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Estudante que tirou 980 na redação do Enem se preparava desde o 8º ano

Bruna Figueiredo citou a Semana de Arte Moderna, a historiadora Lilia Schwarcz e a Escola de Frankfurt no texto. Leia aqui a redação na íntegra.

Por Karin Hueck
Atualizado em 15 ago 2023, 16h53 - Publicado em 15 ago 2023, 15h38

“Eu adoro fazer a redação do Enem.” É com essa paixão que Bruna Scali Figueiredo, de 19 anos, conta como tirou 980 na redação da prova do ano passado. De fato, nos anos que antecederam o Enem 2022, Bruna, que é de Teresópolis, cidade na região serrana do Rio de Janeiro, viveu intensamente o mundo da escrita.

Desde o oitavo ano, teve aulas de produção textual na escola particular em que estudava e, embora não tenha feito cursinho para complementar os aprendizados, procurou diversos cursos livres para se aprofundar nas técnicas do texto dissertativo-argumentativo cobrado pela prova. Depois de um tempo, também passou a dar aulas: corrigiu redações de alunos de escola pública, e deu aula de português e gramática para refugiados.

+ Guia prático: Um passo a passo para fazer sua redação do Enem

Tanta dedicação acabou rendendo frutos. No 2o. ano do Ensino Médio, quando prestou o Enem como treineira, tirou 940 no texto. No ano seguinte, vieram os 980 pontos que lhe garantiram o segundo lugar no curso de Economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ. Além da federal carioca, a estudante também foi aprovada em Economia na Unifesp e em Marketing na USP.

Com o tema “Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil“, Bruna caprichou nas referências e repertórios socioculturais no texto. Citou a Semana de Arte Moderna de 22, a Escola de Frankfurt e a historiadora Lilia Schwarcz. Não à toa, levou a nota máxima na Competência 2, que analisa a aplicação de conceitos de várias áreas do conhecimento. Foi na competência 3 – que avalia a seleção e organização de opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista – que ficaram faltando os 20 pontinhos para a nota máxima.

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Para quem está prestando o Enem este ano, Bruna tem uma dica valiosa. “A gente tem que estar preparada para lidar com o fracasso e entender que as coisas podem não acontecer da forma como a gente quer”, diz. Embora tenha acumulado aprovações tão desejadas, Bruna não conseguiu uma vaga em Economia na sua universidade dos sonhos, a USP. Mas, hoje, ela vê vantagens nisso. “Fiquei muito triste, vivi dias de luto – e então fiquei sabendo que tirei 980 na redação do Enem e isso me animou demais. Entendi que tudo acontece no tempo certo. Foi a coisa certa entrar na UFRJ, e ficar próxima da minha família”, diz.

Leia a seguir, na íntegra, a redação quase perfeita da Bruna. Para analisar as escolhas textuais da estudante, o GUIA DO ESTUDANTE convidou Aline Benevides, Coordenadora de Redação do Poliedro Colégio, para comentar o texto.

Redação da agora estudante de economia Bruna Scali Figueiredo.
Redação da agora estudante de economia Bruna Scali Figueiredo. (Arquivo Pessoal/Reprodução)
Introdução

O “Modernismo”, como movimento literário, firmou-se no Brasil há mais de 100 anos na “Semana de Arte Moderna de 22”, em São Paulo. Com isso, ao defenderem a criação de uma história efetivamente brasileira, os artistas e intelectuais incentivaram a valorização das comunidades e povos tradicionais do país. Fora do ramo artístico, entretanto, o corpo social deve solucionar os ainda existentes obstáculos da garantia do reconhecimento dessas tradições, com o intuito de desmascarar a ideologia dominante para, então, promover a identidade nacional. Dessa forma, enquanto houver conflito de interesse, os desafios permanecerão.

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Comentário da professora:

Uma característica central da dissertação-argumentativa é a delimitação e a defesa de um ponto de vista, de uma tese, pois é ela que deve nortear a construção argumentativa do texto ao explicitar um posicionamento e os argumentos a serem defendidos pelo autor. No excerto de introdução acima, é perceptível o cumprimento dessa característica, visto que a estudante explicita a seguinte tese: “o corpo social deve solucionar os ainda existentes obstáculos da garantia do reconhecimento dessas tradições, com o intuito de desmascarar a ideologia dominante para, então, promover a identidade nacional”. Observe que, na primeira parte do período, há a indicação do problema (tema da redação) e, na segunda parte, explicitam-se os argumentos: desmascarar a ideologia dominante [ARGUMENTO 1] e promover a identidade nacional [ARGUMENTO 2] – que serão retomados nos parágrafos de desenvolvimento. A exposição dos argumentos mostra-se fundamental para guiar o leitor a respeito do percurso argumentativo a ser realizado, demonstrando uma relação de causa e consequência entre eles. Apesar da tese ser exposta em um tom propositivo, tal formulação não é cabível de penalização, segundo os critérios de correção da banca avaliadora. 

Outro ponto de destaque na introdução é a apresentação da contextualização por meio de um repertório sociocultural, o Modernismo. A exposição desse movimento literário, que é legitimado por uma área de conhecimento (a literatura), mostra-se pertinente ao tema, na medida em que a estudante faz um recorte do período literário que expõe relação com o tema: “a valorização das comunidades e povos tradicionais do país”. O fato desse repertório ser pertinente ao tema, legitimado e estar articulado ao argumento garante a nota máxima na competência 2.

Desenvolvimento 1

Em primeira análise, é válido ressaltar que a cultura das classes favorecidas tende a desmoralizar as outras, tornando-se instrumento de manipulação. Sob essa ótica, o termo “ideologia”, aplicado pela Escola de Frankfurt no século XX, aplica-se, certamente, ao cenário da valorização dos povos tradicionais: toda e qualquer cultura ou história de resistência diferente do “comum” é determinada como irrelevante. A partir do controle da massa pelos meios de hegemonia, como rádio, TV e redes sociais, a população é moldada para agir de forma pacífica diante temas que vão de encontro ao padrão, ao mesmo tempo que afastam o diferente, como é o caso cultural e histórico dos povos originários. sendo assim, o país necessita de uma efetiva intervenção nesse panorama.

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Comentários da professora:

O primeiro parágrafo de desenvolvimento tem início com o emprego de uma locução conjuntiva “em primeira análise”, que, ao contrário do que muitos estudantes pensam, não é obrigatória. O conectivo é seguido da exposição do argumento a ser explicado e defendido no parágrafo, “a cultura das classes favorecidas tende a desmoralizar as outras” – exatamente o mesmo argumento delimitado na tese. A explicação se dá por meio da exposição do conceito de “ideologia” a partir da Escola de Frankfurt, que se mostra fundamental para a validação da relação de causalidade proposta pelo argumento. É importante destacar que a explicação não se limita à exposição de um aspecto teórico, visto que a estudante relaciona com fatos do cotidiano, como a exposição midiática, que concretiza o argumento. A citação da Escola de Frankfurt, por não ter sido mencionada na coletânea, é considerada mais um repertório sociocultural, que, novamente, é legitimado e foi utilizado de forma produtiva – reforçando a nota máxima da competência 2.

Desenvolvimento 2

Ademais, a sensação de não pertencimento por parte dos tradicionais é algo frequente, porém inadmissível. Nesse viés, a antropóloga Lilia Schwarcz afirma que, desde a independência de 1822, os cidadãos não desenvolveram o nacionalismo, muito menos uma visão do coletivo. Assim, a crítica gira em torno da expressão egoísta, de caráter individualista, do povo independente. Logo, o ideal de “nação”, encontra-se, sem dúvida, defasado, tendo em vista os persistentes preconceitos, a falta de representatividade das comunidades tradicionais e, ainda, o estigma associado ao incomum, como estudado pelos pensadores de Frankfurt.

Comentários da professora:

O segundo parágrafo tem início com o emprego de um operador argumentativo entre parágrafos, “ademais”, o qual objetiva estabelecer a relação entre os argumentos. Tendo em vista que estes estabelecem uma relação de causa e consequência, o conectivo mais adequado para esta posição seria um conectivo que expressasse a ideia de consequência – este lapso coesivo não foi penalizado pela banca corretora. Após o uso da conjunção, a aluna retoma o argumento delimitado na tese, “a sensação de não pertencimento por parte dos tradicionais é algo frequente”. A explicação ocorre a partir da citação da antropóloga Lilia Schwarcz, que defende a ausência de um nacionalismo. Há, entretanto, uma lacuna argumentativa no percurso desenvolvido pela aluna, uma vez que ela não concretiza a sensação de não pertencimento dos povos tradicionais e não explicita a frequência dessa sensação. Tais relações poderiam ter sido apresentadas no fechamento do parágrafo. É, possivelmente, esta falha que foi penalizada pela banca, uma vez que um dos corretores atribuiu a nota 160 na competência 3.

Conclusão

Portanto, é nítido que o debate sobre os desafios do reconhecimento dos povos originários no Brasil é relevante e precisa ser difundido. Nesse sentido, urge que as instituições educacionais, a exemplo de escolas e faculdade, promovam, por meio de verbas governamentais, campanhas e palestras em espaços públicos, validando o acesso igualitário às informações, a fim de romper a ideologia dominante e a cultura de massa. Espera-se, desse modo, promover o bem-estar populacional e, além disso, a identidade nacional, como o movimento modernista, em nossa sociedade do século XXI.

A conclusão é iniciada com um conectivo conclusivo, requisito central para uma nota máxima na competência IV. Em sequência, a aluna faz uma breve retomada da frase temática, reforçando a importância de uma intervenção. É preciso destacar que tal ressalva não é requerida pelo Enem, mas consiste em uma forma de finalizar o texto. Como característico do Enem, a proposta de intervenção é exposta com a apresentação clara de todos os elementos: agente, ação, modo, finalidade e detalhamento. Destaca-se, a seguir, cada um dos elementos apresentados pela estudante: “Nesse sentido, urge que as instituições educacionais [AGENTE], a exemplo de escolas e faculdades [DETALHAMENTO DO AGENTE], promovam, por meio de verbas governamentais [MODO], campanhas e palestras em espaços públicos [AÇÃO], validando o acesso igualitário às informações [FINALIDADE], a fim de romper a ideologia dominante e a cultura de massa [FINALIDADE]. Espera-se, desse modo, promover o bem-estar populacional e, além disso, a identidade nacional [DETALHAMENTO DA FINALIDADE], como o movimento modernista, em nossa sociedade do século XXI”. A proposta formulada pela aluna apresenta mais um de detalhamento e de uma finalidade.

No que se refere aos aspectos coesivos, o texto apresenta diversos conectivos ao longo de todo o texto, sem repetições, como “portanto”, “tendo em vista” e “nesse sentido” – diversidade exigida pela grade de correção. Nota-se, dessa forma, que o texto se caracteriza como uma dissertação-argumentativa, que defende um ponto de vista, de forma clara, objetiva e coesa, com desvios pontuais de gramática, o que permite a sua ótima avaliação.

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Estudante que tirou 980 na redação do Enem se preparava desde o 8º ano
Bruna Figueiredo citou a Semana de Arte Moderna, a historiadora Lilia Schwarcz e a Escola de Frankfurt no texto. Leia aqui a redação na íntegra.

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