Desde fevereiro deste ano, pesquisadores do mundo todo vêm investigando mais a fundo uma das muitas mutações do Sars Cov-2, o vírus que causa a COVID-19. O vírus com essa mutação (que foi chamada de D614G) chamou mais a atenção do que os outros porque, aparentemente, se espalhava tanto quanto a primeira versão do coronavírus, especialmente naquelas regiões que experimentavam a chamada “segunda onda de contaminação”. Nos meses seguintes, constatou-se que essa nova versão era, na verdade, ainda mais transmissível, o que de pronto causou preocupação nos cientistas. Mais pessoas contaminadas significará mais mortes? Será que as vacinas em desenvolvimento conseguirão prevenir também a infecção por esse mais novo coronavírus?
Um artigo publicado por pesquisadores de Cingapura na revista The Lancet, no final de agosto, veio para acalmar a comunidade científica e, é claro, toda a população. Apesar de ser mais transmissível e, portanto, ter potencial de atingir mais pessoas, o vírus mutante parece ser menos agressivo e letal. E a explicação é uma velha conhecida dos vestibulandos: é tudo uma questão de evolução. Para o vírus, também é vantajoso ser menos agressivo com o hospedeiro, para conseguir permanecer mais tempo com proteção e alimento no corpo humano sem causar a morte do infectado.
Além disso, antes ainda de o estudo ser publicado, o consultor sênior da Universidade Nacional de Cingapura, Paul Tambyah, já havia dito à Reuters que as vacinas em desenvolvimento devem continuar sendo eficazes contra esse vírus alterado, já que “o mutante afeta o elo do peplômero [aquelas pontinhas na superfície do vírus], e não necessariamente o reconhecimento da proteína por parte do sistema imunológico, o que seria preparado pela vacina”. A gente sabe, fica meio difícil entender nesses termos.
Trocando em miúdos, o vírus analisado pelos pesquisadores de Cingapura sofreu uma mutação conhecida como “deleção”, ou seja, perdeu 382 nucleotídeos. A deleção é apenas um dos tipos de mutação possíveis em DNA ou RNA, e, considerando que a biologia molecular e a genética são umas das áreas preferidas dos grandes vestibulares, neste texto ajudamos você a entender quais são essas mutações e como elas funcionam!
Antes, o que são mutações?
Basicamente, mutações são mudanças que acontecem no material genético de seres vivos (conhecido também como genoma), seja durante seus processos de multiplicação (meiose e mitose) ou durante a síntese proteica. As mutações estão diretamente ligadas ao que chamamos de variabilidade genética, que é o que permite aos indivíduos se adaptarem a novos meios e que, a longo prazo, faz com que alguns indivíduos estejam mais aptos a sobreviver, num processo de seleção natural. Em outros casos, porém, as mutações podem gerar problemas que inviabilizam até a vida de um indivíduo.
As mutações podem acontecer tanto em nível molecular (quando afeta um ou vários nucleotídeos que compõem o material genético), em nível cromossômico (em mais de um gene) ou em nível genômico (afetando o total de cromossomos). Quando essas alterações não são “corrigidas” antes de o material genético se replicar, é originada uma nova molécula já com a mutação, e daí em diante todos os novos seres (nesse caso, todos os novos vírus) terão essa alteração genética.
Os tipos de mutação
Além de classificar as mutações pelos níveis em que elas podem ocorrer, como já explicamos, também é possível dividi-las pelos efeitos que elas causam naquele material genético, como a perda ou a repetição de cromossomos, por exemplo. As principais delas são:
- Deleção: Mutação que resulta na perda de cromossomos, seja em partes terminais ou mais internas, da sequência de DNA/RNA. Esse é o tipo de mutação apontada pelos pesquisadores de Cingapura que resultou na nova versão do Sars-Cov-2;
- Duplicação: Para ocorrer esse tipo de mutação, é necessário que a de deleção aconteça antes. Isso porque o pedaço de cromossomo perdido se liga a um outro cromatídeo e forma uma parte extra, nova;
- Inversão: Nessa mutação, uma parte do cromossomo se desliga e volta a se ligar em uma ordem diferente. Essa inversão pode ainda ser subclassificada em pericêntricas, que envolve o centrômero, e paracêntricas, que não o envolvem.
- Translocação: Nesse caso, uma parte do cromossomo se desliga da porção original e se liga a um cromossomo não homólogo (que não faz par e contém genes diferentes). Também pode ser classificada em translocação recíproca (quando os dois cromossomos envolvidos trocam porções), não-recíproca (apenas um transfere uma porção para o outro), além de translocação Robertsoniana – um caso mais complexo em que cromossomos que possuem um braço longo e outro curto (acrocêntricos) trocam esses “braços” entre si, originando um cromossomo de braços longos e outro de curtos.
Não se lembrou de alguns conceitos e termos que abordamos nesse texto? Você pode conferir outras vezes que já falamos aqui no GUIA sobre:
Biologia: Ciclo de vida das células – divisão celular
Resumo de biologia: Divisão celular e conceitos básicos de genética
Há também várias aulas no YouTube sobre mutações genéticas e cromossômicas, entre elas a abaixo, do professor Paulo Jubilut, do canal Biologia Total: