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“Libertinagem”: resumo da obra de Manuel Bandeira

Em versos livres de aparente simplicidade e intensa voltagem poética, o pernambucano trouxe de volta o lirismo para literatura do país

Por Redação do Guia do Estudante
Atualizado em 23 dez 2022, 19h17 - Publicado em 23 dez 2022, 14h34
Escritor Manuel Bandeira
 (Reprodução/Wikimedia Commons)
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Lírico, na acepção original da palavra, é o texto feito em versos para serem recitados com acompanhamento da lira, instrumento musical de cordas, muito difundido na Antiguidade. Por extensão, no sentido atual, um texto lírico é aquele feito para ser musicado, que tem na musicalidade sua característica marcante.

O que Manuel Bandeira fez para a literatura brasileira com Libertinagem, seu primeiro livro realmente modernista, publicado em 1930, foi reinventar o lirismo. De fato, Bandeira tinha o dom da musicalidade, sempre presente em seus escritos, repletos de rimas, assonâncias, aliterações, refrões; um ritmo, enfim, único e envolvente.

Certa feita, Bandeira classificou a si mesmo de “poeta menor” – o que é uma injustiça, uma vez que é considerado um dos melhores criadores de verso livre de nossa literatura, apresentando um domínio impressionante de todas as formas poéticas. Tudo isso lhe possibilitou escrever poemas aparentemente simples, mas de grande densidade, beleza e alcance.

Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho nasceu no Recife, em 19 de abril de 1886. Adolescente, mudou-se para o Rio de Janeiro e estudou no Colégio Pedro 2º. Iniciou em São Paulo o curso de engenharia, mas a tuberculose o impediu de concluí-lo. A fim de curar-se da doença, recebeu tratamento no sanatório de Clavadel, na Suíça, onde teve contato com o melhor da poesia simbolista e pós-simbolista em língua francesa, estilo que influenciou de forma marcante seus primeiros escritos, como Cinza das Horas e Carnaval, lançados em 1917 e 1919, respectivamente.

De volta ao Rio, sua linguagem poética sofreu a transformação que o encaminhou para o modernismo, juntamente com outros escritores da época. Entretanto, Bandeira não participou da Semana de Arte Moderna, por discordar dos veementes ataques ao estilo que o influenciara no início da carreira. Escreveu, na chamada “fase heroica” do modernismo, Ritmo Dissoluto (1924) e Libertinagem, este último composto de 38 poemas, dois deles em francês.

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Em Libertinagem, o poeta atinge plenitude de tema e linguagem, tocando a essência do coloquial com uma simplicidade propositada. A técnica de versos livres está profundamente presente, e a temática esbarra ora na melancolia (Não Sei Dançar), ora na ironia (Pneumotórax), na interiorização de vultos familiares (O Anjo da Guarda), no contexto do dia-a-dia (Poema Tirado de uma Notícia de Jornal), nas paisagens brasileiras (Mangue) e até em suas preocupações estéticas na poesia (Poética). Um pouco de tudo isso está presente no excelente Vou-me Embora pra Pasárgada.

“A poética de Libertinagem mantém-se viva nas obras maduras de Bandeira, onde não raro um ardente sopro amoroso envolve as imagens femininas, deixando-as porém intactas e nimbadas de uma alta e religiosa solitude”, observa o crítico literário Alfredo Bosi, em História Concisa da Literatura Brasileira.

Manuel Bandeira entrou para a Academia Brasileira de Letras em 1940 e morreu em 13 de outubro de 1968, no Rio de Janeiro. Foi sepultado no Mausoléu da Academia, no Cemitério São João Batista.

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Título: Libertinagem
Autor: Manuel Bandeira

Vou-me Embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

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E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d”água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
– Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

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Esse texto faz parte do especial “100 Livros Essenciais da Literatura Brasileira”, publicado em 2009 pela revista Bravo!

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