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A trajetória da estudante aprovada em 7 universidades de Medicina

Aos 18 anos, Angelica passou em universidades de peso como a USP e a Unicamp. Neste texto, ela revela como chegou até aqui

Por Taís Ilhéu
Atualizado em 9 fev 2024, 12h38 - Publicado em 6 fev 2024, 19h06
a estudante Angélica, menina negra de cabelos enrolados
 (Arquivo Pessoal/Reprodução)
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Pouco antes das 8h do último dia 22 de janeiro, a estudante Angelica Toledo já estava a postos em frente à tela, e atualizava sem parar o site da Fuvest. Ela havia se arrumado, passado batom – já que a “confiança é a última que morre”, em suas palavras –,  e gravava a si mesma pelo celular enquanto aguardava a publicação do resultado do vestibular, que dá acesso a maior universidade pública do país. Quando finalmente conseguiu acessar seus resultados e leu a frase “aprovado na primeira chamada”, não conteve as lágrimas. Havia passado em Medicina na USP (Universidade de São Paulo).

“Minha primeira reação foi chorar e agradecer a Deus”, relembrou a estudante de 18 anos em conversa com o GUIA DO ESTUDANTE. O que Angélica ainda não sabia àquela altura é que dali em diante quase se acostumaria a ler a palavra “aprovada”. No mesmo dia, poucas horas depois, viu que também estava na lista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). Ao todo, a jovem conquistou vagas para o curso de Medicina em sete universidades diferentes, sendo cinco delas públicas – USP, Unicamp, Unesp (Universidade Estadual Paulista), UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Abaixo, você confere os principais pontos da conversa de Angelica com o GUIA e conhece a trajetória da estudante, das salas de aula das escolas públicas até os corredores da Unicamp.

Sonho antigo

Angelica será a primeira médica da família, mas a área da saúde não é nem de longe uma novidade em sua vida. A mãe da jovem é enfermeira, o pai, fisioterapeuta, e a avó costumava trabalhar como recepcionista em um posto de saúde. Por isso, desde cedo soube que gostaria de trilhar um caminho semelhante.

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Adiantada na pública, atrasada na particular

A aptidão para os estudos também não foi algo que surgiu na vida de Angelica às vésperas do vestibular. Quando estava no terceiro ano do Ensino Fundamental, a professora da escola pública em que estudava chamou os pais da menina para uma conversa: ela parecia adiantada demais em relação à turma e, por isso, acabava ansiosa. Aconselhou que Angelica fosse matriculada em uma escola particular, que oferecesse mais suporte. Os pais precisaram se esforçar para arcar com a despesa, mas seguiram o conselho.

O que a menina não imaginava é que chegando no novo colégio a surpresa seria contrária: lá, era atrasada demais em comparação aos colegas. “Chorei no primeiro dia de aula”, recorda, “mas meus pais sempre seguraram na minha mão e falaram ‘você vai dar conta’.” O vai e vem entre escolas públicas e particulares tornou-se uma constante na vida de Angelica: no Ensino Médio ela retornou para a rede pública, e depois fez um cursinho particular.

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O que fazer com toda essa liberdade

Quando deixou o 9º ano do Ensino Fundamental, Angelica estava empolgada para concluir os últimos anos de estudo no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo em Capivari. Os institutos federais são reconhecidos pela qualidade, gratuidade e possibilidade de conciliar o Ensino Médio com o técnico. Mas nem tudo saiu como planejado.

Logo em março de 2020, Angelica e os estudantes do mundo todo foram mandados para casa. A pandemia da Covid-19 forçou escolas e alunos a se adaptarem ao ensino remoto, e embora percebesse que estava ficando um pouco para trás em relação aos colégios particulares, a jovem organizou-se como pôde – e tentou até tirar proveito de algumas regalias.

Em geral, Angélica perdia quatro horas do dia deslocando-se entre Monte Mor (SP), onde vivia com a família, até Capivari (SP), cidade que abriga o Instituto Federal. Agora, sentia que lhe sobrava tanto tempo que nem os livros – uma média de 25 por ano –, as sugestões culturais dos professores e as atividades extras da escola eram capazes de suprir.

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“Eu só quero viver só um pouquinho do Ensino Médio”

Mas o sonho de viver o Ensino Médio como Angelica lia nos livros, com romances e tudo mais que uma adolescente tem direito, ainda não estava perdido. Em 2022, sua escola retornou definitivamente ao modelo presencial. A jovem se lembra de ter pedido para a mãe, quase chorando, para que a deixasse viver “só um pouquinho do Ensino Médio”. Isso significava, em outras palavras, que talvez ela não conseguiria se dedicar 100% aos estudos, o necessário para uma aprovação direta em Medicina.

Os pais toparam, e Angelica pôde aproveitar a experiência sem o peso do vestibular. Isso não significou, no entanto, que os estudos ficaram de escanteio. Ela seguia frequentando religiosamente as aulas, sem faltar, entregando as tarefas e estudando para as provas. Tanto que concluiu o ano com um rendimento de 9,4. Mas as excelentes notas na escola, como já havia previsto, não significaram a aprovação no vestibular.

“A oportunidade é uma mulher careca com trança na testa”

Angélica conta, entre risos, que sempre ouviu o ditado “a oportunidade é uma mulher careca com trança na testa”. Isso significa, explica, que se você não agarrá-la quando aparecer na sua frente, pode não ter outra chance. É assim que ela encarou seu ano de cursinho em 2023.

Mesmo com o orçamento apertado – já que haviam acabado de ter um bebê e financiar uma casa – os pais desdobraram-se entre plantões para pagar as mensalidades do cursinho. Ela relembra que a mãe costumava preparar as marmitas que levavam para o trabalho, e Angelica para o cursinho, de madrugada. Vendo o esforço de toda a família, a jovem também se empenhava para fazer tudo valer a pena.

Todos os dias, ela passava mais de dez horas nas salas do Oficina do Estudante, em Campinas, preparando-se para as provas. Chegou a pensar em não fazer amigos, porque não queria distrações e observava que muitos colegas não estavam verdadeiramente empenhados em passar no vestibular.

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Mas acabou encontrando seu grupo. “Eu queria me aproximar de gente que sabia porque estava ali, que sabia que a primeira vez é a última chance. E achei um grupo [de amigos] muito bom!”.

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Angélica em frente ao totem da Unicamp
(Arquivo Pessoal/Reprodução)

A lógica do vestibular

Os aprovados em grandes universidades são unânimes em afirmar: para passar pela peneira do vestibular, não basta conteúdo, é preciso ter estratégia e conhecer as provas. Essa expertise era o que faltava à Angélica quando chegou no cursinho.

A bagagem do Instituto Federal, especialmente na disciplina de Química – já que cursou o técnico na área – colocavam a estudante em vantagem, mas ela ainda vacilava em relação à resolução das questões e ao tempo gasto nas provas. Esse foi um dos seus focos em 2023.

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Além de praticar revendo edições passadas dos vestibulares, Angelica dedicou-se a entender as provas. Leu os manuais, analisou o desempenho dos concorrentes e entendeu o que era preciso fazer dali em diante. Uma de suas constatações, por exemplo, foi que a disciplina de Biologia era a primeira que deveria dominar, já que todos os concorrentes de Medicina costumam ir bem. “Se você não vai bem biologia fica difícil”, afirma a estudante.

Ela recorda que o apoio dos professores orientadores no cursinho também foi essencial, já que ofereciam atendimento individualizado e ajudavam a mapear as dificuldades. “Eu pude perceber os detalhes que me fariam perder ponto a partir dessa orientação”.

Com conteúdo e estratégia, nada mais estava em seu caminho, e Angélica colecionou aprovações. Acabou escolhendo a Unicamp, universidade que sempre fez seu coração bater mais forte.

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Conhecer lugares, pessoas e aprender

Faltam poucas semanas para Angelica se mudar para Campinas e começar uma nova fase em sua vida. Estudar em uma das maiores universidades do país assustou no começo, mas a família e os amigos não se cansam de incentivá-la. “Você é pequena em estatura, mas já provou que é grande”, conta ter ouvido de um amigo.

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Quando perguntada sobre as expectativas para o início das aulas, aquela menina que chegou a pensar em não fazer amigos no cursinho não titubeou: conhecer pessoas. “Eu espero conhecer bastante gente e fazer boas amizades”, afirma. “Vou ter contato com muita gente do Brasil todo, gosto muito da ideia de conhecer lugares através de pessoas”.

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