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Escravidão moderna no Brasil: onde ocorre e por que os casos só aumentam

O número de vítimas resgatadas bateu recorde em 2023 e o tema, que já foi cobrado mais de uma vez na redação dos vestibulares, volta ao centro do debate

Por Julia Di Spagna
Atualizado em 8 Maio 2023, 15h59 - Publicado em 8 Maio 2023, 15h58

Em fevereiro de 2023, mais de 200 trabalhadores submetidos a condições degradantes e trabalho análogo à escravidão foram resgatados em uma vinícola em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha. Além de jornadas exaustivas, das 5h às 20h, sem pausas e com folgas apenas aos sábados, de acordo com relatos, os trabalhadores recebiam comida estragada, eram espancados e sofriam agressões com choques elétricos e spray de pimenta.  

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O caso chocou o país, tomou conta dos noticiários e vai de encontro a uma realidade que tem aumentado no Brasil: 918 vítimas de trabalho escravo foram resgatadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), de janeiro a março de 2023 – número recorde para um 1º trimestre em 15 anos. 

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Um levantamento do mesmo órgão indica que, entre 1995 e 2021, mais de 57 mil pessoas pelo Brasil foram encontradas em situação de trabalho análogo à escravidão em setores diversos na cidade e no campo. A prática fere os Direitos Humanos e é crime previsto no artigo 149 do Código Penal, que pode gerar multa e prisão. 

Entre as possíveis causas para a piora do quadro está a redução orçamentária para combate ao trabalho escravo e até a extinção do Ministério do Trabalho durante primeiros anos do governo de Jair Bolsonaro.

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Mas, afinal, o que é escravidão moderna?

A expressão se refere a relações de trabalho que violam direitos básicos relacionados à liberdade ou à dignidade, forçando pessoas a trabalharem contra a sua vontade por meio de formas de intimidação, que passam por ameaças, violência física ou psicológica e detenção. Outras ações comuns que se enquadram nessa definição são, por exemplo, a retenção de documentos e a cobrança de valores abusivos por moradia ou alimentação, seguida de retenção de salários.

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Quais os impactos do trabalho escravo

Além de ferir os Direitos Humanos e prejudicar diretamente trabalhadores ao redor do mundo, a prática também tem um impacto indireto na sociedade como um todo. Com a exploração da mão de obra escrava, empresas têm custos mais baixo, conseguem cobrar menos por seus produtos e criam concorrência desleal com companhias que seguem a lei, que por sua vez podem reduzir salários ou cortar benefícios para “compensar” os valores. Além disso, os governos perdem receitas tributárias valiosas que poderiam ser investidas em serviços públicos em áreas como educação, saúde, moradia ou transporte público.

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Os dados sobre trabalho escravo no Brasil

Em quais setores a escravidão moderna é mais recorrente? 

No Brasil, os setores que mais exploram o trabalho escravo moderno são o agronegócio, a construção civil, a moda e o serviço doméstico, segundo a ONG Oxfam Brasil.

O agronegócio se destaca: em dois anos, os casos de trabalho escravo em atividades rurais triplicaram. Dados do Ministério do Trabalho apontam que 1.932 trabalhadores foram resgatados no setor em 2022 – um aumento de 26,7% em relação a 2021 e de 233% em relação a 2020. Esse crescimento é quase cinco vezes maior que o registrado entre trabalhadores urbanos (537 pessoas resgatadas no último ano, com um aumento de 50,8% no mesmo período).

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A diferença da incidência do trabalho análogo à escravidão no campo e na cidade pode estar relacionado a questões como o isolamento dos estabelecimentos rurais, que dificultam a fiscalização, e a falta de conhecimento das vítimas em relação ao seus direitos trabalhistas, segundo especialistas entrevistados pelo Globo Rural.

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“Quando a gente mergulha no Brasil profundo, vemos trabalhadores que têm total desconhecimento dos seus direitos trabalhistas. Eles acham que quem tem direito a ter carteira assinada é só quem trabalha na cidade, e os empregadores se utilizam disso para poder explorar eles da forma como bem entendem”, disse o auditor-fiscal do trabalho e chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Maurício Krepsky.

Em 2022, de acordo com dados do Ministério Público do Trabalho (MPT), as principais atividades que empregaram mão de obra análoga à escrava foram: 

Imigrantes e refugiados

A vulnerabilidade desses grupos é uma preocupação mundial. Segundo o Relatório de Estimativas Globais da Escravidão Moderna, trabalhadores migrantes têm mais de três vezes mais probabilidade de estar em trabalho forçado do que trabalhadores adultos não-migrantes. 

Isso ocorre porque, muitas vezes, eles enfrentam uma série de dificuldades econômicas, sociais e/ou políticas em seus países de origem e, ao buscarem melhores condições de vida em outras nações, não recebem apoio. Essas pessoas ficam vulneráveis ao trabalho forçado e ao tráfico de pessoas, seja por conta da imigração irregular ou malgovernada ou a práticas de recrutamento injustas e antiéticas.

Por isso, é importante que os governos e a sociedade civil como um todo promovam ações coordenadas em prol da proteção dos direitos e da dignidade desses indivíduos.  

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“A redução da vulnerabilidade das pessoas migrantes ao trabalho forçado e ao tráfico de pessoas depende, em primeiro lugar, de estruturas políticas e jurídicas que respeitem, protejam e cumpram com os direitos humanos e as liberdades fundamentais de todos os migrantes – e potenciais migrantes – em todas as fases do processo de migração, independentemente de seu status de migração”, disse António Vitorino, diretor-geral da OIM, afirmou em depoimento à Organização Internacional do Trabalho (OIT)

Aqui, o número de trabalhadores imigrantes resgatados do trabalho escravo dobrou de um ano para o outro. A Divisão para Erradicação do Trabalho Escravo registrou 74 resgates em 2021; no ano passado, foram 148.

Entre as pessoas resgatadas, destacam-se as nacionalidades dos seguintes países: 

As leis contra o trabalho escravo

O artigo 149 do Código Penal brasileiro prevê uma punição de dois a oito anos de reclusão e multa para quem “reduzir alguém à condição análoga a de escravo, quer submetendo a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, quer sujeitando a condições degradantes de trabalho, quer restringindo por qualquer meio a sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.”

Além disso, quando um caso é identificado pela fiscalização, os empregadores são obrigados a pagar todos os direitos trabalhistas pendentes aos trabalhadores resgatados. 

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Segundo o Código Penal, são caracterizadas como trabalho análogos à escravidão ações como:

Caso o crime seja cometido contra criança ou adolescente, ou motivado por preconceito (seja de raça, cor, etnia, religião ou origem), a lei estabelece um aumento de metade da pena.

O que pode ser feito para lidar com o problema

O Relatório de Estimativas Globais da Escravidão Moderna recomenda uma série de ações que podem contribuir para o fim da escravidão moderna. Entre elas: 

Como a escravidão moderna aparece nos vestibulares 

Por ser um assunto atual e de grande impacto na sociedade, a questão da escravidão moderna no Brasil pode ser explorada nas provas. Além disso, o fato de a prática ter aumentado nos últimos anos e o recorde atingido em 2023 podem ser usados como ganchos, aumentando ainda mais o potencial de incidência nos vestibulares.

Para entender melhor como essa abordagem pode acontecer, confira abaixo dois exemplos de como o tema já apareceu em propostas de redação:

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“O trabalho na construção da dignidade humana”, tema de redação do Enem 2010

Em 2010, o tema da redação do Enem foi “O trabalho na construção da dignidade humana”. Um dos textos da coletânea abordava justamente a definição de trabalho escravo e o desenvolvimento da escravidão contemporânea a partir de situações degradantes que persistiram para muitos trabalhadores mesmo após a assinatura da Lei Áurea (1888). 

“O legado da escravidão e o preconceito contra negros no Brasil”, tema de redação da Unesp 2015

Já a Unesp, em 2015, trouxe como tema “O legado da escravidão e o preconceito contra negros no Brasil”. A banca apresentou textos de apoio que abordavam o racismo, o tabu ao redor do assunto, a abolição no país e os efeitos da escravidão que perpetuaram, por exemplo, no mercado de trabalho. 

Para se aprofundar

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