agrícola e, consequentemente, escravocrata. As visões opostas entre os dois extremos do país levaram à chamada Guerra Civil (1861-1865), quando os estados do norte (União) e os estados do sul (Confederação) duelaram entre si em nome do fim (ou não) da escravidão, os direitos estaduais e a expansão territorial.
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Inversão de valores
Ao fim da guerra, com a vitória dos estados do norte, a escravidão foi abolida nos Estados Unidos. Mas o fim do conflito trouxe ainda outras mudanças para a economia, a cultura e a política do país – um período conhecido como Reconstrução (1865-1877). Uma dessas mudanças foi o início de uma quase que inversão de valores adotados por cada partido. Já no final do século 19, muitos dos nortistas que empreenderam e lucraram com a guerra, agora eram figuras ricas e influentes que passavam a ingressar o cenário político. Estes novos políticos não viam mais sentido em apoiar a conquista de direitos civis da população negra, uma vez que focavam mais em questões alinhadas à expansão industrial.
A inversão de valores passou a tomar forma na presidência do Republicano Theodore Roosevelt (1901-1909), quando as alas progressista e conservadora do Partido Republicano começaram a se dividir mais claramente. Insatisfeitos, os mais progressistas do Partido Republicano migraram para o Democrata, enquanto os mais conservadores do Partido Democrata migraram para o Republicano. O movimento foi gradualmente construindo a visão atual que temos dos dois partidos.
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Foi durante as décadas de 20 e 30 que a inversão ficou, de fato, mais nítida. Durante a Grande Depressão (1929-1939), o posicionamento de estado mínimo adotado pelo governo Republicano de Herbert Hoover provocou a ira da população americana, que sofria com a fome e a escassez de empregos. Em 1933, o candidato Democrata Franklin D. Roosevelt venceu as eleições com folga, acabando com a onda Republicana no poder e prometendo adotar uma postura oposta a de Hoover.
Destaca-se em seu governo a adoção do New Deal, o programa de recuperação econômica que procurou reverter a crise causada pela queda da bolsa de valores de Nova York. O programa apresentou ampla intervenção estatal, promovendo a regulação das transações econômicas e da produção interna, e a promoção de empregos em obras públicas. Em outras palavras, a inversão de valores dos dois partidos foi cimentada de vez. Roosevelt apresentava uma (bem-sucedida) campanha de intervencionismo estatal de caráter progressista, enquanto os Republicanos, isolados e contrários ao governo de Roosevelt, intensificavam o seu caráter conservador e liberal.
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Os partidos, hoje
Nos anos seguintes, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os movimentos pelos direitos civis (décadas de 50 e 60) e a Guerra Fria (1947-1991) solidificaram o posicionamento dos partidos. Hoje, Partidos Democrata e Partido Republicano defendem quase que o inverso do que originalmente se propuseram.
Com o tempo, Democratas se alinharam cada vez mais aos sindicalistas, adotando pautas referentes aos direitos humanos e preservação ambiental. Firmou-se como um partido que defende, a grosso modo, a criação de programas sociais e alguma intervenção do Estado para garantir o bem-estar dos americanos. É o que podemos chamar de centro-esquerda, embora dentro do próprio partido existam políticos menos ou mais alinhados à esquerda – como o senador Bernie Sanders, filiado aos democratas até 2020.
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Também vale destacar que, embora seja lido como o partido mais progressista, o Democrata também adota medidas controversas para essa parcela do eleitorado. Uma pesquisa do Pew Research Center, por exemplo, mostrou que os latinos não veem diferenças significativas entre os governos democratas e republicanos no que diz respeito aos seus direitos. Além disso, o governo de Joe Biden, atual presidente americano, sofreu contundentes críticas dos jovens eleitores por financiar Israel no conflito contra a Palestina.
Já os Republicanos, se fortificaram como uma força conservadora, nacionalista, defensora do Estado mínimo, do liberalismo econômico e dos valores tradicionais e cristãos. É um partido que tem seu eleitorado majoritariamente branco, e que, ainda que tenha um histórico com a luta pelo fim da escravidão, não costuma incluir minorias em suas medidas. Na teoria, representa a centro-direita, mas tem ganhado destaque pelos políticos alinhados à extrema-direita.
Nos símbolos, os Democratas são representados pela cor azul, enquanto os Republicanos pelo vermelho. Ambos os partidos também tem mascotes animais: Democratas são simbolizadas por um asno, e os Republicanos, um elefante. A origem da escolha dos animais é antiga, mas foi popularizada pelo cartunista Thomas Nast, nas décas de 1870 e 1880.
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