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Por que a Venezuela quer anexar o território da Guiana?

Maduro angariou apoio da população na empreitada que busca uma solução para a crise venezuelana. Saiba o que a região de Essequibo guarda de tão precioso

Por Luccas Diaz
Atualizado em 8 dez 2023, 17h43 - Publicado em 8 dez 2023, 15h44

Se fôssemos responder à pergunta que dá título a este texto em apenas uma palavra, não há dúvidas de que ela seria “petróleo“. A crescente tensão entre os vizinhos Venezuela e Guiana vêm tomando os noticiários nas últimas semanas, e tem o precioso óleo mineral como o ponto central da discussão. Mas não se engane, ele não é o único ponto-chave dessa história. Estamos falando de um conflito que ultrapassa os séculos e já dura mais de 150 anos. Afinal, por que a Venezuela quer anexar a Guiana?

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O referendo de Maduro

Presidente venezuelano Nicolás Maduro
O presidente venezuelano Nicolás Maduro (Wikimedia Commons/Reprodução)

Em um domingo, 3 de dezembro, os venezuelanos foram às urnas responder um referendo com cinco perguntas que buscava a opinião dos cidadãos acerca da anexação do território guiano conhecido como Essequibo. Segundo a apuração divulgada pelo governo de Nicólas Maduro, presidente autoritário da Venezuela, a resposta foi esmagadora: 95% da população do país concorda que o território, que equivale a 70% de toda a Guiana, deve pertencer à Venezuela.

Mas o que há de tão precioso em Essequibo, uma região ocupada principalmente por uma densa floresta tropical? Mais uma vez, voltamos ao petróleo. O óleo é encontrado em abundância no território, e se junta a outros recursos naturais valiosos – ouro, diamante, urânio, bauxita e manganês são abundantes nos cerca de 159 mil quilômetros da região.

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A disputa entre os dois países chama atenção internacionalmente e, na América do Sul, preocupa os vizinhos com a ascensão de um possível conflito militar – que, por enquanto, se restringe a medidas simbólicas.

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A Venezuela, sob o pretexto de estar investigando minerações ilegais, enviou tropas militares para a fronteira com Essequibo, e já exibe mapas do país com o território anexado. Já a Guiana, ergueu a bandeira nacional no território cobiçado no mesmo dia do referendo venezuelano. O Brasil, até o momento, parece adotar uma postura neutra. A única medida tomada foi de autopreservação: reforçou a segurança nas fronteiras com os dois países. Até quando, no entanto, é difícil prever.

Para entender as possíveis escaladas desse conflito e o quão longe a Venezuela estaria disposta a ir pela conquista da região, é preciso voltar no tempo. Mais especificamente, aos tempos coloniais.

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Venezuela e Guiana: contexto histórico da disputa

O rio Essequibo corta toda a Guiana
O rio Essequibo corta toda a Guiana. A Venezuela cobiça porção territorial que fica ao oeste do rio (Wikimedia Commons/Reprodução)

Até o início do século 19, a região de Essequibo, que recebe esse nome graças ao rio que corta toda a extensão da Guiana, era entendida como parte da fronteira da Venezuela, delimitada pelo Império Espanhol. Em 1811, quando a capitania se torna independente da Espanha, a região continua presente nas delimitações territoriais da recém-estabelecida república.

No entanto, é preciso frisar que a presença de colonizadores europeus na região não era marcada somente por espanhóis: holandeses e ingleses também eram expressivos em alguns territórios. As colônias de Essequibo, Demerara e Berbice são alguns dos principais.

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Assim, em 1814, em meio a conflitos por independência, os ingleses presentes nestes territórios se voltam contra o governo venezuelano e conquistam as três regiões. No ano seguinte, em 1815, no Congresso de Viena, os territórios são cedidas oficialmente ao Reino Unido no Tratado Anglo-Neerlandês. E duas décadas depois, em 1831, a administração das três colônias é unificada e a terra passa a ser chamada de Guiana Inglesa.

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Em 1840, para cessar os constantes conflitos territoriais, a Inglaterra envia o explorador Robert Shomburgk para traçar o limite da fronteira entre a região e os países vizinhos. A Venezuela, no entanto, não concorda com as linhas traçadas por Shomburgk e afirma que parte do seu território de Essequibo havia sido roubada pela Guiana Inglesa. A disputa pela terra se torna uma realidade para os dois lados e, por décadas, o conflito se arrasta.

mapa mostra as localizações da guiana e venezuela e indica o território de essequibo entre elas
(Fernanda Krauss/Guia do Estudante)

Em 1897, enfim, ambos países concordam em definir a questão de uma vez por todas por meio de uma arbitragem internacional (uma espécie de resolução apartidária tomada por uma corte estrangeira), com a participação da Rússia e dos Estados Unidos. Dois anos depois, em 1899, a conclusão obtida é que o Reino Unido deve continuar com o domínio de boa parte da região, mas ficam para a Venezuela as regiões ao sul e a foz do rio Oronico.

É claro que não foi tão simples assim solucionar o impasse. Começaram então as acusações de manipulação na arbitragem, mas sem nenhum grande conflito militar. Em 1966, quando a Guiana declara sua independência dos britânicos, discussões reacendem a disputa, e o Reino Unido reconhece a questão como algo a ser novamente tratado. Quatro anos depois, em 1970, os dois países e a Venezuela definem o prazo de 12 anos para solucionar a questão.

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O prazo não foi cumprido, e em 1986, os envolvidos recorrem à Organização das Nações Unidas (ONU) para definir um mediador para o embargo; foram nomeados três. O tempo passou e, até 2014, quanto o último mediador morreu, o caso permanece sem uma resposta oficial.

Tudo muda, no entanto, em 2015. Quando o protagonista do recente conflito finalmente chega à história. A empresa privada estadunidense ExxonMobil encontra uma vasta reserva de petróleo no território de Essequibo.

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O petróleo de Essequibo e a crise da Venezuela

área central de Mahdia Town, na Guiana
Área comercial em Mahdia Town, na Guiana. O paí é considerado o que mais cresce no mundo (Wikimedia Commons/Reprodução)

A critério de comparação, precisamos lembrar que a Venezuela é um país de 916 mil quilômetros quadrados e cerca de 28 milhões de habitantes. Já a Guiana é um país significativamente menor, com 214 mil quilômetros quadrados e apenas 800 mil habitantes. Mas quando dizemos que a descoberta de petróleo em 2015 mudou tudo para a Guiana, estamos nos referindo a um país que, graças aos 11 bilhões de galões da reserva descoberta, tem desde então o PIB (Produto Interno Bruto) com o maior crescimento real de todo o planeta.

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De uma das nações mais pobres do Ocidente, a Guiana saltou para uma que somou, em 2022, 14,52 bilhões de dólares. O crescimento meteórico trouxe o título de país que mais cresce no mundo – a despeito até mesmo da crise causada pela pandemia. A projeção do FMI (Fundo Monetário Internacional) é que o crescimento suba 38% em 2023. Se em 2006 a taxa de pobreza da população era de 60%, hoje baixou para menos da metade, 40%.

Sem exageros, é possível afirmar que tudo isso é graças à região de Essequibo. O petróleo foi descoberto a cerca de 200 quilômetros da costa do seu território.

E a Venezuela na história? Bom, neste meio-tempo o país se afundou em um acúmulo de crises políticas e econômicas – sobretudo entre 2013 e 2018. Hoje, tenta sair lentamente de um longo período de recessão, que derrubou o PIB em  aproximadamente 80%. Uma desigualdade social astronômica e acusações de violação de direitos humanos marcam os últimos anos do país, com Nicolás Maduro, sucessor de Hugo Chávez, dando continuidade a um governo que está há duas décadas e meia no poder.

Por trás da crise, ironicamente, também está o petróleo, principal commodity da Venezuela. Quando assumiu o governo, nos anos 2000, Chávez conseguiu surfar na alta do preço do petróleo no mercado mundial, criando uma dependência quase que exclusiva do recurso. No fim do seu governo (e vida) em 2013, o país mergulha em uma crise sem precedentes, com a queda do preço do petróleo causada pelo “boom” do xisto e o aumento da produção mundial.

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Em 2018, lutando mais do que nunca por Essequibo, a Guiana processa a Venezuela perante o Tribunal Internacional de Justiça por não reconhecer a validade da sentença de 1899. Em 2020, a resposta do tribunal reafirma a imparcialidade da decisão e, em 2021, a Venezuela emite uma declaração defendendo o seu direito e domínio pelo território de Essequibo. A Guiana entende o recado como uma ameaça à sua soberania.

“O sol da Venezuela nasce no Essequibo”

O presidente Nicolás Maduro em conversa com Vladimir Putin
O presidente Nicolás Maduro em conversa com Vladimir Putin, em encontro de 2019 (Wikimedia Commons/Reprodução)

Na história do conflito, o ano de 2023 marca os passos mais ousados da Venezuela rumo à conquista de Essequibo. Em setembro, Nicolás Maduro anunciou à população venezuelana a realização do referendo questionando acerca da anexação do território. A votação ocorreu no dia 3 de dezembro, obtendo os 95% favoráveis divulgados pelo governo.

Para alguns especialistas, a postura de Maduro representa uma estratégia de reeleição em 2024. Não é incomum líderes de países em crise definirem um propósito maior, um inimigo estrangeiro, para “distrair” a população da realidade. O resultado esmagador do referendo mostra o apelo popular que a conquista de Essequibo tem entre os venezuelanos. O slogan “O sol da Venezuela nasce no Essequibo” vem sendo apresentado pelo governo de Maduro juntamente com um mapa da Venezuela com o território anexado.

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No petróleo de Essequibo, se concentra a esperança por uma solução mágica para a crise do país, uma espécie de reparação histórica que faria justiça ao povo venezuelano. Caso conseguisse, Maduro poderia cair nas graças da população novamente e se reeleger.

Por esse motivo, especialistas acreditam que o governo venezuelano estaria, sim, disposto a um conflito militar com a Guiana na luta pelo território. Ainda que não muito poderosa, a Venezuela possui uma força militar presente e que contrasta drasticamente com a quase-nula da Guiana. Uma conquista venezuelana envolvendo somente os dois países não seria difícil.

O que traz preocupação é os possíveis aliados que esta disputa pode angariar. Rússia, China e Irã são antigas parceiras de venda de aparato militar para a Venezuela. Por outro lado, é dos Estados Unidos as principais empresas de extração de petróleo que atuam em Essequibo. Para os americanos não seria novidade comprar brigas de seus vizinhos na América do Sul, mas um apoio definitivo parece distante.

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Já a relação entre a fronteira do Brasil e a Venezuela nos últimos anos não foi uma das melhores, mas o governo Lula diverge da política anti-venezuelanos adotada por Bolsonaro. Dado o contexto da geopolítica mundial, com inúmeros conflitos e guerras acontecendo simultaneamente, não é de se descartar a possibilidade de Maduro investir contra a Guiana – ainda mais agora que tem a vontade da população a seu favor.

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